sexta-feira, 14 de setembro de 2012

A SEGURANÇA DE VOO E A “PRIMA”

Desde que os irmãos Wright conseguiram, em 17/12/1903, que o mais pesado que o ar se deslocasse 36 metros acima da superfície terrestre, desafiando as leis da gravidade, que é assim![1]

Já para não recuarmos à “Passarola” do nosso Gusmão, que não saiu da fase de projecto. E que projecto esse poderia ter sido! Talvez conseguíssemos ter feito no Ar o que tínhamos feito no Mar, 200 a 300 anos antes…

Nem o grande Sacadura Cabral, instructor do primeiro curso de pilotos militares, efectuado em Portugal, no já longínquo ano de 1916, em Vila Nova da Rainha, o conseguiu evitar. E como foi pena ter desaparecido no Mar do Norte nesse aziago voo da Holanda para Lisboa, em 1924!

Logo ele, de que tanto se poderia esperar.[2]

Mas enfim, devem estar todos ansiosos por saber o que tem a “prima” a ver com isto, sem embargo de algumas “avantesmas”, descendentes da “Aviação Heroica”, ainda vivos, já terem certamente percebido.

Bom, a “prima”, melhor dizendo a “visita” à mesma é, provavelmente, a mais antiga causa de indisciplina de voo e de um número de acidentes/incidentes/perdas de vidas e bens, não despiciendo.

A “visita à prima” explica-se em duas penadas: trata-se de um avassalador ímpeto interior, resultante de um fogo vaidoso do ego, que impele o “Zé Aviador” a arriscar fazenda, normas e integridade física, a fim de poder mostrar-se à prima. Prima esta que resulta da síntese, de um conceito alargado de familiares e amigos onde assume especial relevo o ser que, no momento, faça bater mais fortemente o coração entre ânsias e suspiros: a namorada (agora, também, o namorado).

Para impressionar a dita cuja, todas as precauções se abatem e os medos se afugentam e já que “perdido por um perdido por mil”, há que, invariavelmente, planear a cena para que a “máquina” passe raivosamente baixa (eventualmente raspante) e com a maior velocidade possível (tipo “motor aos copos”), de modo a causar o máximo de impressão na retina, nos tímpanos e, até, nos pêlos do nariz dos eventuais espectadores. De preferência avisados previamente (para não se atreverem a perder o espectáculo), da hora da passagem.

Caso a meteorologia, o local e a habilidade do “artista” sejam propícios, ainda se tentará fazer umas “piruetas”, vocábulo com que os simples costumam apelidar as figuras acrobáticas feitas pelos senhores aviadores.

Um recente “incidente” ocorrido – de características insólitas, até – que não caiu, por bambúrrio, na praça pública suscitou, digamos, esta chamada de atenção.

É que por mais (maus) exemplos que se refira, com que se queira ilustrar os perigos e desadequação do acto; das sanções disciplinares, latentes ou aplicadas, com que se possa acenar; da melhoria da instrução que se foi registando ao longo dos tempos; da maior visibilidade e falta de tolerância cívica por semelhantes situações e, ainda, a maior consciencialização e exigência profissional de toda a operação aérea, etc., a visita à prima irá continuar.

Por isso não se pode descurar a mentalização, vigilância, supervisão e as sanções – numa palavra, a liderança – sobre este peculiar aspecto da “Conquista do Ar”, a fim de tentar manter o número de ocorrências o mais baixo possível - e quando surgir a oportunidade (é fatal como o destino), uma nave espacial há - de fazer uma “rapada” na superfície da Lua ou num meteorito qualquer, logo que apanhe o “Houston Center” distraído…

A razão é simples e é apenas uma: enquanto a natureza humana for aquilo que é, não há prima que não seja objecto de tentação.

Poder-se-ia tentar conseguir que a dita cuja não estivesse presente na data/hora/local, desse evento de excitação extrema, digno do melhor marialvismo. Mas digam-me, algum de vós acredita mesmo, que a “prima” seja ele quem for, se queira subtrair a tão feérico momento?

Entretanto o Gabinete de Investigação e Prevenção de Acidentes com Aeronaves continua há meses, apenas com um investigador e com o seu director demissionário.

Façam o favor de irem tentando aterrar melhor do que descolam.



[1] A acreditarmos nos americanos e não nos brasileiros que contestam tal feito e reclamam o pioneirismo para Santos Dumont, com o voo que efectuou, em 23/10/1906, em Paris; ou nos franceses, que defendem que o seu compatriota Clément Ader o fez, em 9/10/1890, não se tendo sabido, na altura, por ser segredo militar. Uma coisa parece certa: é a este cidadão francês que se deve a invenção da palavra “avion”, que foi adoptada por todo o mundo.
[2] Segundo rezam as crónicas Sacadura Cabral andava, a estudar a hipótese de realizar um voo seguindo a rota da viagem de Fernando de Magalhães de circum-navegação.

1 comentário:

Anónimo disse...

1967 : a TAP torna-se a primeira companhia aérea europeia a operar exclusivamente com aviões a jacto.

http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2012/09/primeiro-aviao-jacto-da-tap.html