D. Manuel Linda |
“O que nasce torto tarde ou nunca
se endireita”
Provérbio popular
O Bispo D. Manuel Linda foi
nomeado Bispo Ordinário Castrense – designação dada ao Bispo das Forças Armadas
e de Segurança (FaeS) – em 10 de Outubro de 2013, mas ainda não tomou posse
oficial.[1]
Já lá vão seis meses.
Porque se chegou a uma situação
destas, que parece não incomodar ninguém?
Eis o que vamos tentar dilucidar.
Através do decreto nº 389/87, de
17 de Março de 2001, a Santa Sé separou o múnus de Ordinário Militar de
Portugal do de Patriarca de Lisboa ficando, deste modo, o Ordinariato Castrense
de Portugal, com um Bispo titular.
Esta solução andava a ser
preparada desde que o Cardeal D. António Ribeiro nomeou D. Januário T. Ferreira,
em 22/4/89, para auxiliar do Ordinariato Castrense (OC) com o título de Bispo
de Gaudiaba com sagração, no Porto, em 15 de Julho do mesmo ano, a que se
seguiu a sua nomeação como Vigário Geral Castrense, em 25 do mês seguinte.[2]
Só na sequência do referido
decreto de 2001 foi nomeado Bispo das Forças Armadas e de Segurança (FAeS), em
3 de Maio desse ano, tomando posse em Fátima a 22 de Julho.[3]
Por alturas de 2002 existiu
alguma controvérsia, por causa de se saber se teria que abandonar funções por
via de ser graduado em Brigadeiro e dever passar à reserva por limite de idade,
face ao prescrito nos estatutos do OC. [4]
Nova controvérsia surgiu, em
2008, quando fez 70 anos, idade em que nenhum funcionário do Estado pode
continuar em funções, a não ser com autorização do Primeiro-Ministro, o que
não consta ter existido.
Questões nunca esclarecidas.
Questões nunca esclarecidas.
O certo é D. Januário ter continuado
“de facto” como Bispo Castrense, embora toda a documentação da Capelania-Mor
passasse a ser assinada pelo CMG Padre Amorim, entretanto nomeado Vigário-Geral Castrense e graduado em Major General
por um Conselho de Chefes Militares.
Continuou pois “ao serviço” até
completar 75 anos, ou seja, até 26/2/13, altura em que a Santa Sé o passou à
categoria de “Resignatário” (Emérito), condição, ao que consta, que ele aceitou
muito pouco resignado… Mas, “Roma locuta causa finita est”.[5]
Com a resignação de D. Januário
(que de facto nunca saiu de cena!) continuou no cargo de Capelão-Chefe (o
“Mor” passou, entretanto, a “chefe”) das FAeS, o Capelão Amorim, que, aliás,
nunca se tinha assumido como tal. Este, por sua vez, aposentou-se em 31/12/13.
Para que o “poder não caísse na
rua”, foi nomeado para o lugar, em meados do pretérito mês de Janeiro, o CMG
José I. F. da Costa.
E quem é que o nomeia? Pois o
novel Bispo D. Manuel Linda, mesmo sem tomar posse oficial do lugar!
Porém, cabe aqui referir que
o Direito Canónico prescreve (cânone 382, §2), que um novo Bispo tome posse dois
meses após a sua nomeação por Sua Santidade o Papa, tendo o Núncio Apostólico
autoridade para estender o prazo mais um mês, o que este, aparentemente, fez.
Como, chegados a Janeiro, o problema
da tomada de posse oficial, isto é, com a presença de membros do Governo, das
FAs e de Segurança, não estava resolvido, foi decidido que D. Manuel Linda
tomasse posse canonicamente, se assim se pode dizer, em Fátima, no dia 24/1/14.
O que ocorreu.
Estiveram presentes os capelães
em serviço, sendo estes que verdadeiramente lhe “deram posse”, a modos como
acontecia na aclamação de um novo Rei, nas antigas Cortes Portuguesas (de
saudosa memória).
E aqui voltamos ao cerne da
questão: por que motivo ainda não foi dada posse oficial a D. Manuel Linda? Parece
haver luz ao fundo do túnel lá para 8 de Abril…
As questões a resolver são,
aparentemente, as seguintes:
- A sua graduação;
- O seu vencimento;
- A sua morada.
Tudo isto tem a ver com o Dec. -
Lei 251/2009, de 23/9, que regula o exercício da assistência religiosa nas FAeS
(presumo que seja alterado antes da posse do novel Bispo).
Este decreto-lei está assinado
pelo então PM, Eng. José Sócrates e pelo PR, Prof. Cavaco Silva e teve a sua
génese principal na Direcção de Pessoal e Recrutamento Militar do MDN e na
pessoa do senhor Bispo Januário, levou muito tempo para ver a luz do dia, tendo
os pareceres do EMGFA sido praticamente todos ignorados...
Este Decreto-Lei deixou tudo
armadilhado.
O decreto-lei, muito “modernaço”,
tenta garantir que todas as confissões religiosas existentes em Portugal possam
ter a acesso ao apoio religioso a militares e policias, em bases iguais,
fazendo tábua rasa de 900 anos de História.[6]
Chama-se a atenção para a “dislexia”
organizacional (que já vinha do anterior), de colocar um órgão (a capelania –
mor) debaixo de dois ministérios diferentes, ferindo o princípio hierárquico da
unidade de comando e de não se saber quem manda no Bispo para além do Papa. Quer
isto dizer que, em termos militares, não pode haver dúvidas de quem é que dá
louvores e punições e assina o passaporte de férias.
Ou seja atirou-se o Bispo e o
Capelão-Mor para o limbo, que é uma espécie de “tertium genus”, ou seja a
“metade do caminho entre duas coisas”…
Mais grave do que isso, a actual
legislação extinguiu o quadro de capelães militares prevendo que, à medida que
os existentes forem morrendo ou saindo, sejam substituídos por ministros da
religião, numa espécie de “comissão de serviço”, obviamente paga.[7]
Ou seja, a assistência religiosa
vai ser feita em regime de “outsourcing”, restando saber como é que e em que condições,
por exemplo, se envia um “capelão” para Cabul, prestar assistência às tropas…
Partindo do princípio que vai
haver tropas…
Quem legislou uma coisa destas
parece entender pouco sobre o que legisla, já que um corpo militar não pode nem
deve funcionar sem elementos devidamente integrados. Ou seja, os capelães, como
os médicos, os engenheiros, toda a espécie de especialistas, etc., quando
integrados numa unidade militar, têm que ser militares e terem formação
militar. Ou seja, deve ser um deles, não devendo haver excepções![8]
As questões administrativas
fundamentais ao dia-a-dia das pessoas e das funções não estão, outrossim,
claramente definidas.
Daí, pois, que não estando o
Bispo das FAs integrado devidamente na estrutura militar, não possa ser
graduado, não tenha vencimento, nem possa ser acomodado.[9]
Ou, mais prosaicamente,
esqueceram-se simplesmente destas coisas.
Numa palavra, parece
inacreditável como os poderes instituídos, a saber, governantes, Santa Sé,
Conferência Episcopal, Chefias Militares e a própria Presidência da República
tenham deixado um assunto de tal importância a marinar durante tantos anos e a
ter um desfecho destes.
Não é uma questão de somenos!
Tendo como resultado factual –
induzido ou por casualidade distrativa – que o Bispo senhor D. Januário se
tenha perpetuado em funções, se tornasse quase insubstituível e que depois dele
seja o dilúvio![10]
Como pano de fundo temos as
dificuldades havidas de regulamentar devidamente a Concordata (assinada em
18/5/2004), que se arrastou e arrasta faz anos e que, salvo melhor opinião,
nunca chegará a bom termo enquanto a (s) Maçonaria (s) tiverem a influência que
têm nos principais órgãos do Estado.
Lamentavelmente o novo Bispo
castrense vai herdar uma situação muito complicada sem ter qualquer
responsabilidade em tudo o que aconteceu.
Tudo isto teve origem na infeliz
decisão da Igreja Portuguesa num momento em que, não sabendo o que fazer com D.
Januário, o despachou - sem guia de marcha - para o seio dos militares e
polícias.
Também estes, sobre o assunto, e
até hoje, não atinaram com nada.
[1] D. Manuel Linda nasceu em Resende, em 15/4/1956 e ascendeu a Bispo de Vila Real em 27/6/2009.
[1] D. Manuel Linda nasceu em Resende, em 15/4/1956 e ascendeu a Bispo de Vila Real em 27/6/2009.
[2] Quando o bispo é nomeado e
não tem diocese territorial, dão-lhe o título de uma diocese extinta,
habitualmente em território de uma ex - missão. Daí o termo “Gaudiaba”. Do
mesmo modo deram-lhe o título de “Vigário” pois era Bispo sem diocese própria.
[3] Daí ter passado a
“Ordinariato”, título destinado a Bispo com sede própria.
[4] Quando fez 64 anos. Recorde-se
que D. Januário nunca se fardou (a não ser para tirar foto para o BI) – e
também nunca ninguém se incomodou com isso – mas não “abdicou” do vencimento
relativo ao posto ou a qualquer outra prerrogativa que lhe assistia.
[5]
“Roma falou a causa está resolvida”.
[6]
Foram invocados os Decreto – Lei 93/91, de 26/2, alterado pelo Decreto – Lei
54/97, de 6/3; que regulou a assistência religiosa das FAs; Lei 16/2001, de
22/6 (lei da liberdade religiosa); os Artigos 17 e 32 da Concordata, e ouvidas
a Santa Sé; a Conferência Episcopal e a Comissão de Liberdade Religiosa.
[7]
Vejam, por ex., esta pérola do Dec. Lei: Cap. IV, art.º 15, nº 1 “É extinto o
quadro do pessoal capelão…”Cap. III, art.º 9 “o capelão – chefe e os capelães
adjuntos são recrutados….para os quadros permanentes…”
[8]
E nada disto põe em causa o artigo 4º da Convenção de Genebra III, de que cito
parte “As pessoas que acompanham as FAs sem fazerem parte delas, tais como os
membros das tripulações dos aviões militares, correspondentes de guerra,
fornecedores, membros das unidades de trabalho ou dos serviços encarregados do
bem – estar das FAs desde que tenham autorização das FAs que acompanham, as
quais lhe deverão fornecer um bilhete de identidade, etc.”
[9] O Bispo D. Manuel Linda é
reformado do ensino e, por isso, vai ter que optar pelo vencimento que vier a
ter, o que não creio possa constituir problema.
[10] Como toda esta situação
ainda não está deslindada, a missa que vai ser celebrada por alma dos militares
do MFA, já falecidos, prevista para o dia 24/4, na Capela do Rato (e não na
Igreja da Memória, sede do Ordinariato Castrense), ainda se arrisca a vir a ser
oficiada por…. D. Januário (que fique claro que não temos nada contra – faz,
até, todo o sentido).
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