DONOS OU
EMPRESÁRIOS?
26/11/17
“O que tenho, têm-me”.
Autor desconhecido
Do
mesmo modo que não há escolas para políticos, também não existem cursos para
empresários.
Existem
uns cursilhos, conferências, estágios, colóquios, etc., sobre aspectos relacionados
com a actividade empresarial, mas apenas isso. Tão pouco existe uma carreira de
empresário e, provavelmente, não poderá haver.
Só recentemente se criaram os
“Master in Business Admnistration” (MBA) que são cursos de pós graduação, caríssimos,
mas muito procurados por executivos, gestores e políticos.
Pois
chega-se a empresário por herança ou por se ter adquirido uma capacidade
financeira que permita montar uma empresa. Ou então por designação política…
Ser
empresário tem pois, muito de aleatório na vida das pessoas.
A
escola de políticos é a da vida (quando a têm) e os actuais formam-se na
“escola” dos partidos. Diga-se em abono da verdade, que não podiam ter pior
escola…
Também
não existe uma carreira estabelecida, mas descortina-se uma espécie de caminho
das pedras: militância numa agremiação regional, ou em sindicatos, nas
juventudes partidárias, ou insinuando-se junto de alguns notáveis das
estruturas centrais, ou por “recomendação” de “alguém” – isto sem haver
qualquer selecção, escrutínio ou preparação (é o que aparece…).
Normalmente os mais bem
relacionados arranjam logo um lugar num gabinete ministerial. Daqui passa-se
para um cargo distrital; numa junta de freguesia ou câmara, até que ficam
“elegíveis” (isto é, para serem escolhidos por um chefe partidário) para um
cargo num ministério, para deputados e, finalmente, para o Governo.
Alguns
aparecem de paraquedas, como independentes, mas são normalmente muito mal
vistos e queridos, pelas estruturas partidárias. O único partido que tem algum
cuidado com tudo isto, aparenta ser o PCP.
Mas
hoje não queremos falar de políticos mas sim de empresários.
Portugal,
em boa verdade, nunca teve uma verdadeira “classe empresarial”.
A Nobreza nunca teve apetência
para o negócio. Coleccionava terras, tenças e títulos através de actividade
guerreira e casamentos.
Apreciavam
mais o corso e registam-se apenas umas excepções no Oriente, sobretudo a partir
de Goa, de famílias nobres que se dedicam ao que se pode entender por
actividade empresarial e, normalmente associada ao comércio.
No
Brasil, por exemplo, nem vê-los.
A
burguesia nunca foi forte, tanto em número, como em saber, como em cabedais.
O
Porto é dos poucos burgos que se destaca neste âmbito.
Os
habitantes que melhor estariam habilitados para serem “empresários”, eram os de
origem judaica, mas os eventos originados na ordem de expulsão dada por D.
Manuel I, em 1496, e suas consequências, mataram esta hipótese e as
consequências chegaram aos dias de hoje.
A
Coroa tentou substituir-se à empresa privada – após a experiência do contrato
com o mercador Fernão Gomes, sobre o comercio nas costas da Guiné, em 1469 - a
partir de D. João II, e sobretudo por todo o século XVI, mas a experiência não
correu de um modo geral, bem, pois o “deficit” cedo se fez sentir, não houve
investimento na produção e desenvolvimento interno, descurando-se o que havia. E
os empréstimos contraídos arruinavam-nos ciclicamente as finanças.
A
concorrência estrangeira também não nos poupava e as tentativas de criar
Feitorias em Bruges e na Liga Hanseática, deram alguns frutos, mas acabaram por
ser encerradas.
As
invasões napoleónicas e as guerras que se lhe seguiram, fizeram o país perder
as duas revoluções industriais – e a independência do Brasil deu o golpe de
misericórdia no comércio e na extracção mineira nacional, por então.
As
tentativas de industrialização promovidas pelo Conde da Ericeira, por Pombal e
por Alfredo da Silva, não foram de molde a mudar o panorama geral o que levou a
que o sector secundário (e também o terciário) só começasse a ter expressão a
partir do Primeiro Plano de Fomento, de 1951, o qual já tinha cerca de 20 anos
de respaldo atrás…
Mas
afinal o que é que se pode entender por empresário?
Empresário
(do italiano, “impresario”) é aquele que está à frente de uma empresa; o que
toma a seu cargo uma indústria; entendendo-se por empresa ou empreendimento,
uma associação que explora uma indústria ou negócio.
Sendo o “empreendedorismo”, o
processo de iniciativa de implementar novos processos nos negócios ou mudanças
em empresas já existentes.
Ora
os empresários portugueses de uma forma geral – a qualidade média em qualquer
âmbito é a que mais conta – são pouco instruídos; ligam muito pouco à estrutura
da empresa e à organização do trabalho e ignoram olimpicamente os aspectos
relacionados com a liderança.[1]
Não
gostam de regras, nem de disciplina e olham para as questões de segurança, da
higiene do trabalho e ao bem-estar dos seus trabalhadores – ainda gostava de
perceber porque é que estes passaram a “colaboradores” – não como um
investimento, mas sim como um custo.
De
que normalmente fogem a sete pés.
Passando a adorar a “protecção”
do Estado. E quanto a questões fiscais, aos costumes digo nada.
Mas
a pior característica que um qualquer cidadão colocado numa situação de empresário
é a deste se assumir como “dono” da empresa, desvirtuando dessa maneira
e por completo, o múnus de que se assume.[2]
Esta
atitude tem efeitos devastadores.
Um
empresário será o “dono” da empresa – e ninguém lhe irá tirar essa posse – por
reter a maioria do capital da empresa e as suas instalações e, ou materiais.
Mas
apenas isso.
Ele
não é “dono” das pessoas que trabalham na empresa; não é “dono” das leis que
governem a mesma, tão pouco da estrutura e das regras existentes – que ele pode
até mudar se tiver autoridade para tal – mas que deve ser o primeiro a
respeitar.
Ora
o comum da atitude de um “dono” é a antítese do que deve representar a boa
atitude empresarial.
Como
se julga “dono”, entende que pode fazer tudo o que quiser e nada lhe está
vedado.
Não
sabe ou quer, estabelecer linhas claras de autoridade e níveis diferenciados de
decisão, já que entende que a hierarquia é ele (ou ela). Não sabe, ou tem uma
incrível dificuldade em delegar; mete-se em tudo, ultrapassando quem lhe
apetecer e não respeita a esfera de autoridade de qualquer chefia intermédia,
nem o trabalho de ninguém.
Ora
se é ele que paga, os outros estão lá para fazer e calar…
Ou
seja não respeitam a dignidade do “outro” e as suas funções. Tudo isto só gera
desrespeito, desmotivação, irritação, confusão e incentivo àqueles que já são
mal formados e sabujos.
A
tendência de um “dono” será a de retirar dividendos o mais rapidamente possível,
querer ser rico amanhã (em vez de depois de amanhã), e de descapitalizar a
empresa em proveito próprio ou de familiares, a todo o vapor. O desastre é, por
norma, extenso.
E
não chamamos à contenda o papel e actuação dos sindicatos, quando existem, e
seu muito errado enquadramento legal e constitucional, que só por si daria um
tratado.
As
Forças Armadas e a Igreja poderiam ser um bom exemplo de como actuar no âmbito
que aqui estamos a tratar, mas aquelas duas instituições, felizmente, não
existem para ter lucro … [3]
Não sendo por acaso estar na
moda pessoas com responsabilidades nas empresas irem tirar cursos de liderança
na Marinha, Exército e Força Aérea.
Apesar
de estarem em vias de extinção.
Haver
uma Escola, com maiúscula para ensinar pessoas a serem empresários e não
actuarem como donos, seria de todo útil.
O
“diabo” está porém, nos detalhes.
Da
natureza humana.
Oficial Piloto Aviador
[1]
Estima-se que mais de 50% só tem o 9º ano de escolaridade obrigatória, no
âmbito das micro e pequenas empresas as quais, por sua vez, constituem 90% do
tecido empresarial português.
[2]
Dono, (do lat. Domnu, por dominu), senhor de alguma coisa; proprietário;
possuidor.
[3]
E como eu percebi tal coisa, depois de ter passado à Reserva…
1 comentário:
Bem haja por mais este belo texto que dá que pensar.
Ser empresário não é tarefa fácil... e o insucesso também faz parte do sucesso. A prudência por vezes parece imprudente, mas é esse conhecimento da verdade e das nossas limitações que nos impele a fazer grandes coisas, pois só se vive uma vez. E se a vida medíocre é garantida através da inércia, tudo o resto conseguido através da acção inteligente e audaz é ganho.
Os sonhos tornam-se realidade quando o coração e a mente trabalham em sintonia.
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