sábado, 5 de fevereiro de 2011

A FORÇA AÉREA E O ESTADO DO SÍTIO

Publicado no jornal "O Diabo" de 15 de Fevereiro de 2011


Soubemos, por uma notícia da agência “Lusa” que o Sr. Ministro da Defesa (MDN) afirmou que a Força Aérea Portuguesa (FA) “está disponível para repatriar todos os portugueses que desejem abandonar o Egipto” e que os “meios da FA estão, evidentemente, como é sua obrigação, empenhados nessa operação de repatriamento” (sublinhados nossos) e, ainda, que a “operação é tutelada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros” (MNE) o que não se sabe muito bem o que tal quer dizer, já que o MNE não comanda qualquer força militar.

Finalmente, que “nunca as FAs faltaram às suas obrigações no que diz respeito a uma das suas missões constitucionais…”.

O que o Sr. ministro não disse é que as missões estão a ser feitas no fio da espada e que está tudo preso por arames, cada vez mais finos. E não referiu também que não lembraria a nenhum Estado-Maior, deixar partir turistas para uma área de conflito perigoso (para depois os ter que repatriar...), numa demonstração grosseira de falta de informação estratégica e, ou, capacidade de análise e decisão. Já bastaria ter que ir buscar os que lá foram apanhados desprevenidos!

E está tudo preso por fios (ou “pinças”) porque a desmontagem das capacidades militares efectuada nos últimos 25 anos, tem desmantelado de tudo um pouco e as carências em pessoal, material e financeiras são gritantes. E isto não tem nada a ver com a actual crise económico/financeira de que, aliás, as FAs são completamente alheias.

No caso em apreço a FA dispõe de seis aeronaves C-130, com cerca de 30 anos de serviço, cada vez mais difíceis de manter e a necessitar modernizações urgentes, e cuja substituição já deveria estar a ser equacionada e processada há meia dúzia de anos. A prontidão é, assim, baixa e um dos aviões destacados para esta operação foi confrontado com uma avaria em Creta. Teve que se transportar uma equipa de manutenção de Falcon, para se resolver o problema.

Quanto a pessoal a situação ainda é mais crítica, já que a Esquadra só dispõe de três tripulações e meia (a média dos últimos 10 anos deve rondar as quatro - ou seja é um problema crónico), quando para uma exploração adequada da frota, devia dispor de 12 (julgo que na FA ainda haverá alguns oficiais capazes de explicar ao Sr. MDN o porquê). A situação é de tal modo crítica que já se chegou ao ponto de ter um Oficial General no Estado-Maior a cumprir missões regulares na esquadra e para se cumprir o actual repatriamento, teve que se ir buscar um ex-comandante de base, a frequentar o curso de promoção a Oficial General, em Pedrouços.

E tudo isto porque não mais se parou de menorizar a condição militar, a partir de 1982 (fim do Conselho da Revolução e entrada em vigor da Lei da Defesa Nacional e das FAs), e de se tentar reduzir a Instituição Militar à expressão mais simples, tendendo para “zero”.

No caso particular dos pilotos (e outras especialidades críticas), a causa principal – além dos “dourados” da farda, já não terem brilho – é a disparidade pornográfica com que o mesmo patrão, isto é o Estado, trata dos seus “servidores” em termos de vencimentos e regalias sociais.

No caso vertente focamo-nos nas empresas públicas de transporte aéreo, com destaque para a TAP. É impossível reter pessoal navegante, quando um co-piloto entra na TAP a ganhar o mesmo que o Chefe de Estado-Maior do Ramo, ou quando um comandante na vida civil (a quem nem sequer é exigido uma licenciatura), ganha três vezes mais do que um Coronel (ou mesmo mais), e quando os pilotos de longo curso fazem, em média, um voo, vírgula qualquer coisa (leram bem?) por mês! Isto porque em vez de terem sete tripulações por avião, têm cerca de 12, quando seis já lhes dariam uma vida confortável.

Mas mesmo tendo gente a mais (ou aviões e ligações a menos), acabaram de abrir mais um concurso para pilotos que vai levar mais uns quantos oriundos da FA, isto, claro, se as vagas não forem todas preenchidas por filhos de funcionários da “casa”, dadas as “tradições monárquicas” de longa data, existentes. Mas quando é preciso ir arriscar a vida e, ou, cumprir missões difíceis e arriscadas vai a FA, pois é sua “obrigação”.

A FA não tem obrigação, mas sim o dever de cumprir as missões que lhes estão consignadas, e tem-no feito com eficácia, apesar dos constrangimentos apontados. O governo é que tem a obrigação de lhe proporcionar os meios necessários e consentâneos com essas mesmas missões e prover à equidade social dos seus mais fiéis servidores. E pôr na ordem quem exorbita, ou não cumpre o que lhe é devido, ajoelhar constantemente quando o sindicato dos pilotos, vírgula, da TAP, ponto, ameaça fazer greve; ser incapaz de sanear as contas de uma companhia que desde 1974 não dá lucros e que acumulou um passivo de cerca de 2,3 biliões de euros (segundo o relatório e contas de 2009, com tendência para aumentar…) – como é que dizem que a querem privatizar?

E pagam a um estrangeiro para servir tal empresa mais de duas vezes o vencimento do presidente dos EUA. O que, incrivelmente, ou não, só foi dado conta, há uns dias, pelo directório de um partido da oposição! A TAP está tecnicamente falida e em situação ilegal, pois está com os capitais próprios negativos o que não é permitido pelo código das sociedades comerciais (artº 35).

Não consta, porém, que toda esta situação incomode qualquer jornalista ou comentador, ou tire o sono a nenhum general ou almirante (já nem vale a pena falar em políticos…).

No fim disto tudo não se vai resolver coisa nenhuma e o abaixo-assinado é que vai passar por ser o “chato” da fita. Além de ter acabado de ganhar mais uns quantos inimigos.

3 comentários:

Dário Teixeira disse...

Não entendi no seu texto,se são os pilotos da TAP que ganham de mais,se são os da Força Aérea que ganham de menos,seja como for, há que repor alguma verdade aqui.


"Luís Araújo tornou-se assim no primeiro general a entregar a sua declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional, apesar de ter sido com quase um ano de atraso. Isto porque as chefias militares só entregaram os documentos, após os juízes conselheiros terem esclarecido, a seu pedido, que eram obrigados a declarar os seus bens por integrarem o Conselho Superior de Defesa Nacional. A dúvida dos chefes militares prendia-se com o facto de não possuírem cargos predominantemente políticos.

Além de rendimentos de trabalho dependente no valor de 95 865 euros, o chefe do Estado-Maior da Força Aérea declarou ter recebido pensões na ordem dos 5570 euros. Como património imobiliário registou um apartamento T4 em Algés, uma casa em Vila Real e um terreno em Coimbra."

In Correio da Manhã




Sou Copiloto da Tap à cerca de 7 anos, a minha declaração de IRS este ano vai ser de 75.000 euros brutos,e já agora faço em média 3 voos por mês.
Enfim,estes artigos de opinião já metem nojo,pois o nome da Tap,e os pilotos da Tap, servem para todo o tipo difamação infundada.

Alexandre Gomes disse...

Caro senhor acho curioso o seu comentário de só ganhar €75000 por ano e fazer 3 voos por mês. Eu também sou co-piloto na FAP há cerca de 5 anos e ingressei na FAP há 13. O meu ordenado não chega a €35000 por ano, ou seja menos de metade do que aufere na TAP. Agora lhe pergunto, alguma vez lhe telefonaram à hora de jantar ou às 3 da manhã para ir fazer um voozinho? Se calhar até já o fizeram mas com certeza o senhor teve a oportunidade de dizer "Não obrigado". Eu não tenho essa hipótese pela condição que regula a minha situação profissional e nem por isso recebo mais ao fim do mês tal como você... Ao passo que você faz 3 voos por mês e pernoita em hoteis de 5 estrelas em S.Paulo, Luanda ou Maputo, pagos por uma instituição que só dá prejuízo ao estado e suga o capital ao contribuinte para que você possa pernoitar (quem sabe mais que uma noite por causa do crew-rest) em hotéis de 5 estrelas. Sabe o que me acontece a mim? Tenho umas "férias" pagas de 1 mês num país que não é o meu e onde vou dar o meu contributo por uma causa que me é alheia mas que o meu país achou por bem participar. Nessas "férias" posso voar 3 vezes por dia e em condições que você nem tem ideia. Já agora o meu hotel de 5 estrelas é um contentor metálico quente no verão e frio no inverno e onde tenho de andar 50 metros em estrada de terra batida para usar uma casa de banho... Isto tudo para dizer que o senhor não tem nenhuma razão nessa sua intervenção. Os pilotos da TAP não se podem queixar de nada, ou melhor não devem queixar-se, porque aqui quem não se pode queixar sou eu, a não ser em casa...

Adamastor disse...

Caros leitores, volto a avisar que só permito comentários identificados, tal como consta na norma de publicação de comentários do meu blog.
De outra forma, não os posso publicar por uma questão de coerência.