APONTAMENTO RÁPIDO SOBRE FOGOS
30/07/17
“O Mal não deve ser imputado
apenas
àqueles que o praticam,
mas também àqueles que pode-
riam tê-lo
evitado e não o fizeram”.
Tucídides (460 – 396 AC).
Relembremos: só há
fogo se houver uma conjunção de três coisas, conhecidas pelo “triângulo do
fogo”, a saber: um comburente, uma matéria combustível e uma fonte de ignição
(ou calor).[1]
Presumo que, por
esta altura, autoridades politicas, policiais, bombeiros, até mesmo juízes,
etc., já tenham noção disto.
Ora o oxigénio
(que actua como comburente) é um elemento contra o qual não se deve actuar; o combustível
(neste caso a floresta, as casas, as pessoas, etc.) é justamente, o que se quer
preservar e a acção que gera a ignição é o que se quer evitar.
Desta equação
simples de enunciar, mas complexa de resolver (embora também não convenha
complica-la) se deve partir para a resolução do problema.
Ora a conjugação
simultânea das três variáveis do dito triângulo é extremamente difícil de ocorrer
naturalmente (experimentem colocar umas folhas secas na varanda cobertas com um
fundo de garrafa, ou uma lente, e esperem por uma ignição espontânea, para terem
uma ideia da coisa) restando, deste modo, a mão humana para originar as
catástrofes que nos causticam e castigam desde sempre, mas com especial fervor
nas últimas quatro décadas!
Dado que
precisamos todos – animais e plantas – do oxigénio para a vida, convém
preservá-lo a não ser quando, pontualmente, o suprimimos em espaço e tempo
confinados, num ataque químico a um fogo, resta-nos actuar sobre a matéria
combustível e as possíveis acções que geram a ignição.
Para o
“combustível” é apropriada a prevenção; para a ignição é conveniente o ataque
apropriado e à bruta.
Expliquemo-nos.
Na questão da
prevenção têm sido apontadas “paletes” de acções e soluções, por um conjunto
alargado de especialistas. Mas como este âmbito custa dinheiro, trabalho pouco
visível, nenhumas honrarias, ou oportunidades de negócio (e não rende votos),
não tem havido a menor vontade política em as pôr em prática.
Entre elas estão a
repovoação do interior do País (esperemos que não com migrantes…); a escolha
adequada das espécies vegetais a plantar; a limpeza da floresta; a construção
de aceiros e áreas de segurança; vigilância q.b., leis apropriadas, etc..
Pouco se tem feito
neste âmbito o que, convenhamos, é de suspeitar…
Finalmente existe a questão da ignição.
Ora já vimos que a ignição é difícil em termos naturais – e
que dizer dos fogos durante a noite? - pelo que, para a sua origem, resta a
mãozinha humana.[2]
Mesmo tendo em conta a pressurosa ajuda do Director da Polícia Judiciária…
Estas causas podem
ser englobadas em dois âmbitos: no do descuido, descaso ou acidente – como é o
caso de erros nas queimadas, negligência social quanto a beatas e fogueiras,
etc. - e em motivação dolosa.
A alienação mental
tem sido o bode expiatório para desculpar uns e outros…
Ora tem de haver
maneira de detectar e prender os autores que estão na origem dos incêndios e julgá-los
munidos de um “edifício” legal adequado e duro. Muito duro.
A razão é simples:
enquanto não se cortar a mão ao incendiário (e à mão que eventualmente esteja
por detrás) o problema – que tem consequências catastróficas – não se resolve,
mesmo fazendo a melhor prevenção do mundo![3]
É preciso pois,
investigar (até preventivamente) todas as pessoas/entidades a quem possa
interessar esta calamidade pública, que não deixa de ser também uma forma de
terrorismo.
É que mesmo tendo
fechado o hospital Júlio de Matos, não deve haver assim tantos malucos à solta…
Resta a questão do
ataque aos fogos.
Dizem que há
poucos meios; diria que talvez haja até demais. E estou convicto de que quanto
mais dinheiro o Governo prometa que vai verter neste poço sem fundo, mais
incêndios vai haver…
Creio até que
seria melhor pensar na adequação dos meios e nas entidades que os operam e refundar
de alto abaixo o Serviço Nacional de Protecção Civil e seus componentes.
Verão que ainda poupam
meios, gastam menos e obtêm melhores resultados, embora seguramente, se tenha
que deixar de fora alguns negócios para os amigos e se percam muitos lugares
para a rapaziada dos Partidos…
E, bem entendido,
é necessário parar o massacre que a comunicação social, sobretudo as
televisões, faz sobre este drama e restante acção deletéria.
No fundo toda a
gente opina, grita, discute – normalmente à frente de uma boa refeição, ou no
intervalo da praia – mas quem verdadeiramente tem que decidir sobre estes
assuntos e estabelecer uma estratégia com cabeça tronco e membros e continuada
no tempo, aos costumes diz nada.
A não ser palavras
de circunstância repetidas ano após ano.
Não há autoridade
para nada e estão, ao que parece, democraticamente inibidos.
O que será que os
inibe?
Porque se rendem à
magnitude da tarefa?
Porque não querem
mexer em interesses instalados?
Porque depois da
Ministra Constança ter informado que já contabilizara 7795 (!) fogos desde o
início do ano, isso ainda não lhes parece suficiente?
Será que depois de
ano após ano se prenderem cada vez mais incendiários (o que lhes acontece?), a
PJ e a PGR serão tão incompetentes que nunca conseguiram estabelecer elos de
relação causa/efeito?
Até o Presidente
da República – esse novo bombeiro voluntário dos afectos para todo o tipo de
fogos - não encontrou nada melhor para afirmar, na visita que fez a Mação, do
que “em ditadura lembro-me há 50 anos, era possível haver tragédias e nunca
ninguém percebia bem quais eram os contornos das tragédias porque não havia um
MP autónomo, juízes independentes e comunicação social livre. Em Democracia há
tudo isto”.
Ou seja agora,
felizmente sabe-se tudo e percebe-se tudo. Como se tem visto.
Vão ver que a
culpa dos 64 mortos (?) de Pedrógão Grande ainda vai ser atribuída ao Professor
Salazar.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador
[1]
Recorda-se que combustível é tudo o que é susceptível de entrar em combustão;
comburente, é todo o elemento que associado quimicamente ao combustível o faz
entrar em combustão; calor é a temperatura de ignição (a temperatura acima da
qual um combustível pode queimar).
[2]
Não estamos a falar de excepções como são o enxofre e os metais alcalinos (ex.
o potássio, o cálcio, o magnésio, etc.) que se inflamam directamente no estado
sólido…
[3]
Estivemos há pouco num país do Magreb, onde como se sabe, faz um calor dos
diabos. Neste país existem extensas zonas de floresta em zonas montanhosas de
difícil acesso. Não me parece que a prevenção seja grande coisa; há lixo por
todo o lado; a população é socialmente bastante mais indisciplinada do que a
nossa (e também fuma e faz picnics) e os meios de combate a incêndios são
seguramente mais fracos que os nossos. Não há fogos? Há, mas consegui percorrer
centenas de quilómetros e não me lembro de ter visto nenhuma área ardida.