quinta-feira, 29 de agosto de 2013

NADA RESTARÁ DA TROPA A NÃO SER UMA VAGA LEMBRANÇA…

“Nenhuma coisa desta vida humana é tão aproveitável aos viventes que a lembrança e memória dos bens e males passados para do mal nos guardarmos, regendo a vida para nele não cairmos segundo os bons fizeram”.
Gaspar Correia, in “Lendas da Índia”

Fui, recentemente, acompanhar um camarada à sua derradeira morada terrena.

É um acontecimento que sempre acompanhou a minha vida militar (mesmo sem nunca ter entrado em combate), mas que a roda da vida tende a tornar mais frequente relativamente àqueles que nos são mais próximos.

Uma das características e prerrogativas que acompanham a “condição militar” é a do direito a que cada um tem de lhe serem prestadas honras militares fúnebres, em função do seu posto – e, até, de algumas condecorações que ostentem – segundo fórmula regulamentar (hoje já muito simplificada em função dos cada vez menos efectivos e meios existentes).

Este direito é sustentado no dever dos que ficam, tanto individual como institucionalmente, em as prestar, condignamente, constituindo uma tradição centenária, que nada nem ninguém deve interromper.

Os cemitérios/talhões de militares são, também, uma homenagem póstuma e perene, a todos aqueles que pereceram ao serviço da Pátria, incluindo os que, mortos em batalha, não puderam usufruir das honras completas.

Mesmo aqueles cuja identidade se perdeu, têm direito a um túmulo a eles dedicado, que entre nós se encontra no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, alumiado por azeite votivo e guardado por sentinelas entre o nascer e o pôr - do - sol: o túmulo do soldado desconhecido.

O féretro do coronel, meu muito caro camarada de armas e de curso, passou o portal do cemitério sem que vislumbrasse peugada da guarda – de – honra, como determinado e previsto.

Enquanto o corpo aguardava a decisão de prosseguir para a tumba, coberto com a bandeira das quinas – a que se devia seguir um militar transportando, numa almofada, o boné, as condecorações e a espada (símbolo da autoridade), do defunto – chegou uma viatura militar de onde saíu, atrasada, a dita guarda.

Uma rápida conferência entre alguns dos presentes, decidiu pelo “mal menor” que foi o de reenviar à procedência o pelotão (menos), com a admoestação – apesar de tudo, simpática – de que o que aconteceu não podia ter acontecido, à qual o oficial comandante da força retorquiu com desculpas contristadas.

Veio a saber-se, mais tarde, as razões do sucedido, que são bem o espelho da triste realidade a que chegámos e que se continua a querer tapar do mesmo modo que se tenta tapar o sol com uma peneira.

Dada a extrema penúria de praças resultado do fim do serviço militar obrigatório, e dos cada vez maiores cortes (catastróficos) efectuados em tudo o que mexe nas FA, é muito difícil que o efectivo das honras fúnebres esteja concentrado numa única unidade militar.

Tal implica que existam militares escalados/de alerta em vários quarteis que é preciso convocar (por SMS, telefone, mail?) – deve aqui referir-se que o funeral se realizou em Lisboa, em que a distância entre a Igreja, o cemitério e as unidades militares era mínima.

Acresce a isto que as unidades encontram-se hoje despidas de militares depois do toque de ordem (se é que ainda existe), excepção feita para o modestíssimo número de pessoal de serviço, pois fora do período de recruta, uma qualquer instrução ou treino, ou alteração do grau de alerta, todo o mundo tem direito a ir para casa.

Tal deve-se (para além do já referido), à quase “regionalização” do serviço militar (a rapaziada parece que não pode estar longe das famílias, tão pouco das escolas – um dos grandes atractivos do voluntariado é a possibilidade de tirar cursos) e ao facto de, aos comandos, não lhes desagradar a ideia de verem os militares fora dos quartéis, dado que se evitam problemas disciplinares e, desde que as mulheres passaram a invadir a vida militar, sempre se minimiza a hipótese de cópula intramuros (Já quando havia SMO abreviava-se sempre que possível a sua presença nas unidades para poupar nas refeições...).

A abundância de transportes ajuda.

Bom, convocar pessoal nestas condições, para a cerimónia em causa aumenta enormemente o risco de atrasos e de faltas.

Com o efectivo finalmente concentrado, o oficial encarregado desta missão teve a presciência de indagar se todos os presentes estavam familiarizados com a “ordem unida” que teriam que efectuar e rapidamente se apercebeu que uma parte das praças não estava, pelo que numa tentativa de resolver o problema, decidiu, ali mesmo, proceder a uma instrução sumária.

Eis pois levantado o véu da causa do atraso. Caberá a quem de direito, tirar as ilações adequadas.

As cerimónias fúnebres e as honras militares são realizadas em memória dos mortos, mas ainda mais a pensar nos vivos. Ou seja o exemplo é para quem fica.

Para além de uma homenagem é uma manifestação de solidariedade de toda a família militar; um sentimento de pertença, coesão, camaradagem, espirito de corpo, etc., de quem serviu segundo os mesmos princípios no cumprimento de uma mesma missão.

Passa por ser um elo que a todos liga – do passado para o presente com vista ao futuro – e que mantém a instituição, que se pretende perene, focada nos seus valores.

Sem sombra de dúvida as FA são a instituição nacional por excelência, em que os seus servidores são acompanhados e cuidados desde que “assentam praça” até que dão baixa para a sepultura.

Só nessa data são desmobilizados…

Assim devia continuar a acontecer de modo a que o profissional das armas possa continuar a “SER” em vez de apenas “ESTAR”.

Posicionamento e filosofia que faz confusão a muito boa gente e que, não poucos pretendem mudar radicalmente.

A velha questão da “instituição” em contraponto ao “emprego”!

Por isso temo bem, que quando se olhar para o fundo da questão abordada, a decisão seja a de não resolver as causas, mas a de iludir os efeitos. Ou seja acabam rapidamente com as honras fúnebres…

Aconselho vivamente os oficiais e sargentos do quadro permanente a tornarem-se historiadores. Só aí, terão futuro.

Pois a continuar a actual senda, da Instituição Militar Portuguesa, irá restar apenas uma (vaga) lembrança.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

INCÊNDIOS EM PORTUGAL II

Para todos aqueles que desconhecem a verdade, a prova está nas fotos abaixo onde o sistema MAFFS e C-130 estão lado a lado... Nos anos 80 e 90 a Força Aérea Portuguesa combatia os incêndios com o C-130 Hercules, o sistema MAFFS e o Helicóptero AL III.
 
A FAP foi forçada pelos governos corruptos a desistir de apoiar as populações... em detrimento de privados e outros interesses obscuros...
(Alguém se deu a muito trabalho para fazer desaparecer estas fotos, felizmente a internet não tem memória curta)
 






 

INCÊNDIOS EM PORTUGAL

Pelo interesse que ultimamente tem suscitado o artigo "MDN, MAI, Incêndios e Asneiras Escusadas" volto a publicar um outro escrito em Agosto 2004 (publicado no "Expresso" um ano depois...) sobre o mesmo tema.

Ambos os artigos não esgotam o tema e alguns aspectos apontados há quase 10 anos, já se tentou corrigir.

É lamentável que não se consiga resolver, em Portugal, um único problema grave...


O “NEGÓCIO” DOS INCÊNDIOS

“Digo-vos – pois estes calam e nenhum não fala – que quero eu falar por mim e por eles”.
Um escudeiro a Gonçalves Vasques
Crónica de D. João I, por Fernão Lopes

Se a quantidade de água lançada sobre os fogos fosse equivalente à torrente de palavras, artigos, entrevistas e acções mediáticas que sobre a temática em questão já foram ditas, escritas e efectuadas, certamente que viveríamos sem labaredas na próxima década. O problema é que às palavras da boca para fora não se seguem as acções adequadas.

Com isto dito pareceria sensato abster-nos de verter no papel uma qualquer outra verborreia. E no entanto é isso que fazemos. A razão é simples: pensamos que apesar de tudo o que tem sido dito, 90% aplica-se a efeitos e não a causas e por isso não há soluções que resultem.

E, demos conta, que no fim de três décadas em que passou a haver incêndios a eito (eis a primeira reflexão a ter em conta!), só o ano passado houve a coragem de pôr o dedo nalgumas feridas.

Devemos começar por referir algumas evidências:

Desde sempre que houve florestas; desde sempre que houve pessoas – e o seu grau de educação sempre tem evoluído; sempre houve pirómanos e desequilibrados; sempre houve calor e outros fenómenos meteorológicos propiciadores a fogos; as preocupações com o ambiente têm aumentado (e bem) exponencialmente; os meios tecnológicos à disposição são cada vez mais e melhores, etc.; tem havido tudo isto, mas o número de incêndios florestais (é desses que estamos a tratar), não cessa de aumentar!

Outra constatação é que se trata de um fenómeno complexo e interdisciplinar (e por isso interministerial) e é tendo isto em conta que deve ser tratado. Aparentemente as investigações feitas a nível da Polícia Judiciária, não revelaram até agora nenhuma teia de nexos. Provavelmente a razão está no que dissemos atrás: não haverá apenas uma “teia”, mas várias...

Julgamos que a principal razão que leva a este aumento de fogos, cuja esmagadora maioria vem a público como tendo origem criminosa – embora sempre difusa – tem a ver com “negócios” a que se convencionou chamar “o negócio do fogo”, ou “a indústria do fogo”. Ou seja, quanto mais dinheiro o governo anunciar que vai injectar no combate aos fogos, mais fogos irá haver...

Sem querermos referir dados concretos iremos dissertar sobre algumas áreas onde o “negócio” do fogo pode ter lugar e noutras onde o “combate” não se está a fazer com a desejada eficácia. O assunto é melindroso, mas tem de ser tratado. Não se pretende lançar acusações ou generalizar, mas é preciso “podar os ramos podres” para não matar a árvore. A pergunta tem que ser posta e é esta: a quem interessará o fogo?

Eis algumas hipóteses sem preocupação de hierarquia:

- Ao “negócio” da compra e venda da madeira; a madeira queimada é mais barata, dá lucros a curto prazo, mas é suicidária a longo prazo;

- Às celulosas, no sentido em que poderão querer promover a substituição do coberto vegetal por outro de crescimento mais rápido e melhor para o negócio do papel;

- À especulação imobiliária, no sentido de favorecer o “negócio” da compra e venda de propriedades;

- Ao “negócio” da caça privada versus caça pública, atente-se às polémicas havidas;

- Ao “negócio” das indústrias relacionadas com o combate a fogos, viaturas, equipamentos diversos, extintores, compostos químicos, etc., alguns dos quais estão relacionados com elementos da própria estrutura de comando de bombeiros (como chegou a vir a público no ano transacto);

- Ao “negócio” dos meios aéreos para combate a incêndios. Este negócio disparou nos últimos anos. Até ao governo do Engenheiro Guterres a maioria dos meios aéreos envolvidos pertencia à Força Aérea (FA), que tinha gasto nos anos 80, cerca de 200.000 contos em equipamentos.

Nessa altura, cremos que em 1997, o Secretário de Estado Armando Vara entendeu (vá-se lá saber porquê!)[1] , que não competia à FA intervir nos incêndios mas sim que deveriam ser contratadas empresas civis. Compreende-se mal esta atitude a não ser pela sanha existente por parte da maioria dos políticos em menorizar os militares e as Forças Armadas. Certo é, também, que a FA não paga comissões.

No meio disto tudo – o que acresce à complexidade - há um sem número de hipóteses de mão criminosa que passa por vinganças pessoais; as consequências da última lei sobre baldios; queimadas mal feitas ou ilegais; pirómanos (e alguns irão porventura parar aos bombeiros), questões derivadas de heranças e os eternos descuidos e negligências.

Os investigadores têm, como podem os leitores aperceber-se, muito por onde se entreter...

No campo da prevenção e combate tem reinado a confusão, o “complexo de quinta” e a inadequação.

Nesta última encontram-se as leis e o processo de as aplicar e julgar. Falar sobre isto exigiria um tratado. Em síntese as competências entre Ministério Público, Tribunais e Polícias tem provado nas últimas décadas ser de uma grande ineficiência e fonte de problemas; o Código Penal e o Código de Processo Penal favorecem os criminosos, castigam o cidadão honesto e prejudicam o trabalho da polícia e, a montante de tudo isto e envolvendo-o como um espartilho, existe uma contumaz subversão da autoridade.

Ora urge fazer leis que ponham regras à venda de madeira queimada; no plantio de coberto vegetal; à obrigatoriedade da limpeza das matas e abertura de aceiros; à proibição de qualquer tipo de construção em área ardida durante “x” anos; à equidade na distribuição de terrenos destinados à caça e mais um sem número de coisas relacionadas com esta questão. E, claro, é necessário expeditar a constituição e resolução de processos e julgar e penalizar todo o indivíduo ou organização que tenha cometido um ilícito. E de não os soltar logo a seguir.

A estrutura da protecção civil que coordena o combate aos incêndios prima sobretudo pela falta de clareza. Isto é, não estão devidamente atribuídas responsabilidades de comando de que resulta uma evidente dificuldade na atribuição de meios e prioridades e no apuramento de responsabilidades. Para melhorar esta área torna-se necessário combater o “complexo de quinta” (muito arreigado!) e arranjar uma estrutura com comando centralizado e execução descentralizada; estabelecimento eventual de níveis diferenciados de decisão e linhas claras de autoridade. O afastamento dos militares de toda esta estrutura foi um erro crasso que após a debacle do ano de 2003, já foi parcialmente corrigido.

Temos a seguir o problema dos bombeiros. Os bombeiros sendo os “soldados da paz” (parece que só se pode criticar os soldados da “guerra”...), pelos serviços prestados e pela maioria ser voluntária goza de natural prestígio em toda a população. E têm estado até há pouco acima de qualquer crítica. Ninguém nem nenhuma corporação devem estar acima de qualquer crítica. O Estado tem-se valido do elevado número de corporações voluntárias para poupar nos sapadores, profissionais. Ora as exigências da sociedade actual não se compadecem com este estado de coisas. Acresce que qualquer pessoa pode ser “comandante” de um quartel de bombeiros voluntários e que a instrução e disponibilidade deixam muito a desejar. Basta aliás olhar para o fardamento e atavio para se duvidar da operacionalidade existente. Há pois que impôr alguma ordem neste estado de coisas.

Finalmente os meios aéreos. Somos de opinião que os meios de combate a incêndios devem estar na FA. Só quando estes forem insuficientes se devem alugar outros. Haverá apenas que compatibilizar as exigências e sazonalidade desses meios com as condicionantes operacionais e de dispositivo militar. Mas isso não parece ser obstáculo intransponível. Acordos de cooperação entre países amigos poderão e deverão ser feitos para optimizar os recursos.

Os incêndios são a todos os títulos uma calamidade para Portugal que se repetem numa cadência previsível.

Por isso não se entende o descaso, a incompetência e a falta de vontade política que os sucessivos governos têm demonstrado face a tão gravosa situação. Parece que criámos um sistema político e uma sociedade que convive com todos os problemas e tolera todos os vícios. E não resolve nenhum.

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[1] Apesar de constar nas missões secundárias da FA e o secretário de estado não ter competência para as mudar...

COMENTÁRIOS NO BLOG

Apesar de constar em destaque (regras do blog) que os comentários – que sempre agradeço – devem estar identificados, continuo a receber muitas mensagens anónimas que gostaria de publicar, mas por violarem o preceito acima indicado, não são editadas.

A não ser por razões ponderosas, não vislumbro porque pessoas de bem não queiram assumir o que pensam.

Aqui fica, mais uma vez, a lembrança.

Brandão Ferreira

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

ERROS DE FUNDO NA POLÍTICA À PORTUGUESA

“A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”.
François, duc de la Rochefoucauld

Bom, são tantos que nem sabemos por onde começar…
Fiquemos pela seguinte questão: que tipos de pessoas têm governado o País, nos últimos 40 anos?
Á partida a resposta é simples: aqueles que se inscreveram nos Partidos Políticos (PP), ou foi cooptado.
A complexidade vem das “nuances”…
Nos primeiros 10 anos a cena foi dominada pelos “antifascistas” e pelo “antifascismo” militante. Ou seja fez-se gáudio em fazer tudo ao contrário do passado recente – que, de fascismo, tinha muito pouco – e em gastar à tripa forra o pecúlio existente.
Nos “antifascistas” meteu-se de tudo: traidores, desertores, refratários, bombistas, criminosos de delito comum, vira casacas, chico - espertos, calões, malta do “reviralho”, liberais vários e uma corte impressionante de “adesivos”.
Duas bancas - rotas depois, acompanhadas de duas intervenções do FMI e adormecidos numa euforia estúpida, que seguiu patologicamente, à maior e mais vergonhosa derrota que a Nação sofreu em toda a sua História, as coisas começaram a sossegar com a entrada na CEE e a promessa de muitos milhões.
Os PP (excepção para o PCP) desenvolveram-se anarquicamente, sem regras, sem ideologia, sem modelo, sem escola, sem crivo, começando a dar palco a criaturas que vieram a revelar-se, na sua esmagadora maioria, perfeitamente ocas e impreparadas para o exercício daquilo a que se devia denominar pela “nobre arte da Política”.
O tempo era ainda daqueles que conheciam o país, maioritariamente, pelo olhar estrangeiro por onde andaram emigrados; o preconceito ideológico e, ainda, o do erro (bem intencionado ou não) dos que ignorantes da Geopolítica que orientou Portugal nos últimos 600 anos acreditaram no “El Dourado” europeu.
Podiam ao menos ter acreditado, mas não deitado fora a Prudência…
A estes juntaram-se bastantes quadros capazes, entretanto regressados do exílio para que o “PREC” os tinha atirado.
Quando a situação estabilizou – se é que alguma vez estabilizou – verificou-se que três ou quatro profissões se tinham apoderado de praticamente toda a vida pública nacional.[1]
Até hoje cerca de 90% das grandes decisões que tomaram, revelaram-se estrategicamente erradas e, por isso, desastrosas para o País. Não tenho qualquer receio em afirmá-lo.
 E o erro que vem à cabeça de todos – pai e mãe de todos os outros – foi o de nunca se ter feito uma análise do potencial político-estratégico que nos restava depois de avaliadas as consequências do Golpe de Estado ocorrido em 25/4/74.
Mas hoje não iremos por aí. Voltemos às tais profissões, são elas as que têm por base os licenciados em Direito (advogados, magistrados, procuradores, etc.); professores (sobretudo, universitários e os que não exercem); economistas e, sempre numa posição discreta, os homens das finanças.

A restante população e as restantes profissões têm estado, de um modo geral, afastados da coisa pública.
Restam os jornalistas que propalam aos quatro ventos o que se passa e o seu contrário; a quem todas as forças políticas, empórios económicos e diferentes “lobbies” intentam influenciar e, eles mesmo pretendem influenciar em vez de apenas informar, numa catadupa de notícias que há muito ultrapassou a capacidade humana de as digerir.
Como se isto não fosse suficiente surgiu uma nova espécie de mamíferos, os comentadores – normalmente oriundos dos grupos acima apontados.[2]
Este “cocktail” tem provado ser um desastre.
Direito e professorado têm dominado o Parlamento, as autarquias, até os sindicatos e são maioria nas proeminências dos PP.
A legislação tem sido feita desequilibradamente (e com a ajuda de escritórios de advogados) pois não tem tido o concurso dos diferentes saberes da Sociedade.
Estas duas profissões revelam especial apetência para se dedicarem à Política: têm obrigação de saber escrever, treinam normalmente os dotes de oratória e têm mais facilidade em compatibilizar – por diversas razões – a acção política com o exercício da profissão, e o afastamento da mesma não tem aspectos tão gravosos como para actividades de cariz muito técnico ou que exijam uma prática continuada.
Como se passou a reduzir tudo a números (e tudo é negócio), e se incentivou a tecnocracia – outro desequilíbrio grosseiro da sociedade hodierna – passaram a ser fundamentais os Economistas. Veja-se, por ex., o que fez o Presidente da República logo a seguir ao início da inenarrável crise política em que ora estamos: convocou 40 economistas a Belém, 40!
Parece que há mais economistas do que consumidores…

Ora esta coisa de ouvir economistas tem os seus problemas. Em primeiro lugar são piores que os médicos quanto à terapia: não há dois de acordo; depois porque tendem a complicar o que é simples; por ex. o princípio, que deve ter origem no Neolítico, de que não se deve gastar mais do que aquilo que se produz, é logo transformado em complicadas fórmulas matemáticas, leis de mercado e, para convencer os mais cépticos, ainda se avança com duas ou três teses de doutoramento de sumidades que ninguém ouviu falar, mas que estão sempre a despontar.
Outros ainda baralham mais as coisas ao trazerem ideologia para a discussão, que se desenvolve no meio de múltiplas siglas com que bombardeiam os pobres dos pagadores de impostos…
No fim esquecem-se todos que a Economia é mais uma “arte” do que uma ciência, que flutua – é o termo – no meio das contingências mais díspares que eles, economistas, às vezes nem ouviram falar.
Mas, como se tem visto, apesar de acertarem pouco, estão para ficar (e bem pagos)!
Na sombra, apesar de já aparecerem, por vezes, nas televisões, estão os grandes financeiros, que mandam mais na queda dos governos ou na definição de políticas, do que todas as eleições por junto.
O que move um banqueiro – penso ser uma evidência incontornável – é o Juro. O que paga e o que recebe.
O que move a “Bolsa” são as “transações” e o sobe e desce das acções, fenómeno algo esotérico que ninguém sabe ou quer dilucidar.

Juntando as duas equações temos o “sangue” do sistema.
Isto virou tudo do avesso.
Ou seja em vez de se considerar a Economia como um fim em si mesma – que ela não é – mas sim como derivando de uma política e ser instrumento de uma Estratégia; e de fazer como com que o sistema financeiro sirva para financiar a Economia e tenha preocupações sociais – em vez de servir para engordar accionistas e proporcionar jogadas especulativas, financiamento de negócios duvidosos, misturado com eventuais fugas aos impostos, através do uso de paraísos fiscais, passa-se tudo ao contrário.
Por outras palavras, o sistema financeiro dita onde põe o dinheiro, condiciona a economia e as prestações sociais e controla a Política (e os políticos), que devia ser, em primeiro lugar, quem devia liderar tudo isto.
A “coerência” do actual sistema mantêm-se fazendo circular entre os órgãos de soberania, grandes empresas e banca, as mesmas pessoas.
Não há regime político democrático que, de per si, consiga mudar o “status quo” desta equação.
Tudo se complica quando se desenvolveram, entretanto, vários “lobbies”, mais ou menos conhecidos, que se digladiam, transversalmente, por pedaços de poder/negócios e, sobretudo, porque o esquema se internacionalizou.
Tudo isto está mais ou menos fora de controlo.
Resta dizer que para que toda esta “mancha de óleo” pudesse espalhar-se e fazer o seu percurso, foi necessário condicionar, subverter, destruir ou tornar irrelevantes, todas as instituições que mantêm um Estado-Nação de pé, e que no nosso caso remontam à I Dinastia.
A começar pela palavra “Nação” que foi irradiada do vocabulário e isso não tem nada a ver com o aborto ortográfico.
Nós precisamos urgentemente de estrategas e de estrategas patriotas e corajosos, que ajudem a definir os objectivos políticos e dêem coerência ao todo. Os estrategas tendem a ter uma visão global dos problemas, conhecem a Geopolítica do País e do mundo que a influencia e cuidam de conhecer as potencialidades e vulnerabilidades nacionais e estranhas.
 Têm a sensibilidade para a escolha, quando tal se torna pertinente e necessário, do conselho e capacidades técnicas – onde devem caber então, não só os economistas, os financeiros, os de direito, mas todos os demais.
Não parece difícil de constatar e perceber, que raro tem sido o político que tenha tido este rol de barbaridades, na mínima conta. Naturalmente por entender que se trata de barbaridades…
Fazer o que lhes mandam, ou o que deixam e tratar de negócios é uma coisa.
Defender a Pátria, tendo uma Política, é outra coisa perfeitamente distinta.


[1] Que fique bem claro que nada me move, à partida, contra qualquer profissão ou profissional da mesma.
[2] De comentar, do latim, “commentare”, explicar, interpretar, explanar, esclarecer, criticar, analisar. Aguarda-se em jubilosa esperança o aparecimento de um subgrupo da mesma família: os “comentistas”, ou seja os analistas dos comentadores…

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

REFLEXÕES A PROPÓSITO DE UMA CERIMÓNIA MILITAR VOLTADA PARA A SEGURANÇA

O Centro de Formação de Guardas da GNR, em Portalegre, acabou de formar 276 novos guardas. Estes fizeram o seu Compromisso de Honra no passado dia 28 de Junho.
 
    Não consta que nenhuma imagem deste evento, muitas vezes mais relevante, por ex., do que a chegada de um novo craque a uma equipa de futebol, tenha chegado a qualquer lar português.
     Possivelmente apenas um apontamento do MAI a responder a uma pergunta de um jornalista, sem relação alguma com a cerimónia a que presidiu…
    Enfim, é o que temos.
    Temos, também, que o Comandante do Centro, Cor. Edgar Lourenço se despediu do serviço activo. Serviu bem o seu País, na Guarda, e o seu contributo cívico futuro, continuará a ser importante. Não é todos os dias que podemos vislumbrar um oficial com tão sólida formação militar e patriótica.
    Aqui fica o reconhecimento.
    A elaborada cerimónia militar a que nos foi dado assistir, em que a atenção ao rigor dos pormenores era um facto a que já nos tínhamos desabituado, fez-nos decidir a partilhar com os leitores dois aspectos que cada vez se tornam mais pertinentes.
    São eles, o princípio da hierarquia e a fórmula do Compromisso de Honra (e, sobretudo, o Juramento de Bandeira), versus o caminhar político pela agora, União Europeia. Comecemos pelo primeiro.
    No decorrer da cerimónia militar – faceta que ilustra a completa diferenciação da GNR, com a “civilizadíssima” PSP – alguns militares integrados na formatura foram chamados para serem premiados ou condecorados. Cada um deles abandonou, regulamentarmente a sua posição e posta-se frente ao Comandante da mesma, pedindo autorização para a abandonar, e após a obter dirige-se para a frente do militar mais antigo presente – no caso o Comandante – Geral da GNR (e “dono” da casa) – o qual, por sua vez, solicita autorização ao MAI, que presidia.
     De regresso à formatura o procedimento repetia-se de forma inversa.
     O “filme” repetiu-se de forma idêntica para todos os restantes, quer fossem dois ou 50. De forma exaustiva.
     Tal procedimento deve fazer uma confusão dos diabos (imagino) a grande parte dos presentes, autoridades políticas – arrisco-me a dizer – incluídas.
    Então não seria muito mais simples e não se poupava imenso tempo se o/a militar se dirigisse directamente ao Ministro? Não serão os militares mesmo quadrados e complicados da cabeça?
    Lá ser mais simples era, mas não seria correcto. E quanto aos militares não me parece que aquela figura geométrica seja a mais adequada para os definir…
     Lamentamos desagradar aos seguidores do célebre “iluminado” Rousseau (Jean Jacques para os amigos) mas ainda não chegámos à igualdade!
    O procedimento tem aqueles passos todos justamente para definir, marcar e salvaguardar o princípio da hierarquia – palavra maldita, quase proscrita nesta nossa “democracia”.
    O princípio da hierarquia define patamares de autoridade e respectiva responsabilidade, estabelece âmbitos de actuação, fronteiras de domínio. É reconhecido de baixo para cima e de cima para baixo, é biunívoco, evita o conflito e projecta uma “ordem” (outra palavra maldita).
    A organização – meta da hierarquia visa o estabelecimento de linhas claras de autoridade e níveis diferenciados de decisão.
    Se os órgãos de soberania e toda a sociedade daí para baixo seguissem estes princípios, tudo funcionaria melhor. Incomparavelmente melhor.
    As duas únicas instituições onde estes princípios (e outros) se mantêm, apesar de já muito “esfarelados” são a Igreja e as FA. Estranhamente, ou não, são aquelas que mais atacadas são, e onde tudo se faz para subverter todos os pilares que as mantêm de pé…
    Agora a UE.
    Apesar de antidemocraticamente – para só ficarmos por aqui – nunca se ter feito um referendo quanto à entrada de Portugal na CEE, CE e UE (são coisas diferentes…) e da irresponsabilidade política – também só para ficarmos por aí – com que, quase à socapa, se mudou a Constituição no sentido de dar prioridade a todas as leis vindas de Bruxelas, face ao edifício legal português, os militares ainda juram bandeira ao seu País, em que se comprometem a lutar pela defesa de soberania e integridade da sua terra e gentes, até ao sacrifício da vida.
    Também foi isso que ouvimos da boca dos 276 novos guardas.
    Ora a pergunta que faço é esta: como é que eles vão compatibilizar esse juramento com o facto do Estado Português se estar, paulatinamente, a auto destruir e a passar a soberania para entidades estranhas que não têm nada a ver connosco?
    Não percebo, ainda, como é que o Governo Português (sustentado pela AR) manda os mancebos jurarem estas coisas e depois deixa os tubarões da “Troika” à solta pelo Ministério das Finanças a imporem medidas que ultrapassam em muito as acordadas nas Cortes de Tomar de 1581, sem ao menos terem perguntado a todos os militares se eles compreendiam e aceitavam tal estado de coisas.
    E tirando a minha reformada pessoa e mais alguns por aí espalhados, que estão desertinhos de pegar em armas – se preciso fôr – para cumprir o tal juramento e vermo-nos livres destas indignidades, não se vislumbra sequer indignação nas hostes…
    Deve ser do Benfica ter perdido o campeonato e haver dúvidas que a selecção consegue ir à copa do Rio de Janeiro…
    Haja Deus.

domingo, 4 de agosto de 2013

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A “TROPA DE PAPEL”

O Presidente da República (PR) foi assistir aos exercícios finais da Brigada de Reacção Rápida do Exército, em Murça, no último dia do mês de Julho.

S. Exª fez afirmações elogiosas para os militares que, regista-se com agrado, passaram para além da vacuidade circunstancial, que normalmente se ouvem da boca dos políticos de que somos servidos.

Porém, no meio do circunlóquio, o Comandante Supremo (CS) mostrou-se agradado pelo “diálogo normal entre as chefias militares e o poder político a fim de se realizarem as reformas necessárias”.

Ora aqui é que surgem as maiores dúvidas, não se percebendo exactamente o que o PR entende por “reformas necessárias”.

Pelos vistos as reformas que se sucederam sucessivamente sem cessar, desde que o então Professor Cavaco Silva se alcandorou a PM, até hoje, não lhe parecem suficientes, ou bem-feitas…

Será que quer continuar com a “Defesa 2020” que irá conduzir, paulatinamente, ao desaparecimento da Instituição Militar, ou pretende arrepiar caminho? Valia a pena saber.

Eu creio que era melhor arrepiar caminho, apesar de duas legislaturas não chegarem para emendar a mão, tão vasto e fundo tem sido o mal causado.

V. Exª tem uma Casa Militar com gente capaz que, seguramente, já o terá alertado para o estendal de barbaridades que por aí vão, mas permitirá que compartilhe com os leitores o que a meu ver o deveria preocupar no âmbito político-militar.

Fá-lo-ei, como ilustração, sem preocupações em ser exaustivo, de cronologia, ou de grau de importância, do muito que há a fazer para tentar inverter o plano inclinado em que estamos há demasiado tempo.

Convinha, à partida, que o Conceito Estratégico de Defesa Nacional e o Conceito Estratégico Militar fossem bem pensados, redigidos e cumpridos, em vez de serem apenas documentos de diletância política; convinha que a macro legislação relativa à Defesa Nacional e às FA, mudasse pouco, garantisse estabilidade e permitisse um mínimo de factores estáveis de planeamento.

Ajudava, que o processo da escolha e nomeação das chefias militares fosse mais equilibrado de modo a evitar a governamentalização excessiva que acontece hoje em dia.
E parece razoável recordar que, em termos militares, sobretudo operacionais, a eficácia prefere à eficiência…
Convinha, outrossim, que o Governo cumprisse as leis que existem relativamente à Instituição Militar (IM), já que se fala tanto em “estado de direito democrático”; um general contabilizou, em tempos, 40 diplomas que não se cumpriam…
Seria do mais elementar bom senso, que às chefias militares fosse outorgada as competências e autoridade adequados para que estas pudessem exercer os seus cargos em vez de serem constantemente tolhidas e despojadas de competências que as estão a aproximar, na prática, de serem uma espécie de “eunucos de serralho”.
A Justiça Militar devia voltar a ter foro próprio e os tribunais militares devem tornar a existir; o RDM deve regressar aos esteios que garantam a disciplina e o são e rigoroso convívio entre os militares, a condição militar e o cumprimento do dever militar, e não ande ao sabor de experiências sociais frustres que da realidade da guerra e da vivência das unidades, nem sequer estão ao nível da “literatura de cordel”.
Estamos fartos de “adiantados mentais”!
O Serviço Militar Obrigatório deve ser reintroduzido, pois é de uma relevância cívica (e política) fundamental, sendo a criação de um sistema de forças misto aquele que mais convém ao país. Tal sistema compreenderia um quadro permanente (QP); um núcleo “duro” de forças baseado em contratados; um serviço cívico e um serviço de tropas de reserva territorial, tipo suíço.
Ao estatuto de reserva do pessoal do QP deve ser dado um aproveitamento muito mais activo e valorizado, encaminhando muitos dos elementos (como os de outros membros dos corpos especiais do Estado) para funções fora das FA, tanto nacionais como internacionais, onde os seus conhecimentos e experiência possam ser relevantes.
Tal teria o condão de colocar excedentes ocasionais, manter um ritmo adequado de promoções, face à pirâmide hierárquica; deixarem de ser um peso morto na Caixa Geral de Aposentações ao mesmo tempo que se evitava que as funções a que se alude (e são muitas), continuem a ser, em grande parte tomadas, por cidadãos cuja única competência é possuírem um cartão partidário.
O Instituto de Acção Social das FA deve ser colocado debaixo de uma direcção (ou corpos sociais) nomeada ou eleita (questão a debater), pelos militares e parar-se o assalto e esbulho que os dois últimos governos começaram a fazer a esta instituição de carácter social, erigida maioritariamente com o esforço dos seus “sócios” e onde o Estado não devia meter um tostão – e, por isso, não ter direito a mandar coisa alguma.
Urge voltar a valorizar a “condição militar” perante a Nação, sendo dever de qualquer Presidente, Parlamento, Governo e Tribunal ter sempre tal em conta, na sua actuação. Se tiverem medo de o fazer, por causa dos votos, dos jornalistas, ou seja do que for (talvez da própria sombra) comprem um cãozinho; se forem ignaros, aprendam.
Já agora convém acabar com o delírio do “duplo voluntariado”; um mancebo desde que “assenta praça” passa a pronto para todo o serviço!
Urge, ainda, colocar um ponto final nesta histeria estúpida em querer acabar com os estabelecimentos militares de ensino (CM,IO,IMPE), usando miríficas reformas ditas necessárias, como meio intermédio para o conseguir. Tenham juízo e tenham vergonha.
Do mesmo modo requere-se um aborto induzido, relativamente ao projecto de unir as três Academias Militares, a não ser que se queira acabar com os Ramos (o Canadá representa a única tentativa, gorada, para tal), ou se consiga arranjar um local que reúna os requisitos necessários a todos e permita a instrução comum de matérias comuns, e separadamente as que são diferentes, mantendo-se a idiossincrasia própria.
A encontrar-se tal local, obrigaria a um dispêndio de verbas incomportável face à nossa realidade e, no fim, inútil.
O que parece urgente fazer nas Academias Militares é subtraí-las a um exagerado “civilismo” resultante da “invasão” do ensino militar pelo ensino universitário civil.
As FA formam os futuros comandantes militares, não candidatos a burgueses bem instalados na vida. E, que se saiba, os nossos universitários civis, não têm que se preocupar com “créditos” relacionados com disciplinas de âmbito militar, ou terem valências para mudarem de profissão…
Já que passou a haver uma onda de esquizofrenia em juntar tudo, de qualquer maneira, tal doença também chegou à Saúde Militar. O granel está criado e na fase em que está, já ninguém sabe se deve andar para a frente (?) ou retomar a que cada Ramo tenha as suas capacidades…
Duas coisas estão em jogo: o correcto apoio sanitário às tropas em operações e as infraestruturas de retaguarda que também sirvam as necessidades da família militar. Parece que “números” e lugares de chefia têm sido as preocupações dominantes…
Já que se entendeu ser muito “prá frentex” deixar as mulheres invadirem, sem qualquer critério, as fileiras, ao menos que se faça controlo de danos, retirando-as das especialidades directamente ligadas ao combate e se mantenha a sua presença em cerca dos 10% dos efectivos de cada classe ou especialidade.
Recrutamento, Formação e Promoções devem fluir normalmente e não serem sujeitos a soluções de continuidade. O que se passa relativamente aos dois primeiros é já lamentável e quanto ao último é inadmissível (fora o que vem aí e que antecipo ser o poder político a nomear os comandantes das unidades e a promover os capitães para cima).

As Indústrias de Defesa foram quase todas desmanteladas; hoje o país não fabrica uma única arma ligeira nem qualquer tipo de munição. Não tem nichos de mercado, nem “joint Ventures” seja com quem fôr e a investigação de ponta está reduzida a pouquíssimas áreas. Salva-se um “cluster” em comunicações.
A saída das Oficinas Gerais de Material Aeronáutico e do Arsenal do Alfeite, respectivamente da tutela da FA e da Marinha, também não veio trazer qualquer benefício.

 A Cooperação Técnico – Militar, nomeadamente com os PALOPs, continua encalhada no vasto campo da inércia e falta de estratégia, quando podia e devia, ser um campo extraordinário de actuação. Bem melhor do que ir para o Kosovo…
Temo-nos “perdido” a gastar meios e dinheiro a actuar basicamente da seguinte maneira: a gente dá e eles recebem; depois estragam e a gente volta a dar… Até ver vislumbram-se poucos dividendos.
Já vai sendo tempo de regular devidamente a assistência religiosa nas FA, para o que é necessário harmonizar o que está na Concordata com a especificidade da vida militar e a organização superior dos Ramos/Emgfa/MDN. Isto não é uma questão de somenos, como alguns menos atentos possam pensar, bastando ver o rol imenso de “equívocos” que rodeou a actuação do resignatário Bispo castrense.
Concluindo, apesar de ter ficado muito por dizer, não falta matéria para o PR se preocupar e usar o seu magistério de influência a fim de melhorar as condições da IM e a dos seus mais fiéis servidores – como se diria no tempo dos Reis.[1]
A não ser que queira ser CS de coisa nenhuma ou ter, um dia destes, as sentinelas a pedir esmola à porta dos quartéis.
Não seria, porém, a primeira vez que tal acontecia.
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[1] Na oportunidade, aproveite e aconselhe o Governo a fazer, com a recém - constituída “Comissão de Acompanhamento da Reforma da Defesa Nacional” (CARDN), aquilo que as pessoas asseadas fazem com o papel higiénico.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

O MINISTRO DA DEFESA ADMOESTOU O CEMFA!

O General Chefe do Estado-Maior da Força Aérea (CEMFA), no discurso que fez durante o 61º aniversário daquele Ramo,[1] proferiu algumas frases que provocaram uma resposta algo desabrida no arvorado a Ministro da Defesa (MDN) Aguiar (traço) Branco.

    Do mesmo modo que critiquei o CEMFA (e, por extensão, os restantes chefes) pelo modo como reagiram – isto é, pelo que não reagiram – à extorsão do complemento de reforma dos militares, hoje vou defendê-lo pelo que incomodou este lamentável governante.
    Que terá dito então, o CEMFA de tão grave? Apenas isto: “Que os cortes estão a degradar a capacidade de resposta do Ramo”; “que no espaço de dois anos a FA foi obrigada a cortar toda a despesa em 36%”; “face à evolução dos orçamentos atribuídos desde 2010, temos vindo a reduzir significativamente as horas de voo, a prontidão das aeronaves, as acções de formação e qualificação e a manutenção das infraestruturas”; “a capacidade de resposta pode ser afectada a curto prazo”, e mais meia dúzia de frases semelhantes.
    O político laranja que ficará como um dos piores ministros da defesa, desta atormentada e manca III República, não perdeu tempo – sinal que conhecia o discurso – e replicou que “as vulnerabilidades das FA não devem ser discutidas em público” e “que acreditava ser da cultura de todos os chefes e da boa estratégia militar, que as vulnerabilidades das FA e da Defesa Nacional, não devem ser ecoadas no palco da discussão pública”.
    E acrescentou: “que as fragilidades são combatidas diariamente pelo esforço de uma gestão mais eficiente, pela competente definição de prioridades, pelo rigoroso planeamento da acção e pela indução de reformas que conduzam a um aumento de capacidade operacional num quadro muito exigente na aplicação de recursos públicos”.
    É preciso ter lata!
    Vejamos:
    O discurso do CEMFA foi educado, institucional e comedido. Não discutiu nada (apenas apresentou factos), não revelou qualquer segredo militar nem nenhuma debilidade que não esteja à vista de todos.
    Ou seja o Comandante da FA limitou-se a constatar uma realidade que põe em causa o cumprimento das missões pelas quais é responsável. A única coisa que fez foi dar-lhe uma articulação lógica de modo a poder concluir que “urge, portanto, senhor ministro, encontrar soluções que permitam minorar esta situação”.
    Não se vislumbra no que estas palavras possam ofender seja o que fôr ou quem fôr. Parece até, que o CEMFA não só tinha o direito de dizer aquilo que disse, como também, o dever de o fazer! Quanto muito só perca por tardio…
    Quando algo correr mal, é o MDN que assumirá a responsabilidade?
    Além disso o General Pinheiro não tem só o dever de lealdade para com o Governo tem, outrossim, esse mesmo dever para com as suas tropas, O PR, que é o Comandante Supremo, e ainda perante a Nação que, em 1º e último lugar tem por dever defender e salvaguardar![2]
    Aliás o que se lamenta é que esta posição não tenha sido sufragada em Conselho de Chefes Militares e devidamente apoiada pelos três Conselhos Superiores dos Ramos.
    Por outro lado não há acordo ortográfico que salve as palavras do MDN como, de resto, já se tornou pleonasmo referir.
    Não direi que não seja preferível manter determinados problemas relativos às FA no recato dos gabinetes – apesar de, tudo o que na sociedade que agora temos, tenha sido dessacralizado sem piedade (sendo a culpa dos políticos) – mas isso é para ser feito quando há sentido de Estado e as pessoas são sérias de procedimentos.
    Tal tem sido a norma por parte das sucessivas chefias militares, sem que da parte política tenha havido qualquer correspondência.
    Sem embargo “essa cultura” como o ministro lhe chama, não pode é ser aproveitada para fazerem das chefias militares e dos militares gato – sapato, e usarem os constrangimentos da “condição militar” para manterem as tropas silenciadas, ao mesmo tempo que destroem a seu bel – prazer toda a Instituição Militar.
    Em simultâneo não fazem a defesa institucional da mesma – como lhes compete – a não ser em orações de circunstância, já gastas, ao mesmo tempo que passam, continuamente, para a opinião pública a ideia de que a tropa é muita, é cara, é privilegiada, não se justifica e, “last but not the least”, “também tem que participar no esforço financeiro do País” – deixando subentender que o não querem fazer – quando estamos há mais de 20 anos a dar para este peditório enquanto o resto do País folgava e ia a banhos a Cancun!
     Deve ainda sublinhar-se que as FA enquanto tal, não contribuíram em nada, repito, em nada, para o descalabro financeiro do Estado, que é da exclusiva responsabilidade da classe política! [3]
    Mais ainda, os sucessivos MDN têm vindo, faz décadas, a espoliar os orçamentos das FA em favor dos desmandos e desregramento de outros serviços públicos! Desminta se for capaz!
    O Sr. Ministro devia era estar calado e com a cara pintada de preto!
    E como é que tem o desplante de atirar para cima do CEMFA com o ferrete da melhor gestão, quando não há, nem de perto nem de longe, qualquer organismo do Estado que se administre melhor que as FA, em geral, e com a FA em particular?
    E isto note-se, quando o Poder Político tem vindo a esvaziar constantemente as competências da hierarquia militar, não tem permitido um mínimo de factores estáveis de planeamento e destabiliza reiteradamente a IM com anúncios de reorganizações!
    Sabe que mais Sr. Ministro, apesar de nem se poder equivaler a um “infra” [4] o seu castigo é o de se rebater sobre o plano horizontal e tentar desviar o eixo da Terra, aí umas 50 vezes. A última com palminhas atrás das costas…
    “Você, Traço”, pertence a uma classe política que desgraçou o País – apesar de terem todas as condições para o governarem em “velocidade de cruzeiro” – e vem dizer ao Chefe da Força Aérea para definir melhor as prioridades e ser rigoroso no planeamento da acção?
    Será que não se vê ao espelho, ou o mesmo saiu-lhe numa tombola da antiga feira popular?
    Acaso o gabinete jurídico do Estado-Maior devia ter ido pedir pareceres a escritórios de advogados, similares ao seu? Porventura o Director de Finanças devia ter apostado numa “Swap”? Ou o Comandante da Logística, para asfaltar as pistas, devia ter recorrido a uma parceria público-privada? Sim, diga lá?
     Sabe qual era a prioridade que deviam definir? Esta: os senhores nunca mais alapavam o cóccix no “Falcon 50”, até pagarem o que devem, o que teria já levado a muita poupança e á economia da última viagem que fez a Moçambique, tendo o desplante de fazer vir a fragata que combate a pirataria na Somália, ao porto de Pemba, para a visitar e tirar umas fotos com os jornalistas!
    Diga-me ainda: para si o que será mais importante, a FA, o Benfica ou o PSD?
   Presumo que me irá dizer ser o FC Porto, mas a resposta está igualmente errada…
   Ao reconhecer – pelas palavras que exalou – as vulnerabilidades da FA (e por extensão a dos outros Ramos, ou julga que estão melhores?), o que já fez para as colmatar? Vai vender o que resta dos F-16 (que o país não poderá substituir nos próximos 100 anos) para financiar as instalações em falta no Hospital (escusado) das FA, que já está atulhado? Será isso que chama de “aumentar a operacionalidade”?
    E como tem o topete de criticar o CEMFA por suposta exposição de vulnerabilidades, quando o tristíssimo governo de que faz parte teve a inenarrável cobardia de permitir que a “troika” determinasse cortes nas FA? E nem sequer tiveram vergonha de tal saltar para as televisões?
    Finalmente, Sr. Ministro[5] , gosta de desafios? Ei-lo que fica: porque não corta os 36% que o CEMFA referiu, ao orçamento do seu gabinete e melhora a gestão, redefinindo as prioridades? Aceita?
    Dir-me-á, ainda, o que pretende que as chefias digam em público: mentiras? Que está tudo bem (outra mentira)? Que agradeçam ao governo os grandes melhoramentos conseguidos (idem)? Ou porventura se congratulem com as reformas vitalícias (e secretas) dos políticos?
   Ou pretende apenas que se diga, aquilo que na gíria militar se designa por “generalidades e culatras” ou o acto de expelir o líquido excrementício segregado pelos rins, para o calçado que envolve o pé e parte da perna”? [6]

    O General CEMFA limitou-se a dizer o óbvio e até lhe pediu ajuda.
    O que já não é nada óbvio é que um desqualificado para a função, que nem recruta foi, tivesse o desplante de admoestar o Comandante Aéreo Nacional, publicamente e perante formatura das suas tropas.

    Teve sorte, não ter ficado a falar sozinho e, ainda, não lhe ter acontecido o mesmo que ao seu colega “John Garden”, nos idos de 1975, às mãos de um coronel mais “fogoso”.

     Passar bem (longe).


[1] Que se comemora a 1 de Julho, mas cujas cerimónias decorreram na véspera, em Leiria.
[2] E já nem queremos ir para o campo da defesa da Constituição – que juraram defender – senão a discussão nunca mais acabava…
[3] É bom que se diga que as FA custam ao orçamento do Estado cerca de 2%...
[4] “Infra”, idêntico a caloiro da Academia Militar, cuja definição me dispenso de enunciar.
[5] Nem sei se ainda o será quando este escrito der à estampa…
[6] Vulgo “mijar para as botas”.