segunda-feira, 14 de abril de 2014

PERGUNTAS NUNCA RESPONDIDAS NOS 40 ANOS DE “ABRIL”


“O inconseguimento de eu estar num centro de decisão fundamental a que possa corresponder uma espécie de nível social frustracional derivada da crise”
Assunção Esteves,
Presidente da Assembleia da República
(TSF, em 7/1/2014)
 
Passados 40 anos após a última grande esquina da História de Portugal, já deveria ter havido o discernimento, o bom senso e a vontade (que deles deriva), de fazer uma análise histórica – nas suas diferentes dimensões, nomeadamente política, estratégia, económica/financeira, social e cultural – de todo o período abrangido e que englobasse, para facilidade de entendimento e exposição, três períodos distintos:
 
·    O período da última fase do Estado Novo, por exemplo desde o início do consulado do Professor Marcello Caetano;
·    O período que começa com a acção militar no dia 25/4/74 – suas causas e execução – e por todo o período conturbado, conhecido por “PREC” e termina em 25/11/75;
·    O período posterior até aos dias de hoje, e suas consequências.
Como tal não foi feito (e o que foi feito deixa muito a desejar) e não será feito a breve trecho, vamos cingir-nos a elaborar um conjunto de questões, que falam por si, independentemente do juízo que se intente fazer sobre elas.
São também as respostas às perguntas formuladas, que ajudarão, um dia, a escrever a História que deve ficar para o futuro e não aquela que insistentemente nos têm vindo a inocular como se de uma lavagem ao cérebro se tratasse.
Aqui fica uma mão cheia delas:
1º- Quais as razões que justificam, à luz da Moral e do Direito, a queda pela força do regime deposto?
2º- Se o regime deposto foi tão mau, como alegado por tantos, porque nunca se julgaram os responsáveis vivos, pela sua existência e práticas (nem sequer à revelia)?
3º- Quais as principais razões, assumidas inicialmente pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), para a execução do golpe de estado? Foram razões corporativas (isto é, do foro das FA)? Foi concretamente o Decreto-Lei 373/73 que espoletou o golpe? Foram razões políticas? Estratégicas? Sociais? Económicas? Quais e baseadas em quê? Foi por estarem cansados de fazerem a guerra?
4º- Que informação tinha o MFA sobre a “luz verde” dada (solicitada?) pelo “Grupo de Bildelberg” numa reunião ocorrida a 19/4/74, no Hotel D’Arbois, em Mégeve, nos Alpes Franceses, propriedade do Barão Edmond Rothschild, na qual, entre outros participou Joseph Luns – na altura, Secretário – Geral da NATO – não sendo por acaso que uma esquadra da Aliança fundeou na Barra de Lisboa no dia do golpe?
5º- Desde quando e porquê, o PCP passou a tomar parte no golpe? Desde o “ensaio” ainda mal explicado, das Caldas, a 16 de Março? Ou antes?
6º- O que fazia o General Costa Gomes enfiado com a mulher no Hospital Militar da Estrela, no dia 25/4/74?
7º- Porque é que o Chefe de Governo, Marcello Caetano, nunca deu ordens para conter o golpe e, à revelia do que estava previsto nos planos de contingência da altura, em vez de se dirigir para Monsanto, foi meter-se na “boca do lobo” do Quartel do Carmo? Porque recusou a fuga do mesmo, que lhe foi oferecida e era viável? O que quis negociar com o General Spínola?
8º- Porque é que 90% dos efectivos da PIDE/DGS (na área de Lisboa) decidiram, após o golpe, concentrar-se no local mais inverosímil para o fazerem, ou seja na própria sede?
9º- Porque é que até hoje nenhum governo português intentou uma acção, lógica e pertinente, que é a de solicitar ao governo da Federação Russa, a devolução ou, no mínimo a cópia, de toda a documentação desviada dos arquivos nacionais, nomeadamente da DGS, como não parece haver qualquer dificuldade em provar?
10º- Porque é que o MFA – autor do golpe – e a sua suposta cabeça dirigente, ou seja a, em cima-da-hora formada, Junta de Salvação Nacional (JSN), cometeu a imprudência de não terem declarado o “Estado de Sítio”, perdendo desse modo, e no próprio dia, o controlo da situação?
11º- Ou terá sido de propósito?
12º- Idem para a leviandade com que a nível militar se começaram a prender e a sanear uns aos outros, sem qualquer regra ou justiça, estilhaçando dessa forma a hierarquia, a disciplina e a organização das FA, sem as quais nada se podia levar a cabo? FA que, recorda-se, estavam em campanha em três frentes!
13º- Ou também foi de propósito?
14º- Como e porquê deixaram o Poder cair na rua, chegando-se ao ponto de colocar o país à beira da guerra civil, a qual se evitou “in extremis”, a 25/11/1975?
15º- Porque se deixou entrar no país e libertou das prisões, uma quantidade de gente de mau porte que, recorde-se, não estava presa por delito de opinião, mas incorria em crimes do foro militar, de delito comum e, até, de traição à Pátria, sem que os mesmos ficassem a bom recato à espera de julgamento?
16º- O “granel” desculpa e justifica tudo o que se possa passar?
17º- Como se pode intentar um golpe de estado num país que, não estando oficialmente em guerra com ninguém, conduzia extensas operações militares das quais dependia a salvaguarda de grande parte do seu território e populações, sem pensar muito maduramente no impacto que tal golpe podia ter naquilo que estava em jogo e era de longe, a questão mais importante e delicada em que toda a Nação estava envolvida?
18º- Porque é que os mentores do golpe (e seus seguidores) não conseguiram ou quiseram discernir e perceber, que a defesa do Ultramar era distinta – por nacional – da simples mudança de um regime ou sistema político?
19º- Porque se permitiu que a obsessão política pela conquista do Poder se sobrepusesse a questões fundamentais para o País (e ainda hoje assim acontece…) e se fizesse tábua rasa dos meios para atingir os fins, muitos deles estranhos à matriz histórica, estratégica e cultural de todo um povo?
20º- Como explicar, melhor dizendo, como compreender que o que foi pensado para o dia seguinte – que é a parte mais importante num golpe de estado, ou revolução – neste caso o que estava condensado no Programa do MFA e na Proclamação da JSN ao País – nunca se conseguiu pôr em prática?
Finalmente:
Como explicar que nenhum dos “3 Ds”, constantes do referido programa do MFA, a saber, “Descolonizar, Democratizar e Desenvolver” tenha sido cumprido, ou dito de outro modo, tenha seguido o seu curso, estando hoje o país que nos resta no perigeu do seu poder relativo, desde que Afonso Henriques individualizou o Condado e na iminência de desaparecer como entidade política autónoma e soberana, comunidade com identidade própria e até em vias de extinção como povo com características próprias (por via da demografia negativa, da emigração e imigração, só para citar estas)?
Ou seja, e em síntese por demais sintética:
1º- O “D” da descolonização resultou numa desgraça inominável e na maior vergonha histórica, desde 1128, cuja responsabilidade teremos que carregar como povo e sociedade organizada, para todo o sempre. Tendo, além dos que ficaram deste lado do mar, desgraçado sobretudo os portugueses dos territórios que abandonámos à sua sorte, os quais em vez de descolonizarmos – uma operação já de si aberrante, para a idiossincrasia da Nação Portuguesa, dadas as regras internacionais em vigor – entregámos nas mãos de forças marxistas, e só a essas.
Perdemos “apenas” e em pouco mais de um ano, cerca de 60% da população e 95% do território…
2º- O “D” da democratização está consubstanciado numa Constituição enorme, errada sob muitos pontos de vista, mal escrita, insensata e elaborada debaixo de condicionalismos vários. E, já agora, anti – democrática…
De tudo resultou uma confusão doutrinária de se ter considerado a Democracia em si mesmo, que ela não é, em vez de um meio para se atingir as três aspirações “utópicas” do Estado, a saber, Segurança, a Justiça e o Bem-Estar (por esta ordem); na ditadura da partidocracia (com a agravante de o espectro político estar apenas representado do “centro até à extrema esquerda”- terminologia serôdia que já devia ter desaparecido há muito), baseada em partidos medíocres.
Partidos donde emanam políticos cada vez mais impreparados, na sua maioria autênticos papagaios troca-tintas em que já ninguém acredita nem suporta. E que se blindaram no poder.
Partidocracia que degenerou rapidamente em plutocracia, “corruptocracia” e “bandalheirocracia”!
O fulcro da Democracia acaba por ser a representatividade. Pergunta-se, hoje em dia, quem se sente representado?
3º- Finalmente o “D” do desenvolvimento.
Portugal era um país que em 24/4/1974 tinha estabilidade económica, financeira, social, com uma administração financeira honesta e regrada; onde todas as instituições funcionavam; em que a economia crescia 7% ao ano (no Ultramar era mais); possuía a 6ª moeda mais forte do mundo, escorada e protegida por 850 toneladas de ouro e 50 milhões de contos; tinha acesso ao crédito que quisesse a juros baixos; gozava de pleno emprego.
Conseguia tudo isto, note-se, ao mesmo tempo que tinha 230.000 homens em armas, em quatro continentes e quatro oceanos, dos quais 150.000 permanentemente empenhados em operações de contra-guerrilha, em três teatros de operações distintos a milhares de quilómetros da sua base logística principal, com muito limitado apoio aliado e apenas com generais e almirantes portugueses.
Orgulhosamente só (frase por norma tirada do contexto).
E sem dever nada a ninguém.
Como explicar que um país nestas condições, 40 anos depois dos “amanhãs que cantam” e das mais floridas esperanças, esteja no actual estado de banca rota e muito “acompanhado” internacionalmente, por tantos países e instituições que nos desqualificam, publicamente, no concerto das Nações (até nos chamam “PIGS”)?
Esteja, também, ocupado politica, económica e, sobretudo, financeiramente, por uma “Troika” (que ninguém sequer conhece bem, ou o que representa), depois de já ter passado por duas outras grandes "aflições" financeiras (em 1978 e 1983), que obrigaram à intervenção do FMI; e depois da adesão à CEE, em 1986, ter entrado dinheiro no país à média de dois milhões de contos/dia, de fundos comunitários?!
E estamos hoje ainda a tentar evitar a banca rota à custa de sacrifícios de quem não é responsável maior por tudo o que se passou; deixando incólumes os responsáveis (que nem um pedido de desculpas se atrevem a dar), e da alienação contínua da soberania, das empresas, do património, da venda da própria terra e dando até início a um processo de prostituição colectiva, de que a outorga da nacionalidade a ricaços estranhos que queiram investir por cá algumas centenas de milhares é já exemplo eloquente!
Já me esquecia, estamos a sair da bancarrota à custa de fazermos mais empréstimos, com os quais ganhamos tempo para tentar pagar uma dívida e os juros da mesma – que ninguém sabe quanto é – mas que seguramente não iremos pagar nos próximos 100 anos…
Em que opróbrio de país nos tornámos?!
Foi para isto que se quis a tão decantada Liberdade – um conceito absoluto, porém de aplicação relativa – entusiasticamente tida como a principal conquista de Abril?
Ao fim de 40 anos celebra-se o quê?
João José Brandão Ferreira
Cidadão Português (nada, mesmo nada, satisfeito)
(Beneficiário nº 11337317689 da CGA)

15 comentários:

Anónimo disse...

Tempo para recordar dois ilustres escritores;
Miguel Torga escrevia em junho de 1975:" A mais imunda vasa humana a vir à tona, as invejas mais sórdidas vingadas, o lugar imerecido tomado de assalto, a retórica balofa a fazer de inteligência"
Jorge de Sena, de regresso aos EUA pouco tempo depois de Abril,desabafava à esposa:"A revolução acabou, naquele país só há ódio"
Ao fim de 40 anos celebra-se o quê, meu tenente coronel?
A cilada ganha pelo gang ultra-mafioso que passou a dominar com máscara democrata - até prova em contrário.
Para essa gente: "Até quando,traidores, continuareis a abusar da nossa paciência?"
D.Pinto

Lucas disse...

Muito informativo.

Anónimo disse...

Perguntas que não responderam, nem responderão nunca, porque há muita coisa que não querem que se saiba.

Um abraço
Joaquim Mexia Alves

Manuel CD Figueiredo disse...

Uma pessoa até fica sem fôlego!
A melhor forma de celebrar os 40 anos de Abril, para que a data seja respeitada, seria que o país respondesse às questões aqui postas. Agora! Já deviam ter sido há muito esclarecidas: ter-se-ia evitado, penso eu, tanta baixeza política!

P.S. neste quadro de miséria total, o artigo não poderia ter começado melhor: com a inacreditável declaração da presidente da AR. Também por aí se vê...

Ricardo disse...

Muito bem sr Coronel,só se perdem as que caiem ao chão como se costuma dizer.Curiosamente hoje parece que há uma reunião "de afectos"(vejam bem)entre a representante do inconseguimento e os representantes do 25 de Abril.

zevicente disse...

Ainda há gente que pense, e fale claro. Absolutamente de acordo, meu Ten.Cor., e estamos consigo.

Anónimo disse...

Senhor Tem. Cor. Brandão Ferreira,

Num Pís digno e sério, este seu texto seria objecto de discussão num qualquer "Prós e Contras" com participação de todas as correntes, mesmo que houvessem umas estaladas pelo meio, que ainda falta serem dadas, para que o "povo" começasse a perceber o que lhe andam a esconder há 40 anos.
Não se cale.
Melhores cumprimentos,
Miguel Sanches

jorge figueiredo disse...

estou plenamente de acordo,com tudo o que o senhor disse,sou um combatente como muitos,e vejo este pais cheio de oportunista e vendilhões.

Fernando Mota disse...

A verdade é como o azeite, vem sempre ao cimo. Muito obrigada Sr. Tenente Coronel, bem haja.Pode ser que os jovens que lerem o seu texto possam, finalmente, saber porque se fez, realmente, ou pelo menos informarem-se devidamente. Por favor continue a publicar estas verdades. Pela minha parte fico feliz por ainda haver militares como o senhor.
Mais uma vez muito obrigada.
Maria João Seixas Quinhones de Magalhães Mota (filha do falecido Coronel de Infantaria Emiliano Quinhones de Magalhães e ex-aluna do Instituto de Odivelas)











Alexandra M. Souto disse...

Exmo. Sr. Ten. Coronel,

Apoio incondicional às sua palavras.

Há 40 anos q vivemos numa ditadura de direitos e liberdades, q não é outra coisa, senão privilégios e regalias para uma minoria por um lado, e por outro lado, faltas de educação, ausências de carácter e de princípios e carência de cidadãos com miolos....

Por mim celebrarei o dia 24 de Abril como o dia da "Saudade"...!

Saúde!

Melhores cpts,
alexandra m. souto

Santos Oliveira disse...

Não houve Revolução no 25 de Abril de 1974. Houve tomada do Poder. E é com esta base que os sucessivos "Executivos" deixaram cair o conceito de Governar e de Governo para se auto intitularem de PODER.
É só o que sabem ser. Lamento tal postura, pelo nosso País e pela nossa Pátria que "eles" revelam o seu total desconhecimento.
A Pátria é o Povo com os seus Valores.
Santos Oliveira

Anónimo disse...

Brilhante! Se não se importar, vou colocar este texto no meu blogue.

Cumprimentos.

José Pinto-Coelho disse...

Sr. Tenente-Coronel, eu não concordo o 100%, mas sim a 200%! Palavra por palavra!
Já agora deixo aqui um de minha autoria:
http://www.pnr.pt/mensagem-do-presidente/presidente-aos-nacionalistas-abril-de-2014/

Ontem, o PNR esteve numa acção de protesto à porta da AR, tendo vaiado todos os senhores da situação à medida que saiam.

Só há (obviamente!) uma solução para Portugal que é o nacionalismo. E essa passa pelo apoio ao PNR.

(desculpe a propaganda aqui, mas creio que há muita gente descontente - e com razão! - e que pensa como nós, mas que nem sonha que existe um partido que as representa)

Unknown disse...

Meus parabens ao Tenente-Coronel Brandão Ferreira, o qual sempre apoiarei pois demonstra Carácter e Honestidade, além de Coragem para denunciar esse Regime abrileiro podre. Questões que nunca foram respondidas, pois os traidores não teem sequer Defesa perante o estado em que deixaram Portugal, nesses 42 anos.

Unknown disse...

Boa tarde Maria e Magalhães Mota,

Sou um investigador em Históra sobre a guerra colonial portuguesa e interesso-me a figura do seu pai, o oficial Emiliano Quinhones de Magalhães. Você seria disposta para me ajudar a fazer avançar as minhas investigações nessa matéria.

Muito Obrigado,
Mehdi Djallal