sábado, 31 de dezembro de 2011

EVOCAÇÃO DE EVENTOS QUE A MEMÓRIA COLECTIVA NÃO DEVE ESQUECER

“Nesses anos, quando um soldado português desembarcava de um dos barcos da sua Nação para servir num forte em Moçambique, ou em Malaca, ou nos estreitos de Java, já previa, durante o seu tempo de serviço, três cercos, durante os quais comeria erva e beberia urina. Estes defensores portugueses contribuíram para uma das mais corajosas resistências da história do mundo”
James Michener
(escritor americano)

O Herói Oliveira e Carmo que deu a vida defendendo Portugal comandando a lancha Vega

Em 2011 fez 50 anos que se deu início às actividades subversivas armadas em Angola (15 de Março) - que se estenderiam, em 1963, à Guiné e no ano seguinte a Moçambique - e que a União Indiana lançou um torpe ataque militar aos territórios portugueses de Goa, Damão e Diu (17/18 de Dezembro).

Meia dúzia de instituições nacionais e algumas (poucas) associações patrióticas evocaram os eventos então ocorridos. Os órgãos do Estado nada organizaram oficial ou oficiosamente e apenas se fizeram representar na cerimónia levada a cabo pela Liga dos Combatentes.

A crise económico/financeira não serve aqui como desculpa para este alheamento oficial, que se revela apenas e mais uma vez, como fruto da grave doença moral e ideológica e de sãos princípios nacionais portugueses, que a generalidade da classe política sofre e está imbuída.

Fizeram-se evocações mas nada se comemorou pois, de facto, nada havia a comemorar.

Não íamos, por um lado, comemorar um ataque que nos retalhou a carne e a fazenda durante 14 longos anos; do mesmo modo que não fazia sentido comemorar o fim do conflito que resultou no maior desastre político-militar da História Pátria, que deixa Alcácer Quibir a perder de vista. Não só pelo tamanho e implicações da catástrofe como pela vergonha e indignidade daí resultante: se lamentamos os 9000 mortos de 1578, não temos de chorar a sua honra nem envergonharmo-nos da sua derrota, pois lutaram como valentes e venderam cara a vida.

Selo comemorativo de 1961
Por seu lado, as últimas campanhas ultramarinas da História de Portugal - único país verdadeiramente colonizador à face da Terra - e que foram as melhores conduzidas pelos portugueses (e exclusivamente por eles), desde o tempo do grande Afonso de Albuquerque, e de que estávamos a sair vitoriosos, vieram a acabar num tristíssima derrocada político-militar que culminou numa retirada abandalhada de pé descalço.

Aos portugueses que mantiveram a sua nacionalidade, seguiu-se uma deriva existencial sem norte cujas consequências estamos a sofrer e para as quais não se vê fim.



Para os portugueses que o deixaram de ser - sem ser por sua opção - o resultado foi ainda pior: resultou num conjunto de desgraças inomináveis de que resultaram cerca de um milhão de mortos.

Tudo isto foi responsabilidade (nunca apurada) de um conjunto de celerados políticos e militares e de uma vasta plêiade de ignorantes e ingénuos úteis, que foram ao ponto de assumir as (falsas) razões de quem nos emboscava as tropas e das mãos que os armavam, treinavam e incitavam.

Compreende-se, assim, que não haja nada para comemorar, o que não é a mesma coisa de se esquecer.

Os principais responsáveis dos crimes de lesa-Pátria, dividiram e empobreceram irremediavelmente o País, refugiaram-se nos partidos políticos, compraram consciências, imunizaram-se e continuam a tentar catequizar a opinião pública através do controle dos “media”, dos programas do Ministério da Educação e, até, de Fundações pagas com o dinheiro do contribuinte.

Só isto explica, por exemplo, que nunca ninguém se tenha lembrado de colocar uma queixa no Tribunal Internacional da Haia, por crimes contra a Humanidade - que não prescrevem - relativamente ao genocídio perpetrado pela União dos Povos de Angola (UPA) (e por quem a apoiou), contra a população branca, negra e mestiça, no Norte de Angola, em Março de 1961. Só quem não tem mesmo vergonha na cara se pode conformar com isto…

Já relativamente ao escabroso ataque da União Indiana contra o Estado Português da Índia - em que nem sequer tiveram a coragem e a decência de nos declarar guerra - se pode considerar em moldes e antecedentes completamente distintos da guerrilha que se desenrolou nos teatros de operações africanos, pois configurou um conflito clássico.

E a acção que a União Indiana desenvolveu pode-se considerar, por várias razões que não vou agora expor - muito mais grave do que a Indonésia fez em Timor, em 1975.

Não cabe aqui analisar o que se fez em conferências, reportagens, publicações e cerimónias, com que se evocou os eventos atrás mencionados, que se podem considerar enxutas e utilizando uma linguagem algo equilibrada, com excepção das bicadas na política do Estado Novo, já habituais, e que por norma confluem na sua principal figura política. Estiveram, porém, longe de focar o tema fundamental na análise dos eventos, isto é, de que lado estava a razão e a justiça.

Não queremos fugir a dizer que estava completamente do nosso lado (português), e não temos receio de o afirmar em qualquer parte do mundo.

Outra pecha das evocações foi não haver uma distinção clara entre a análise político/estratégica do conflito e o estudo do comportamento das diferentes componentes do Poder Nacional: a diplomacia, a economia, as finanças, o comportamento social e psicológico da população e a componente militar. E dentro desta aquilo que foi conforme ao Dever Militar e o que não foi. Neste âmbito assiste-se até, reiteradamente, ao branqueamento de acções menos conformes àquele dever.

Apenas umas considerações para finalizar e sobre a ocupação militar de Goa, Damão e Diu, que ainda constitui uma chaga viva para muitos, não sendo por acaso que tendo o Exército há muito tempo constituído a Comissão para o Estudo das Campanhas de África, que já produziu mais de uma dezena de livros sobre Angola, Moçambique e Guiné (e continua a produzir), nunca mandasse constituir nenhuma Comissão sobre a Índia, não havendo uma única obra oficial…

Três pontos apenas:

·       Costuma dizer-se que num conflito quer ele seja familiar, entre indivíduos, ou entre nações, existem razões, culpas ou responsabilidades de parte a parte; pois o conflito que opôs Portugal à União Indiana é excepção a esta “regra”, já que Portugal tinha a razão toda e a UI não tinha razão alguma!

Sendo assim, nós podemos discutir ou criticar o que o governo português, de então, fez quanto à melhor defesa dos nossos interesses, isso podemos; agora o que já não devemos fazer – por ser uma desonestidade intelectual - é passar a vida a condenar Salazar por ter cumprido o seu dever de salvaguardar as nossas gentes e património ao mesmo tempo que se desculpa o bandido do agressor;

·       Existe uma contradição insanável quando se exaltam os militares portugueses cuja actuação foi conforme ao Dever militar – sobretudo os que se portaram com heroísmo – e, em simultâneo, se pretende branquear ou justificar o comportamento contrário;

·       As parcelas portuguesas do Industão, só não se podem considerar cativas, hoje em dia, porque um governo português, em 1974/5, decidiu, aleivosamente, reconhecer “de jure” a ocupação militar (que só não foi condenada no Conselho de Segurança da ONU, porque a URSS vetou), sem que nada o justificasse. Uma decisão vil e indigna, que nos rebaixou e envergonha.

A mim, pelo menos, envergonha.

Passámos, desde então, a ser um país pequenino, governado por gente pequenina.

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Os que deram a vida por Portugal

sábado, 24 de dezembro de 2011

COISAS DE TECNOCRATAS

            Parece que o Sr. Ministro das Finanças se ia zangando com o Sr. Ministro da Economia, num dos últimos Conselhos de Ministros.

            De facto o Sr. Ministro da Economia, começando a dar-se conta que a realidade do pântano político português, não é propriamente a da Universidade Canadense onde leccionava (isto de ter “estrangeirados” no governo em Portugal, nunca deu bons resultados e a História do país tem exemplos q.b.), mas sobretudo, percebendo que sem dinheiro o seu imenso ministério não passa de um elefante branco, veio solicitar ao melífluo colega Gaspar uns euritos para poder mostrar algum serviço.

            Naturalmente o dono da torneira dos euros disse que apesar de se chamar Gaspar, não era Rei Mago e que “não havia dinheiro”.

            O ex-expatriado teimou, e teimou tanto que o possível próximo primeiro - ministro (isto é, controleiro de Bruxelas/Berlim), lhe atirou - certamente inspirado numa recente fita de Hollywood sobre o inventor do “Facebook”: “das palavras não há dinheiro, qual é aquela que não entendeu?”.

            É claro que no país toda a gente entende o que quer dizer, não há dinheiro.

            O problema não é esse, o problema é que ninguém o quer aceitar.

            E há muitas razões para isto e parte delas deixo-as para os psicólogos. Mas outras há que são mais pueris e terra-a-terra pelo que mais fáceis de passar ao papel. São basicamente três razões: de exemplo, de esperança e de justiça social.

            E nestas três ordens de razões o explicador Gaspar não se pode ficar pelo “não há dinheiro”.

            Comecemos pelo “exemplo” que tem sido curto, demasiado curto. Por ex. no orçamento para 2012, os grandes órgãos de soberania, Presidência da República, Assembleia da República, Governo e Tribunais, tinham que ser sujeitos a cortes substanciais para… dar o exemplo: deixar o Dr. Passos Coelho de viajar em 1ª classe nos voos de médio curso, parece curtinho. E, afinal, os principais responsáveis da crise em que estamos, não exerceram funções naqueles órgãos?

            Convenhamos que fazer um “corte” na Presidência da República – que tem no seu seio o equivalente a um quase ministério - para quem se queixa de ter poderes muito limitados - não parece nada inapropriado.

            Ainda agora surgem dúvidas se se há-de cortar nos subsídios aos partidos. Mas qual é a dúvida? Então querem mais dinheiro para campanhas eleitorais, quando andam em campanha eleitoral permanente? Dá-se dinheiro aos partidos porquê? Porque são os “pilares” da Democracia, diz-se! Pilares? Ou são antes agências de emprego e condomínios de negócio?

            Se há funcionários públicos a mais (sem nunca se objectivar) não haverá políticos a mais?

            Porque é que os partidos não vivem das quotizações dos seus membros e de doações (bem clarinhas), de particulares?

            Se os partidos recebem dinheiro dos impostos devem em troca submeter-se a regras. Por ex. os seus membros devem ter um mínimo de idade; ter experiência profissional; fazerem cursos; submeterem-se a exames. O “exame” dos votos é uma falácia… Não cabe na cabeça de ninguém que um vereador de uma câmara, muito menos um presidente de Câmara, não tenha feito um qualquer curso de Administração Pública…

            De todas as profissões, a de político é a única onde ninguém tem que prestar provas…

            É certo que nenhum governo pode fazer muito em pouco tempo mas deve exigir-se que um governo, de base partidária, tenha os assuntos estudados quando está na oposição…

            Muitas outras coisas se podem apontar mas fiquemo-nos por esta: em tempos de austeridade esta tem que vir de cima para baixo e não de baixo para cima. Por isso atrevo-me a um conselho: viajem menos, gastem menos em representação, acabem com cartões dourados, seguros e diferentes mordomias. Baixem a cilindrada dos carros para os 1200 (chega e sobra) e emendem muitas outras de semelhante jaez, que são vexatórias para uma população que maioritariamente passa mal e vai passar pior.

            Poderiam, até, nem poupar muitos milhões de euros com estas medidas, mas ganhavam no exemplo, na autoridade moral que adquiriam e na compreensão e colaboração das pessoas, nos sacrifícios. E tal não é contabilizável em metal sonante mas é incomensurável para um esforço colectivo.

            E, claro, há que acertar forte e feio naqueles que incorrem no longo braço da lei. Também faz parte do exemplo e da liderança.

            Temos depois a Esperança.

            Ora o Sr. Ministro Gaspar ao soletrar (como tanto gosta), a trilogia não....há….dinheiro (e já vimos que ainda há para muita coisa), não a pode transformar em síntese do programa do governo, senão o país vai parar e amanhã nem os juros da dívida consegue pagar, quanto mais a dívida.

           É preciso um plano que se transforme em coisas práticas: onde e como posso exportar? Quais os sectores onde vou tentar produzir mais? Onde vou poupar? Onde vou cortar nas importações? O que posso fazer para estabilizar os preços e evitar especulação? Qual a investigação cientifica onde devo apostar para retirar mais - valias futuras?

            Não é possível estar-se à espera de acertar em tudo, mas o caminho faz-se caminhando.

            Por outro lado, há imensas coisas que se podem (devem) fazer e para as quais não existe a desculpa do “não… há… dinheiro”.

            Por exemplo, mudar leis (a começar na Constituição), pôr os órgãos competentes dos ministérios e das autarquias a trabalhar em vez de encomendar estudos e pareceres em “outsourcing”; reformar o sistema judicial de alto a baixo (sem o que não haverá investimento estrangeiro, segurança e a mais elementar Justiça) e dar operacionalidade e autoridade às forças de segurança para acabar com esta vaga de corrupção e criminalidade de colarinho branco e violenta que nos avassala como uma autêntica nódoa de óleo.

           Pôr exigência no ensino também não custa dinheiro e garanto que melhora tudo!

         Valorizar tanto quanto possível os pilares (estes sim, não os partidos políticos) tradicionais da Nação como são as Forças Armadas, a Magistratura, a Diplomacia e a Cátedra, garantindo tanto quanto possível a despartidarização (e a não infiltração por sociedades “encobertas”), sobretudo das três primeiras.

           E que tal reorganizar e legislar para se acabar com o conflito constante, como se de uma maldição perpétua se tratasse, entre o trabalho e o capital? É assim tão difícil perceber que um não pode viver sem o outro e que ambos são fundamentais aos fins de todos? O que as nossas leis garantem são a existência dos profissionais dos conflitos, não a harmonização das partes.

            Enfim, em vez de “etc.”, direi que estaria aqui até logo à noite a apontar medidas necessárias sem que fosse preciso gastar dinheiro: só é preciso neurónios e encontrar um decisor.

            Da conjugação destas duas razões se resolvia a terceira, a da justiça social. A justiça social gera harmonia, esbate conflitos, provoca bem-estar, conforta os corações. Leva a uma melhor e mais consciente intervenção cívica.

            Para a justiça social (dar a cada um segundo o seu merecimento) é, todavia, fundamental actuar noutro campo: o da responsabilização.

            Tem-se inventado um role extenso de desculpas para justificar (ou desculpar) a desresponsabilização, a última das quais é o “relativismo moral” - um verdadeiro cancro dos nossos tempos.

            Ora a desresponsabilização leva à injustiça, corrói o tecido social, dispara a má - língua e o mal dizer; escarnece dos bons e dos competentes. Não se resolve com nenhuma varinha mágica e é de todos os tempos: resolve-se com uma adequada hierarquia, disciplina e organização das coisas e dos homens. A ordem dos termos não é arbitrária.

            Esperamos com inolvidável esperança que o Sr. Ministro Victor Gaspar ponha as finanças em ordem e não nos mate da cura (olhe, a tropa está quase).

            Mas gostaríamos também que arranjasse tempo para ler um romance. Medite bem na falta que fez ao seu colega mais velho, Cavaco Silva, saber aquela coisa dos 10 cantos dos Lusíadas.

            Mesmo que, à troika, isso não interesse rigorosamente nada.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

A INDEPENDÊNCIA EM PERIGO

Vai fazer agora 10 anos que este texto foi escrito. Este texto foi suavizado de um outro mais duro. Sendo premonitório, ficou muito àquem do desastre em que caímos.
Ninguém gosta de ouvir a verdade, por isso raramente se antecipam os problemas. E para quem quer ganhar eleições os problemas só existem na cabeça dos outros...
Este escrito muito mais do que um artigo é um manifesto. A moda pegou, depois. Mas este foi o
primeiro. Não ligaram nada, e continuarão a não ligar até ser demasiado tarde.

A INDEPENDÊNCIA EM PERIGO publicado no "Expresso" de 5 de Janeiro de 2002


sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O EURO, O ESCUDO E OS ROMANOV

    A 1 de Janeiro de 1999 onze países[1] da União Europeia, mais a Grécia, em 2001, adoptaram o “Euro”, unicamente para as suas transacções comerciais e financeiras. Moedas e notas foram introduzidas, mais tarde, em 1 de Janeiro de 2002.

    Foram postos a circular 80 mil milhões de moedas e notas, numa operação de grande complexidade. As notas são todas idênticas e as moedas possuem uma face comum, com indicação do seu valor e, na outra face, um símbolo nacional do respectivo Estado membro. A circulação do euro passou a ser livre.
    Aquando do desenho da moeda ocorreu um pequeno incidente: na face comum mostram-se os países separados pela respectiva fronteira; pois na altura apareciam todos menos Portugal, que não estava individualizado na Península Ibérica.
    Feito o reparo (para o que muito contribuiu o protesto e alerta feito por uma associação patriótica existente na altura – o Movimento 10 de Junho), a fronteira lá apareceu.
    Não deixa, todavia, de ser curioso notar que o responsável pela “cunhagem” da moeda fosse um…… espanhol.
    Portugal pôs-se em bicos dos pés para estar no pelotão da frente para entrar no euro. Preparámo-nos, com algum afinco, para cumprirmos os chamados “critérios de convergência”- quase como se de uma corrida de vida ou de morte se tratasse – mas sempre estivemos longe de ter uma economia ou finanças que sequer justificasseou aconselhasse, tal entrada.
    Parece que hoje em dia já ninguém tem dúvidas disto.
    As elites dos países “ricos” – isto é, aqueles que conseguiram emprestar mais dinheiro – estavam fartinhas de saber que não estávamos preparados para entrar mas, por razões políticas que interessavam ao núcleo duro do euro, e menos por “solidariedade”comunitária, não se opuseram.
   É claro que, depois de entrados, embandeirou-se em arco e logo se baixaram as guardas e se enviou a disciplina orçamental às malvas.
    E, desta maneira, foi a Nação Portuguesa expurgada de um dos seus instrumentos maiores de soberania, que nos acompanhava há 500 anos e que chegou a ser moeda franca em todo o Oriente, no século XVI, e a sexta moeda mais forte do mundo, no século XX, toda ela escorada em reservas de ouro e equivalente à riqueza (real) produzida.
    Tudo se passou sem uma discussão pública digna desse nome ou referendo sobre tão momentoso passo, tudo enrolado e servido numa cortina de propaganda mediática. Fumos da Índia, que nem sequer eram nossos…
    Nem durante os tempos da “Coroa Dual” filipina, houve Conde Duque de Olivares ou Cristóvão de Moura que a tanto se atrevessem.
    Porém, alguma antiga sabedoria Lusitana sobrepôs-se ao deslumbre de muitos pacóvios indígenas e ignorou uma directiva ou sugestão comunitária, que mandava destruir as, até então, moedas nacionais.
    Os zelotas de Bruxelas foram ao ponto de disponibilizarem máquinas (a 5500 contos cada), para todos os países executarem rapidamente tal desiderato. A Portugal estava destinado uma dúzia delas. Ninguém as levantou (comprou).
    Os alemães, por ex., sempre muito obedientes a um qualquer líder (fuhrer, na linguagem própria), que se instale, até montaram máquinas nos carros eléctricos que assim destruíam, de imediato, as moedas captadas e trocavam-nas por euros. Uma eficiência a toda a prova!
     Ainda nos ofereceram umas seis máquinas, mas recusámos. Ao invés colocámos todos os escudos em contendores e guardámo-los nos paióis do Campo de Tiro de Alcochete. Nunca se sabe o dia de amanhã…
    Quem assim decidiu merece louvor e condecoração.
     Mudam-se os tempos mudam-se as vontades e surge a noticia de que, há cerca de um mês, “alguém”deu ordem para que funcionários da Casa da Moeda trabalhem, afanosamente, a triturarem os vetustos escudos.
    Convém saber quem deu a ordem e porquê. É preciso colocar-lhe (s) umas orelhas de burro e alçá-lo (s) ao panteão dos “cretinos esféricos”.
    Seguramente virão dizer que a moeda dentro dos contentores não servia para nada e, assim, sempre se ganham uns euros com algum sucateiro que queira aproveitar o metal. Aguardamos, ansiosos, as futuras trocas de robalos por alheiras.
    A mim, todavia, não me parece nada que a razão seja esta, ou outra qualquer parecida. Penso sim, que algum sátrapa (internacionalista, federalista, comunitário), devidamente avençado, quis dar ao escudo (única moeda dos países aderentes ao euro, não destruída!), o mesmo destino que os sovietes vitoriosos da Revolução Bolchevique quiseram dar aos Romanov[2] : eliminá-los até ao último.
    Isto tinha (e ainda tem), um significado inequívoco: não há retorno, não se volta para trás.
    Este é, estamos em crer, o verdadeiro significado de mais esta infâmia miserável, que duvidamos prevaleça, do mesmo modo que dos Romanov houve quem sobrevivesse e hoje só há russos, já não há soviéticos.
    Os portugueses que amam o seu país têm que começar a reagir, duramente, à destruição de Portugal.
    Indo na onda, a mais alta figura do Estado veio, na sua loquacidade de marfim, mostrar-nos uma nova faceta, ao declarar “Urbi et Orbi” que “daqui a 50 anos o euro ainda estará por cá”.
    Caros concidadãos não sei se perdemos um presidente mas ganhámos, seguramente, um profeta e um vidente.

[1] Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda e Portugal. Ficaram de fora o Reino Unido, a Suécia e a Dinamarca, que não quiseram aderir.
[2] Dinastia então reinante na Rússia

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A CARTA UNIVERSAL DOS “DEVERES” DO HOMEM

“No Dever está a limitação do Direito”
V.Balaguer

            A Carta Universal dos Deveres do Homem não existe.

            Não existe porque a natureza humana é, de um modo geral, relapsa a “deveres”, os “filósofos sociais” tendem a ter das coisas uma visão mais optimista do que realista e a esmagadora maioria dos políticos não resiste à demagogia.

            Deste modo as sociedades – falamos, obviamente, das ocidentais e das que são influenciadas por estas - têm posto o acento tónico nos “direitos”, sobretudo nos últimos 50 anos. Aliás, só se fala de “direitos”, como se isso fosse possível…

            Durante séculos ou até milénios predominaram os “deveres” – em muitos casos nem havia direito ao que quer que fosse – sendo que agora é ao contrário.

            Durante todo este tempo só as religiões morigeravam os costumes e mesmo assim só depois de mencionarem pesados castigos para a vida eterna. Mas o laicismo aparenta estar a ganhar às religiões…

            Isto de andarmos a passar dos oito para o oitenta nunca foi saudável e, estamos em crer, que o predomínio dos direitos – ou melhor dizendo, a ausência de deveres – é uma das causas que está a levar à decadência da chamada civilização ocidental.

            A visão mais equilibrada das coisas ainda reside no Cristianismo, mas é público e notório como a palavra de Cristo tem sido atacada e deixou de “fazer fé” em quase todos os areópagos nacionais e internacionais.

            A defesa dos “Direitos Humanos” tomou forma por todo o século XVIII – o século das “luzes” – e ganhou foros de cidadania após a Revolução Francesa através da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de Agosto de 1789.

            A sua universalidade, porém, só veio a ser estabelecida após a adopção pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de Dezembro de 1948, da Declaração Universal dos Direitos Humanos. [1] Hoje a totalidade das Nações adoptou esta declaração mas a maioria delas está longe de as cumprir.

            Numa tentativa de globalização destes direitos tem-se tentado alargá-los a todo o globo com oposição explícita dos países que professam o comunismo e da maioria dos países muçulmanos, por exemplo.

            Dos seus 30 artigos, na sua globalidade, não se pode dizer que não representem um avanço significativo na dignidade da pessoa humana, apesar de não se saber muito bem – nem tal vir prescrito – como se obtêm os meios financeiros, genéticos e estruturais para se garantirem tantos direitos…E de obrigar a que tudo se passe em sociedades democráticas – o que indicia desde logo uma ditadura – não tendo em conta as múltiplas peculiaridades e diferentes estádios de desenvolvimento dos numerosos povos que habitam o planeta Terra. Por outro lado não se define o que se entende por “sociedade democrática”, como aludido no número 2 do seu artigo 29.

            Sem embargo, passou a existir uma espécie de “bíblia” para os direitos universais do Homem, mas é preciso fazer notar que em todo o articulado da Declaração, só por duas vezes se fala em deveres: no artigo 1 “todos os seres humanos …devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”; e no seu número 1 do artigo 29, “o indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade”.

            A questão está, sem sombra de dúvida, desequilibrada e mais desequilibrada ficou com a deriva de exigências incontidas – também apenas nas sociedades “ocidentais” – que se verificaram a partir dos anos 60 do século XX, em que o Maio de 68, em França, constitui marco importante.

            Nós não estamos contra as referências que norteiam a defesa dos Direitos Humanos, sobretudo quando se constituem marcos de elevação Moral. Entendemos apenas que os direitos devem andar equilibrados com os deveres e que estes, sobretudo os de âmbito cívico, social e profissional, devem ser conformes às capacidades evidenciadas. E que muitos deveres devem ter precedência sobre alguns direitos dando corpo à filosofia existente nas Forças Armadas Portuguesas, que ainda conheci, de que os direitos adquirem-se…

            Dito de outra maneira os cidadãos não deveriam poder usufruir de alguns direitos caso não tivessem os seus deveres em dia.

            Em Portugal embebedámo-nos de direitos aí por alturas de 1974/75 (como de resto em 1820, 1834 e 1910 – com os resultados conhecidos) e ainda estamos ébrios. A ressaca arrisca-se a ser muito dolorosa. Aliás, já está a ser dolorosa.

           Tudo começa na Constituição da República (CR).

            De facto a CR tem um extenso título II – “Direitos, Liberdades e Garantias” e ainda o título III, “Direitos e Deveres Económicos, Sociais e Culturais”.

            Ora não vivendo nós num mundo ideal, com seres humanos perfeitos, parecia de bom senso que ao lado (isto é antes, ou depois) do título II existisse um outro dedicado aos “Deveres, Obrigações e Responsabilidades”; só existe no nº 5 do art. 36, a alusão a que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos.

            Mesmo o título III que tem no seu título a palavra “deveres económicos...”, em todo o seu articulado não prescreve deveres para ninguém em nenhum âmbito!

            Apenas o título X referente à Defesa Nacional (bem pequeno, por sinal), no nº 1 do art. 276 prescreve “A defesa da Pátria é direito e dever fundamental de todos os portugueses”. Por curiosidade não resistimos a apontar a aparente desintonia entre este ponto e o articulado do nº 1 do art. 275 “Às Forças Armadas incumbe a defesa militar da República”. Será que se pode concluir, que apesar de as FAs serem constituídas por portugueses (e apenas estes – por enquanto), não lhes cabe defender a Pátria, enquanto que aos portugueses em geral não se lhes outorga a defesa da República?

            Mas falávamos de deveres e vamos ilustrar o que queremos salientar.

            Os políticos, por exemplo, deviam ter como dever à cabeça, ser patriotas e não ocuparem funções para as quais não estivessem preparados; os profissionais dos diferentes ramos de actividade deveriam ter a acompanhá-los um código ético de conduta; a juventude não deve ter só o direito ao ensino, tem que assumir o dever de estudar e deixar os outros estudar; os pais não têm só o dever de respeitar os filhos, têm também o direito ao respeito deles; o direito ao trabalho (ou ao emprego?) deve pressupor o dever de trabalhar; o direito à greve não se deve sobrepor aos direitos de quem possa ser prejudicado e aos deveres de quem a faz; o dever de defender a Pátria não implica o direito de desertar desse serviço – quantos escreveram a actual CR que incorreram neste caso?! – a comunicação social não pode ter só o direito à liberdade de expressão, tem o dever de ser objectiva, isenta e proba; os políticos têm o dever de servir o povo e não apenas o direito de lhe extorquir impostos; os banqueiros não devem ter só direito ao lucro, devem colocar os meios financeiros ao serviço da economia nacional; às empresas é curial e desejável a obtenção de lucros, mas não deviam estar isentas de preocupações sociais; os emigrantes devem ser bem tratados, mas devem respeitar as leis, os usos e costumes do país a que se acolheram. Os exemplos podiam multiplicar-se.

            Em síntese, os deveres e os direitos devem estar entrelaçados na justa medida das coisas. Encontrar a justa medida é um problema de todos os tempos. Não se deve ainda decretar “direitos” que não sejam exequíveis, ou outros que sejam iníquos. Os direitos devem ainda ser proporcionais ao desenvolvimento - não se pode tirar de onde não há – e mesmo os direitos de ordem intangível ou absoluta, sendo aspirações utópicas têm necessariamente aplicação relativa.

            Repito: quer-me parecer que os pratos da balança estão muito desequilibrados e muitas questões que neles pesam, mal equacionadas.

           Os direitos resultam dos deveres cumpridos.

            Do mesmo modo que a paz sem justiça é opressão, os direitos sem deveres associados, geram injustiça. Na injustiça os direitos e o Direito, não subsistem.


[1] Assinada por 48 dos 56 estados que na altura tomavam assento naquele Organismo.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

CONSIDERAÇÕES À VOLTA DE UMA GREVE GERAL

“Sendo a velocidade da luz superior à velocidade do som, é natural que algumas pessoas pareçam brilhantes até abrirem a boca”.
Autor desconhecido

     A greve geral do passado dia 24 de Novembro (curiosamente véspera de uma tentativa frustrada de imposição de uma ditadura totalitária – que todos se esqueceram de evocar), não serviu rigorosamente para nada e foi convocada pelos motivos errados.

    Não serviu, em rigor, para coisa alguma – a não ser para prejudicar a vida a uma quantidade de pessoas – porque o direito de manifestação é um escape que os ideólogos dos regimes “democráticos” inventaram para aliviar tensões sociais e dar a ilusão de que as pessoas podem influenciar alguma coisa. Estamos a falar de manifestações pacíficas, já que aquelas que virarem violentas serão reprimidas e criminalizadas.

    Ou seja as greves ou manifestações só servem se conseguirem influenciar algo. Não parece ser o caso, muito menos quando quem está no governo possui maioria absoluta no Parlamento.

    O Poder, no actual sistema, é legitimado pelos votos e só os votos o podem mudar, partindo do princípio de que o governo não se demite nem o PR o dissolve a AR.

    O mesmo se passa com a chamada “liberdade de expressão” – outro escape – que também não serve em rigor para nada se não tiver consequências. Basta ver as notícias de escândalos, crimes, actos de corrupção, aleivosias morais, etc., com que todos os santos dias somos submersos e raramente alguma coisa muda, ou se faz justiça.

     Eu disse “não serve para nada”? Emendo a mão: serve para desmoralizar as pessoas, confundi-las, desagregar o sistema político e aumentar a imoralidade através da disseminação de maus exemplos, que não são corrigidos. Mesmo quando são (bem) criticados.

    Por outro lado, a altura para fazer greves também é má: a Nação está numa esquina perigosíssima da sua História. Fazer greves prejudica a economia, a harmonia social e a imagem do país. Por este andar vão ter que acabar com os feriados todos…

    Além disso o Estado contra quem, supostamente, se dirige o protesto na forma de greve geral, só ganha com o evento: poupa nas contas e colhe dividendos na divisão da opinião pública.

    Se as pessoas querem protestar (e até há muitas razões para o fazer), então que o façam ao fim de semana. Não se prejudicam a si próprios, nem afectam a economia. Deixem de ir atrás das actuais associações patronais e sindicais. Enquanto funcionarem da maneira que funcionam, não vamos a lado nenhum. Eles não são parte da solução, são parte do problema.

    Por outro lado as razões da greve – que falha logo no princípio do objectivo, que ninguém soube exactamente qual era – são erradas por isto: nós não temos um problema económico e, ou, financeiro; nós temos é um problema político e, sobretudo, moral. Os problemas económicos, financeiros, sociais, etc., derivam daqui e enquanto aqueles não forem corrigidas, estes não se resolvem.

    Apesar de se ter tentado horizontalizar tudo, a vida rege-se por hierarquias e estas geram prioridades. Por isso deveríamos tentar colocar a sociedade a funcionar segundo os 10 Mandamentos conjugados com o bom senso. As leis podem derivar apenas dos provérbios, reformulados sob o ponto de vista jurídico e técnico.

    No fundo é pôr o senso comum e a procura do Bem, no centro das nossas vidas. O que não devemos ter é o império do “relativismo moral”; o indivíduo e os seus desejos como fulcro da existência, logo da acção; a desconstrução da ordem natural das coisas. Aqui o Mal tenderá a impor o seu domínio e a lei de Deus passará a ser “Mamon”, o dinheiro, tendo à sua direita o seu filho predilecto: o juro. O bordel passa a instituição respeitável, desde que, obviamente, pague o respectivo imposto.

    A actual crise financeira e económica é resultado de duas ganâncias: a da riqueza material e a do Poder. Quem conseguir reunir as duas tenderá a escravizar tudo à sua volta. Porque princípios já vimos que não têm.

     Fica aqui o alerta para o caso de ainda alguém não ter reparado nisso.

     Na nossa “paróquia” as coisas passam-se à nossa medida: salvo alguns iluminados – do latim “illuminati” – que possam ter ligações que a gente desconhece ou não quer dizer (ou seja são parte influente e consciente, no esquema), o resto tem fluído por bitola semelhante.

    Que se poderá fazer? Perguntarão os mais lúcidos; o que estás para aí a dizer? Questionam os menos esclarecidos; as coisas não serão bem assim, intermedeiam os ingénuos (sempre) úteis; como é que me vou desenrascar no meio disto tudo? Interroga – se (baixinho) a maioria, sem intuírem exactamente o que se passa (e o porquê das coisas), a não ser que têm que sobreviver ao fim do mês.

    E é assim que para a greve geral (como para o resto), patrões, sindicatos, partidos e simples cidadãos optam pelo egoísmo, à falta de quem cuide da Justiça: como é que “eu” vou salvaguardar melhor o meu bocado?

    A resposta é simples: não vão, iremos todos para o fundo.

    Depois das referências morais, terão que vir as políticas – a tal hierarquia das coisas. Aqui há muito a protestar pois há a fazer duas de duas coisas: em primeiro lugar tentar melhorar o sistema; acontece que ninguém responsável o quer fazer e os restantes cidadãos passam a vida a dizer mal de tudo, com os políticos à cabeça (tornou-se uma espécie de desporto nacional masoquista), mas também não se incomodam por aí além.

     Ora tal situação é a perfeita negação daquilo com que se enche a boca como Democracia.

     Em segundo lugar – e cumulativamente – há que procurar criar um sistema político melhor – já que “acordámos” que o actual seria o menos mau de todos, tendo a Ciência Política estagnado por alturas do fim da II GM.

      As hipóteses de tal ocorrer podem ser pela via evolutiva ou pela via revolucionária. Já se sabe, há séculos, que a primeira é preferível à segunda; sem embargo, esta última acaba, normalmente, por prevalecer. Em termos de inteligência isto não abona muito à Classe dos mamíferos, Ordem dos Primatas, Família do “Homo Sapiens Sapiens”…

    Ora o sistema político de que somos servidos – através dos humanos que o enquadram – gerou o actual caos financeiro através de duas coisas fundamentais: não previu/preveniu (isto é, não viu/fingiu que não viu/não teve coragem para), e gerou-o/incentivou-o (através do ciclo vicioso governo/oposição/promete/necessidade de dinheiro/empréstimo/novas promessas/mais necessidade de dinheiro/novos empréstimos. Tudo envolto em demagogia/ruído/propaganda/conivências/negócio.

    Esta inequação gerou um buraco financeiro cujo tamanho ainda ninguém sabe ao certo que tamanho tem, nem se quer apurar os responsáveis.

    Não se percebeu que alguma coisa do que ficou dito preocupasse qualquer protagonista da greve geral.

    Bons exemplos precisam-se. Dou três: a atitude desassombrada daquele cidadão anónimo que foi interpelar aquele outro cidadão menos anónimo, chamado Armando Vara, à entrada do tribunal onde está a ser julgado, por possível indecente e má figura. Disse-lhe das boas e passou na televisão, fugazmente.

    Pois devia passar todos os dias durante uns tempos, pois aquele nosso compatriota disse – em forma “soft” - aquilo que a grande maioria de todos nós dizemos.

     Aquele tipo de atitude é muito importante pois confronta os políticos, cara a cara, com as suas responsabilidades e é um exemplo de coragem e de intervenção cívica.

     O segundo exemplo é o que se passa numa das áreas do complexo de Sines (onde está uma das chaves do nosso relançamento económico): a produtividade no terminal portuário de carvão é ímpar em todo o mundo, por causa de um acordo racional e harmonioso de gestão entre gestores e trabalhadores.

    Finalmente o exemplo mais extraordinário, aquele que se passou na empresa “Sicasal”, em Mafra, na sequência do incêndio que a devastou. De imediato, sem tergiversações, desculpas, ou choraminguices. Toda a gente arregaçou as mangas e se pôs a trabalhar na recuperação dos estragos. Os responsáveis pela empresa, numa atitude de grande coragem, dignidade e humanidade, vieram logo afirmar que ninguém seria despedido; os trabalhadores, unidos à volta do interesse comum – e também em sinal de agradecimento – dispuseram-se a trabalhar o que fosse preciso no que fosse necessário, para tudo entrar novamente em velocidade de cruzeiro.

    Sei, também, que no âmbito dos seguros (área onde, normalmente, se geram conflitos e tentativas de fraude), tudo se tem processado com grande correcção.

    Finalmente tive a grata oportunidade de ouvir o proprietário da Sicasal – homem que provou ser com “H”maiúsculo (e não se portou como “dono”, mas sim como um verdadeiro empresário), vir pôr a tónica, com uma lucidez tranquila, na capacidade de liderança dos empresários em vez de se atirar a “culpa” para cima dos trabalhadores, por eventuais maus resultados. Até porque, se assim for, calaceiros, malandros e incompetentes terão a justa paga…

    Ninguém nesta empresa precisa, seguramente, de se fazer sócio de associações patronais ou sindicais!

    O exemplo devia tocar fundo em todos nós, do mesmo modo que tocou em quem colocou um pedido na “Net” para que se comprassem produtos da empresa para se oferecer na campanha de recolha de alimentos para os mais carenciados.

    É com exemplos destes que o país avança e as pessoas se tornam melhores.

    Deixámo-nos todos – embora com responsabilidades muito diferentes entre quem toma decisões e quem as sofre – meter no complicado imbróglio em que agora estamos. Só conseguimos sair de lá com o esforço comum. Para isso necessitamos, basicamente, de uma política que gere estratégias e exemplo.

    Até agora não tivemos nem uma coisa nem outra. A greve geral não ajudou a encontrar nenhuma delas.

domingo, 27 de novembro de 2011

TERÃO OS FRANCESES SIDO EXPULSOS DE PORTUGAL, EM 1811?

Conferência que proferi na Comissão Portuguesa de História Militar, no passado dia 18 de Novembro de 2011.

“A teus pés, fundador da monarquia vai ser a Lusa gente desarmada! Hoje cede à traição a forte espada que jamais se rendeu à valentia!”
(Inicio do soneto declamado pelo autor Capitão de Cavalaria Luís Paulino de Oliveira Pinto da França, junto ao túmulo de D. Afonso Henriques, na Igreja de Santa Cruz de Coimbra, em 1807, após a 1ª Invasão Francesa)


INTRODUÇÃO
O tema deste escrito trata da expulsão dos franceses de Portugal na sequência da que é tida como terceira invasão francesa, concretamente após o combate do Sabugal, em 3 de Abril de 1811. Depois de o que foram sendo perseguidos até Toulouse onde se renderam, em 10 de Abril de 1814.

Perseguidos eles foram, de facto – e só é pena não terem sido mais, dado o rasto de destruição e morte que provocaram em Portugal, numa escala nunca vista (da qual, hoje em dia, não temos a menor ideia, em termos de memória colectiva…).

Mas será que foram realmente expulsos ou derrotados?

A mim parece-me que não foram!

E aos próprios também não, basta ir ao Arco do Triunfo, em Paris, e verificar que eles, aqui, só somaram vitórias… Esse, de facto, algum dano lhes infligimos, estes serviram mais aos ingleses do que a nós e foram sol de pouca dura já que, passados poucos anos, nos bloqueavam a barra do Tejo e ajudavam a impor-nos, “manu militari”, com ingleses e espanhóis, a Convenção de Gramido, de 1847.

Não sei se os leitores sentem como eu, mas quero confessar-lhes que me causa especial incómodo que “alguém” nos venha fechar a barra do Tejo!...

Mas comecemos pelo princípio:
PORQUE NÃO FORAM EXPULSOS?

“Todos os homens dos 15 aos 60 anos se armem; cidades, vilas e povoações que se fortifiquem; quem o não fizer incorre em pena de morte e as vilas que franquearem as suas portas serão arrasadas”
(Real Decreto de 11/12/1808, incitando os portugueses a resistiram aos franceses)

“À memória de Jacinto Correia, fuzilado a 25/11/1808”
“Se todos os portugueses fossem como eu, não restaria um só invasor…”
(placa existente no jardim fronteiro à Porta d’Armas da Escola Prática de Infantaria, em Mafra)

A historiografia oficial portuguesa ensina-nos que existem três invasões das tropas napoleónicas: a 1ª comandada por Junot, em 1807; a 2ª, em 1809 e que teve à cabeça Soult e a 3ª, em 1810 – a maior de todas – comandada por um marechal de França, que gozava da fama de nunca ter perdido uma batalha: Massena (é claro que mais uns anos na União Europeia e estas invasões serão promovidas a “encontros de culturas”, se é que me faço entender….).

Olvida-se, por norma, a 4ª invasão, em 3 de Abril de 1812, talvez por só ter durado 20 dias. E esquece-se uma outra, que deveria ser considerada como a primeira invasão, que foi a Guerra da Laranjas, em 1801. Isto porque os espanhóis invadiram-nos em concertação política com os franceses, o que se prolongou até o Junot ter ficado a “ver navios no alto de Santa Catarina”.

E esquece-se, outrossim, de relacionar tudo o que se passou com a participação da esquadra portuguesa, ao lado de Nelson, entre 1798 e 1800, o que enfureceu Napoleão ao ponto de ditar para a História que “lá virá o tempo em que a Nação Portuguesa chorará lágrimas de sangue pela ofensa que agora faz à República Francesa”. Disse e cumpriu.

Na infeliz e mal conduzida “Guerra das Laranjas” perdemos a muito portuguesa vila de Olivença, cujo capitão se rendeu, lamentavelmente, sem disparar um tiro. Digo lamentavelmente, pois nenhuma força militar, seja em que circunstância for, se deve render sem disparar um tiro sob pena de não servir para nada!

Até hoje ainda não recuperámos a nossa Olivença: está cativa de estranhos, onde os franceses, primeiro foram coniventes e, depois, lavaram daí as mãos. Como, aliás, têm feito a maioria dos governos portugueses desde então.

Esta é a primeira razão que nos leva a dizer que os franceses ainda não foram expulsos.

Porém, a razão principal porque assim o afirmamos, tem a ver com o facto de os Gauleses terem saído fisicamente do nosso território – com muito do que pilharam – mas deixaram cá as suas ideias. As ideias de Revolução Francesa e a célebre trilogia da “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” (que, na sua essência, é uma grande mentira).

Ora tudo isto representava uma ideologia, baseada em doutrinas veiculadas pelos “Iluministas” e “Racionalistas” do século XVIII. Numa palavra, eram-nos estranhas.

A principal organização que veio a defender e veicular este ideário, foi a Maçonaria, cujo ramo especulativo viu a luz do dia (pelo que é tido oficialmente), em 1717, em Inglaterra, com a formação da grande loja de Londres, após o célebre encontro na “Apple Tree Tavern”, em Covent Garden.

Por isso não é de estranhar que uma delegação da Maçonaria Portuguesa (que já existia desde 1734), fosse esperar Junot, a Sacavém, para o receber como…. “libertador”.

Com a saída do Exército francês as lojas maçónicas multiplicaram-se e não só por via das ideias afrancesadas, mas também por via de inspiração inglesa. E se os militares franceses saíram, os militares ingleses ficaram e continuaram a mandar no Exército Português.

Com a Corte no Rio de Janeiro havia um vazio de poder em Lisboa. Esse vazio foi ocupado por Beresford.

A Corte tinha feito uma retirada estratégica para o Brasil, que só não foi brilhante pela precipitação final do embarque; a autorização para que todo o filho d’algo a acompanhasse; não se ter dado ordem ao Exército para oferecer resistência, nem que fosse simbólica, e por não se ter acautelado melhor a abertura dos portos brasileiros ao governo inglês. Esta retirada ainda hoje é tida por muitos historiadores e políticos encartados, como uma “fuga”, o que representa um erro de análise profundo.

Mas erro, também, foi o facto do Rei estando no “bom bom” brasileiro, nunca mais se dispor a regressar a Lisboa, mesmo depois do perigo napoleónico ter definitivamente desaparecido, após a batalha de Waterloo, em 1815.

Aqui começaram os problemas políticos e político-militares, que têm desgraçado a Nação dos portugueses, até hoje.

Com os militares ingleses a mandarem na Metrópole o General Gomes Freire de Andrade, afrancesado, segundo no comando da Legião Portuguesa que tinha combatido ao lado das águias de Napoleão e Grão-Mestre da Maçonaria, intentou um golpe de estado, em 1817, a fim de depor Beresford e obrigar a Corte a regressar. Tal representa a 1ª intervenção dos militares na Política, em Portugal.

No mesmo ano houve uma revolta “republicana”em Pernambuco. Ambas as revoltas falharam e os seus principais responsáveis foram enforcados. Os de Lisboa foram-no num local que veio a tomar o nome de “Campo dos Mártires da Pátria”. Gomes Freire foi também enforcado (em S. Julião da Barra), como um simples ladrão, sem terem a decência de lhe darem o direito ao fuzilamento.

Infâmias estas, que se pagam caro pelos anos fora e que a inauguração do respectivo busto, em 18/10/2003, na rua com o seu nome, em Lisboa, provavelmente saldará. Cerimónia a que o Exército, distraidamente, emprestou um pelotão de cadetes.

A 30 de Março de 1818, D. João VI, publicou um Alvará em que proibia as sociedades secretas (visando a Maçonaria), a quem se atribuía a origem das duas revoltas referidas. O Monarca foi, ainda, surpreendido com a existência de uma loja maçónica na própria Corte, no Rio de Janeiro, que mandou extinguir de imediato, alegando “que conspiravam contra o seu governo”. O que não deixava de ser verdade…

Porém, a próxima conspiração teve êxito. Aproveitando a ausência de Beresford, que tinha ido visitar a Corte ao Rio de Janeiro, uma loja da mesma agremiação, de seu nome “O Sinédrio” – por sinal o nome do tribunal que tinha condenado Cristo à morte – revoltou tropas e civis no Porto, em 1820. O protagonista do grupo era o jurista Fernandes Tomás, que morreu pobre e goza, até hoje, fama de pessoa íntegra.

Foi a vitória do “Liberalismo”, que veio a ser consubstanciada na Constituição de 1822, documento que passou a ser visto como a “salvação da Pátria”!...

Desta vez o Rei foi mesmo obrigado a regressar, o que fez em 1821.

Já vimos que a Maçonaria também actuava no Brasil e com a saída de D. João VI, passou a influenciar o primogénito que lá tinha ficado como Regente, o Infante D. Pedro. Este Príncipe veio a revelar-se valente no campo de batalha; voluntarioso e impulsivo, mas pouco dado ao estudo e muito mais à estroinice e às mulheres (veio a ter 18 filhos de oito mulheres diferentes). Algo mais apreciado naqueles tempos no que os de hoje….

O cérebro por detrás da Independência brasileira, José Bonifácio de Andrade e Silva, atraiu-o para a organização dos “Pedreiros-Livres” e iniciou-o, em 2 de Agosto de 1822, na loja Comércio e Arte. O neófito adoptou o nome de “irmão Guatinozin – o último imperador dos Aztecas.

A inaptidão das Cortes e do Governo em Lisboa, fizeram o resto: o próximo e fugaz imperador do Brasil começou por dizer o célebre “Fico!” e, a seguir, deu o “Grito do Ipiranga”. O mundo português de então, desmoronava-se.

Para além das razões ideológicas interessava à França e à Inglaterra a manutenção do regime liberal, por razões económicas. Assim o fizeram sentir e, por várias vezes, a “Santa Aliança” – uma espécie de “Troika” da altura – não se coibiu de tal nos recordar.

A Revolução Vintista é, sobretudo, uma revolução da burguesia. Ora os burgueses são bons a intrigar, mas maus a combater. Depois dividiram-se, originando um século de guerras civis constantes e cruentas, que só terminaram – e não completamente – em 1933.

Esta coisa de nos dividirmos em facções e não termos apenas a facção portuguesa, só tem dado maus resultados…

Muito resumidamente foi assim:
A ala afrancesada veio a confluir em Manuel Inácio Martins Pamplona Corte Real, 1º Conde de Subserra (Angra, 1760 - Elvas, 16/10/1832), grande militar e político, também ele maçom ilustre e cuja vida dava um filme e, seguramente, várias “conferências”; e na ala inglesada veio a pontificar D. Pedro de Sousa Holstein (Turim, 8/5/1781 – Lisboa, 12/10/1850), 1º Duque do Faial e 1º Duque de Palmela, herói das guerras liberais e diplomata (igualmente digno de figurar na 7ª Arte e em múltiplas palestras). Este cidadão tendo-se distinguido em vida, quis também distinguir-se na morte, estando sepultado no cemitério dos Prazeres, num mausoléu particular (que é o maior da Europa!), e cujo espaço exterior recria a simbólica de um templo maçónico. Parece que depois de mortos já não se importam que nós saibamos quem foram.

Do anterior já tinha havido António de Araújo e Azevedo, 1º Conde da Barca, pelos franceses e D. Rodrigo de Sousa Coutinho, 1º Conde de Linhares, pelos ingleses.

Estes homens deixaram, por assim dizer, dinastias de simpatizantes e descendentes, que se foram alternando no Poder até à Segunda República.

Compreenderão que em tão curta missiva, não possa dilucidar todo esse período.

CONCLUSÃO
“O Constitucionalismo nunca se casou com a Nacionalidade Portuguesa, porque foi sempre estrangeiro. Toda a obra que um povo realizar, fora do seu espírito, não vinga, é estéril e condenada a uma morte próxima”
Teixeira de Pascoais
(in “Saudade e o Saudosismo”)

As barbaridades que os franceses das hostes imperialistas napoleónicas fizeram no território nacional foram tais que, em circunstâncias normais, nós hoje ainda os odiaríamos. Lembro que vítimas das invasões pereceram um número estimado entre 200 a 300.000 pessoas; o conflito causou mais destruição do que as 18 invasões que sofremos das outras nações peninsulares; a repressão sobre a população civil deixou um rasto de latrocínios, roubos, estrupos e violência avulsa, como nunca tínhamos experimentado e que só foram ultrapassados pelo genocídio terrorista da UPA, no Norte de Angola, em 1961, fez em Março 50 anos, etc.

E, no entanto, há muito tempo, mesmo muito, que a população portuguesa perdeu a memória colectiva desta tragédia inaudita. É mais lembrado o Terramoto de 1755 do que isto. Esta é a última razão pela qual afirmo que os franceses não foram expulsos de Portugal: a política e a historiografia liberal tentaram apagar a “nódoa” francesa e, em pouco tempo, a cultura francesa, o exemplo francês, a moda de Paris, ofuscava as elites nacionais.

Ao menos os franceses têm esta vantagem sobre os ingleses: nunca foram nossos aliados, batem-nos sempre de frente e à bruta; ao passo que a Inglaterra fez a mais antiga aliança, que existe no mundo, connosco e, sempre que pode e lhe convém, atraiçoa-nos. Sempre pragmáticos, os ingleses optaram por dominar a economia portuguesa. Ambos, porém, sempre tentaram dominar-nos através de empréstimos financeiros, que a nossa fraqueza potenciava, o que durou até 1928. Aí a coisa mudou pois a dignidade nacional, que restava, ainda foi suficiente para recusar as condições leoninas que a Sociedade das Nações (outra “troika” daquele tempo), nos quis impor. Tal só foi possível por, entre outras coisas, haver vergonha na cara.

Com muito sacrifício o Professor Salazar conseguiu descolonizar-nos – é o termo – culturalmente dos franceses, aportuguesando a escola e a sociedade; ao passo que nos descolonizava economicamente dos ingleses, tanto na Metrópole como no Ultramar, restringindo-lhes direitos quase majestáticos, acabando com privilégios, não renovando concessões e comprando de volta as empresas. E passou a falar com eles de igual para igual.

Todos lhe ficámos devedores desse grande serviço.

Julgo não estar enganado ao dizer que hoje tudo se faz exactamente ao contrário…

Ainda hoje existe uma comissão, não sei se permanente, entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o “Quai d’Orsay”, a fim de tratar reclamações pendentes ou que surjam, relativamente a objectos roubados pelos franceses, no período considerado. Creio ser já tempo de, pura e simplesmente, ser pedida a devolução de tudo o que for identificado, terem-nos roubado.

Do mesmo modo já há muito seria suposto que a situação da retrocessão de Olivença, fosse colocada e cima da mesa de uma das reuniões semestrais dos governos português e espanhol (e não ibéricas, como teimam em chamá-las!).

Para finalizar gostaria de lembrar que, em Portugal, não devemos continuar a ter partidos “franceses”, “ingleses”, ”alemães”, “russos”, ou quaisquer outros. Só devemos ter um “partido” que é o português.

Este partido tem um programa simples, claro e que não precisa de gastar milhões em propaganda: trata-se de defender a soberania e independência de Portugal, aumentar o poder da Nação e o bem - estar da população, baseado na nossa matriz histórico/cultural e num pensamento português, que vise a perenidade da Pátria. Apenas isto.

Caros compatriotas, Portugal continua a valer a pena.

Não está é nada fácil de o colocar no bom caminho.