D. Francisco de Almeida
1º Vice - Rei da Índia
De há cerca de uma dezena de anos a esta parte – é
verdade já passou este tempo todo – que se voltou a defender, primeiro por um
conjunto de entidades, organismos e, sobretudo, pela Armada seguido, mais
tarde, pelo próprio PR e Governo, de que Portugal tinha que voltar ao mar.
Nem mais nem menos. “Brado”, aliás, com o qual não podíamos estar mais de acordo.
Fizeram-se, entretanto, um conjunto apreciável de
estudos sobre a estratégia a seguir, os sectores onde apostar, os investimentos
necessários, a viabilidade económica, etc. Enfim, tudo.
Até que, na talvez única acção estratégica bem
conduzida, nas últimas quatro décadas, o país se candidatou, na ONU, à extensão
da Plataforma Continental o que, a ser conseguido, representará o ganho
geopolítico mais considerável desde 1530.[1]
Multiplicaram-se os “Fora”, os simpósios, as
conferências e os colóquios sobre tudo isto.
O actual PR – um dos principais responsáveis,
enquanto PM, das maiores atrocidades relativamente a este âmbito crucial, da
vida nacional – anda entusiasmadíssimo com a ideia sem, todavia, ter assumido
que alguma vez se enganara. Enfim, pormenores.
Este entusiasmo só é equivalente, porém, à
displicência com que os órgãos de soberania nacionais assumiram o Tratado de
Lisboa – caramba “de Lisboa!” – que, na prática nos rouba a Zona Económica Exclusiva
(entre outras coisas), que é apenas a maior dos países da UE, esbulho selado por
um “porreiro, pá” de um actual comentador, para o qual o “princípio de Peter”
aplicado à vergonha, nunca é atingido.
E assim estamos. O “brado”, afinal, não passou de
uma declaração de (boas) intenções…
O que não se tem ouvido discutir é o porquê de não
se passar das intenções.
Aflora-se – crise a quanto obrigas – que não há dinheiro nem
investidores.
Será, mas a razão principal não é, quanto a nós, essa. A questão
centra-se na ideologia e, em sequência, numa opção geopolítica muito mal ponderada,
para não dizer errada, seguramente muito mal gerida.
Nestes dois âmbitos foi feita uma verdadeira “lavagem ao cérebro” a toda
a população.
Enquanto estes aspectos não forem resolvidos não voltaremos ao mar,
mesmo que chovam notas de 500 euros…
Vamos tentar objectivar o que queremos dizer.
As forças políticas que passaram a influenciar o desenrolar dos
acontecimentos em Portugal, e que tomaram de assalto os órgãos de comunicação
social, o ensino, as artes, (até) a justiça e mais um número considerável de
sectores da sociedade, decretaram “urbi et orbi” que, politicamente os últimos
50 anos tinham sido “uma longa noite fascista”, pelo que estava tudo errado
donde decorria, naturalmente, que se teria que fazer tudo ao contrário.
Ora como o regime anterior se acirrou na defesa dos territórios
ultramarinos, por extensão, passou a considerar-se que tudo o que estivesse
relacionado com o Ultramar era repelente o que, bem vistas as coisas nos faria
recuar a Ceuta, em 1415, quiçá às Canárias e a 1340…
Acontece que só nos fixámos no Ultramar – o que está para além do mar –
justamente porque fomos descobrir e desbravar o mar!
Ora juntando o “fascista” com o Ultramar, decorria que também tínhamos
sido uns perigosos e horripilantes “colonialistas”, “imperialistas” e outros
“istas”, de muitíssimo má catadura e lembrança!
Lembro-me, ainda, de ver o Infante D. Henrique vilipendiado como um
putativo pederasta em tempos, note-se, em que a denominação de “gay” não tinha
ainda feito o seu glorioso percurso…
Espero que já dá para se fazer a ligação.
Seguidamente devemos a considerar a Constituição de 1976 (CR).
Esta constituição, de raiz marxista, estava e está razoavelmente
“armadilhada”.
Dois aspectos merecem realce, na medida em que afectam negativamente a
nossa relação com o Mar.
O primeiro tem a ver com a preponderância que deu aos sindicatos e à
permissividade em que permite que os mesmos possam ser correias de transmissão
de partidos políticos – o que deveria ser proibido.
Resultou daqui que as reivindicações, muitas delas selvagens, ajudaram a
destruir as empresas ligadas ao mar e a não tornar atrativo qualquer
investimento nesta área.
Por outro lado, existe um “liberalíssimo” capítulo na CR, relativamente
a “Direitos, Liberdades e Garantias” que, além de demagógico e inexequível, não
tem qualquer contrapeso no que respeita a “Deveres, Responsabilidades e
Obrigações”, de que a CR é, praticamente omissa.
Ou seja, o português tem direito a tudo e dever a nada (excepto a pagar
impostos)!
Ora trabalhar no mar não é propriamente uma “pêra doce”, é duro e é
preciso saber.
Pois até o saber se tem ido, pois estas coisas não se dão bem com
soluções de continuidade…
Resumindo e concluindo, quem tem direito a tudo acaba a não querer fazer
nada!
Finalmente, numa confrangedora atitude suicida e de erro geopolítico
crasso, abandonámo-nos nos “braços” da CEE, onde cometemos asneiras sucessivas,
uma dos quais foi o de nos agacharmos junto do eixo franco-alemão (agora quase
só alemão), o mais continentalista possível!
Ou seja nem sequer nos aliámos a países da orla marítima como nós,
essencialmente, somos.
Eu juro que não sei por – que - raio de livros é que os nossos políticos
estudaram (se é que algum), ou que mestres tiveram, mas o facto de serem
recorrentes nas asneiras já passou a ser uma evidência. E insistem.
Com tudo o que acabo de descrever (e fiquei pela rama) verifica-se que o
País fez 180º de volta na sua estratégia seis vezes centenária, ficando de
costas para o mar.
Tal até se verificou no desporto e no turismo: sendo o turismo a nossa
maior indústria, só há poucos anos se construíram marinas e os navios de
cruzeiro passaram a frequentar os nossos portos; e os desportos náuticos, “congelados”
em duas décadas, passaram a sair do “gueto” quando a juventude descobriu e
aderiu ao surf…
Por tudo isto, caros leitores, poderei estar enganado, mas enquanto não
ultrapassarmos as questões ideológicas apontadas e não fizermos uma saponária doutrinária
a tudo o resto, a Nação dos Portugueses não volta ao Mar.
Mesmo que venha a haver muitos milhões para investir.
E quando e se, um dia o fizermos – e Portugal está preso por pontas –
vamos voltar a ter vontade de defender o que nos pertence.
Desde que fomos às Canárias que nos contestam e tentam roubar o Mar. O
que está em causa, agora, é a nossa ZEE e a extensão da Plataforma Continental
(Açores e Madeira estão no meio).
São os próximos “ventos da História”…
O nosso D. Francisco de Almeida nunca deixou de estar actual.
[1] Proposta submetida à ONU em 11 de Maio de 2009.
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