domingo, 25 de junho de 2017

UM 10 DE JUNHO DIFERENTE



UM 10 DE JUNHO DIFERENTE
23/6/17

Não, não foi por o Presidente da República e sua comitiva terem debandado para as atribuladas terras de Santa Cruz e nem ter sido recebido pelo Presidente Brasileiro – que não tinha que o receber, a não ser por cortesia, já que o PR não ia em visita oficial e, além do mais, ia com o fito de comemorar o dia da sua terra em terra alheia [1] ; não, não foi por se ter finalmente uma comemoração popular em cada cidade e vila, como por décadas e, até séculos, se festejava o dia da Restauração, no 1º de Dezembro; também não foi diferente por, finalmente, a Comunicação Social se dignar ceder duas linhas ou imagens de atenção que fosse, ao que se comemora na “Homenagem Nacional aos Combatentes”, junto ao Forte do Bom Sucesso, no Restelo, cujo programa é único e tem razões específicas para ocorrer.
Não, o 10 de Junho (para quem não sabe é o Dia de Portugal…) foi diferente porque foi comemorado na portuguesíssima terra de Olivença.
Em boa verdade já no ano passado tal facto tinha ocorrido mas, enfim, só este ano tivemos o gosto de participar…
A grande importância da comemoração tem a ver com o facto de Olivença e seu termo (cerca de 430 Km2), estar ocupada ilegalmente por Espanha desde 1807, e o Estado Português (que representa a Nação politicamente organizada) não ter até hoje conseguido a sua retrocessão.
Estado Português que não tem um único crédito a seu favor no evento que ora expomos.
De facto, o mesmo foi organizado pela Associação Além - Guadiana, fundada em 2008, por oliventinos que sentiram em si o sentimento da Portugalidade, e que já lograram concretizar um conjunto de iniciativas louváveis.
Deste modo passou a haver quatro tipos de alentejanos: os do Alto Alentejo; os do Baixo Alentejo; os da margem esquerda (do Guadiana); e, agora, os do termo de Olivença…
Para este evento concreto, associou-se o conhecido ex-deputado e dirigente do CDS-PP, Dr. Ribeiro e Castro, que se interessou por toda esta tentativa quando liderou a Comissão Parlamentar dos Negócios Estrangeiros e recebeu, por várias vezes, delegações dos “Amigos de Olivença” – patriótica instituição da “sociedade civil” que, sem qualquer apoio do Estado, tem desenvolvido ininterruptamente desde a sua criação, em 15 de Agosto de 1938,uma luta tenaz e persistente pela causa de Olivença portuguesa – na sequência de uma petição por eles promovida.
As autoridades espanholas têm condescendido com estas iniciativas, pensamos nós, para aliviar tensões; por terem problemas mais graves noutras regiões; darem uma de “progressistas” e multiculturais e, sobretudo, por nada ter ainda tocado o âmbito da soberania.
Em Olivença não há tensões sociais pelo facto da ilegalidade se manter, pois o território foi sendo sucessivamente colonizado, algumas vezes com actos violentos, e a população original ter, praticamente desaparecido.  
O Estado Espanhol também não se esquece de manter o nível de vida – enfim com a excepção compreensível da última guerra civil – num estádio superior ao lado de cá da fronteira.
Fronteira que não está oficialmente delimitada entre o Rio Caia e o Rio Cucos, faltando os marcos nº 801 a 900.[2]
E, de facto, ao atravessar a fronteira na nova Ponte da Ajuda – um local magnífico do Guadiana – e depois em S. Leonardo, nota-se uma diferença na qualidade das estradas e respectiva sinalética; na limpeza e no aproveitamento dos campos.[3]
Olivença está bem arranjada, nota-se ainda perfeitamente a sua traça portuguesa e o centro, monumentos e fortalezas, são portuguesas, fora de qualquer dúvida. Merece uma visita.
As cerimónias ocuparam praticamente todo o dia, tendo começado um pouco tarde por causa da diferença horária e porque se teve que esperar pela pequena excursão ida de Lisboa.
O “Alcalde “da vila aguentou firme todos os eventos, estando ainda presente na maioria deles, o Presidente da Região da Estremadura, também ele, filho da terra.
O “Mestre – de - Cerimónias” falou bilingue (num português perfeito) e os oradores falaram nas suas línguas de origem.
A Guardia Civil manteve uma presença discreta, apenas com duas viaturas e cinco guardas.
A cerimónia principal decorreu no Convento de S. João de Deus – um Santo Português – que está incluído num dos nove baluartes erguidos após a Restauração de 1640, para melhor defesa desta praça - forte, uma das mais avançadas e expostas de toda a fronteira terrestre.
As intervenções dos oradores – administrador executivo da Fundação Portugal-África; Presidente da Conexão Lusófona; Coordenador do Movimento 2014 – 800 Anos da Língua Portuguesa; Directora do Gabinete de Iniciativas Transfronteiriças da Junta da Extremadura – foram equilibradas, embora todas elas a puxar para a descrição das actividades de que são responsáveis, do que sobre o objectivo das cerimónias em si. E todas voltadas para a cooperação e cultura.
Discursos equilibrados também dos responsáveis políticos presentes, todos na mesma toada.
Uma curiosa e bem apanhada reportagem sobre os resquícios da cultura portuguesa em Malaca (onde só estivemos 130 anos!), também marcaram presença.
Ainda houve tempo para um pequeno teatro sobre o Rei D. Dinis e a Rainha Santa Isabel e a oficialização da geminação dos municípios de Leiria e de Olivença, a cargo dos respectivos edis, apenas com um pequeno deslize numa frase do Leiriense.
O ponto alto (opinião nossa) teve lugar com a actuação do Coro “Alma de Coimbra, que encantou a audiência com cerca de 70’de um óptimo espectáculo, que nos deixa orgulhosos em qualquer parte do mundo e nos dá esperança de que nem tudo está perdido…
Só faltou que a última performance fosse o Hino Nacional Português e um “viva Portugal”, que seria a chave de ouro e o dia merecia!
Pelo meio houve almoço de tapas à espanhola para convidados e cada um à sua, para os restantes.
O final foi o mais importante e já ocorreu na pérola monumental representada pela Igreja da Madalena – uma joia do mais puro manuelino que, significativamente ganhou um concurso, há poucos anos, que elegeu o “melhor recanto de Espanha” – antecedido de uma visita guiada à mesma.
Ouviu-se a Santa Missa em português, facto que já não ocorria desde que tal prática tinha sido proibida pelas autoridades espanholas desde os anos 40 do século XIX!
Oficiou-a o Padre Ricardo Cardoso, acompanhado pelo seu congénere e “dono da casa”, o qual teve especial habilidade e desenvoltura para o papel que lhe coube fazer. Bem - haja.
A única coisa a lamentar – embora não surpreenda – foi o escasso envolvimento da população local, nas cerimónias.
Na sessão solene estavam umas 150 pessoas; na missa só umas 50, sendo que a maioria tinha ido de Portugal.
Por isso para o ano temos de levar a Olivença, no dia 10 de Junho, não menos de 10.000 pessoas com bandas e fanfarras. Isto mudaria tudo…
Lá esperaremos o Senhor Presidente da República (embora não acredite que, nessa altura, lá esteja alguém da Família Real Espanhola) o qual, estamos certos, abdicará de ir visitar a comunidade emigrante lusa na Nova Zelândia, em prol de tão benemérito como patriótico acto.
E nem precisa de autorização da Assembleia da República para se ausentar do território nacional, para o fazer…[4]
Então até para o ano.
                                          João José Brandão Ferreira
                                               Oficial Piloto Aviador


[1] Se a moda pega ao contrário, vamos ter por cá chusmas de dignatários de outros países, por cada comunidade de emigrantes que por cá labutam ou repousam!...
[2] A fronteira Luso-Espanhola tem 1292 Km de extensão, e é delimitada por 5228 marcos, separados de 250 metros.
[3] Onde convinha manter os caminhos limpos; preservar a capela da Nossa Senhora da Ajuda e, no mínimo, colocar uns painéis explicativos sobre a ponte centenária ora em ruinas!
[4] Artigo 129º da CR. Embora nunca até hoje tenha vindo a público qualquer prova de que tal é feito… (nº3 “A inobservância do disposto no número 1 envolve, de pleno direito, a perda do cargo”)

terça-feira, 20 de junho de 2017

27 de Junho, às 18h00: Conferência "Transportes Aéreos da Índia Portuguesa (uma história de sucesso)", pelo Major Eng.º de Aeródromos Luís Barbosa






Far-se-a ainda uma homenagem às tripulações dos TAIP", estando-se a envidar esforços para convidar aqueles que ainda estejam vivos e se possam deslocar à SHIP

ERA UMA VEZ …



ERA UMA VEZ …
14/6/17

“ A repressão deve ser imediata e enérgica; tanto quanto baste mas que não sobre.
De tal maneira que aqueles que prevaricaram não tenham vontade de repetir e os que presenciaram não tenham desejos de imitar.”
                                                                              General Farinha Beirão (Pinhel, 1906 –
                                                                        Pinhel, 1971);
      Comandante - Geral da GNR (27/5/27 - 22/7/39)

A Alice no país das maravilhas.
Um país perfeitamente subvertido nos seus fundamentos…
A Alice tinha óbvia e seguramente, as melhores intenções…
Mas ignorante e mal aconselhada só cometia asneiras.
A sua determinação que uma voz rouca e esganiçada – onde se pode apreciar, note-se, uma desmaiada volúpia – só piorava as coisas.
Entre as muitas organizações que tutelava havia uma, já bicentenária, com reminiscências ainda mais antigas, cujos servidores – termo entretanto caído em desuso – trajavam de verde, num figurino antigo que a tradição tem preservado na sua essência.
Chegaram a ser conhecidos por “capicuas” e “feijões - verdes”, mas não vamos agora perder tempo a explicar estas coisas.
O seu passado nem sempre foi brilhante e algumas sombras o molestam mas, em termos globais, o activo ainda vai ultrapassando o passivo.
Havia, porém, um pecado mortal para o contemporâneo politicamente correcto que era terem uma costela de militar. Diria até mais, uma coluna vertebral militar. É pois, uma organização sui generis.
Tal facto era uma aberração para a Alice e seus “compagnons de route” e ainda para outros mais sabidos e perigosos, que actuando sub-repticiamente lhes tentam há muito minar os fundamentos.
Uma evidência, naturalmente ignorada no país das maravilhas (agora também dos afectos) e denunciada como fruto de imaginações torpes e obscurantistas.
Esta instituição – se é que o termo ainda tem algum significado na maravilha em que o país se tornou – em tempos apodada de “repressiva”, está há muito em fase de transição (estas coisas levam tempo, se as quiserem bem feitas) no sentido de substituir a totalidade dos quadros oriundos do Exército – esse corpo estranho, cheio de normas “esquisitas” que o povo mal conhece, pois apenas existe desde o tempo do Afonso Henriques – por outros oficiais habilitados especificamente para enquadrarem esta “tropa” virada para a segurança interna mas com a faculdade de poder cumprir missões mais “musculadas” – um termo muito politicamente correcto – e até, militares (um conceito completamente “out”!).[1]
Ora a palavra militar deveria, para muitos adiantados mentais, ter desaparecido com o actual aborto ortográfico!
Com este pano de fundo vamos agora dar início ao nosso romance parafraseado do título.
E cuidamos poder gozar da liberdade poética, que um romance sempre encerra.
Há alguns meses foi necessário promover – dentro da ditadura do “conta-gotas” que enforma o actual sistema – dois oficiais generais, à categoria de terceira estrela, um dos quais estava “emprestado” à tal instituição, na qualidade de “feijão-verde”. E onde já há tempos exercia uma função daquela categoria.
Estes dois oficiais, o oficial “A” e o oficial “B” seriam promovidos em simultâneo, cada um em “su sitio”.
A coisa era consensual e não havia qualquer dúvida que ambos os ditos cujos tinham mérito absoluto para lhes ser outorgada a distinção.
Tal tinha sido decidido no Conselho Superior da “esquisita” organização citada, de quem o “perigoso patriota” conhecido por Nuno Álvares Pereira foi o 2º Condestável.
Eis senão quando, a Alice foi ter com o actual descendente do Liberato Pinto – Comandante da GNR no pior período da I República e, note-se, o único primeiro-ministro que foi preso antes do Eng.º Sócrates (óh Sócrates nem essa primazia conseguiste!) – e, aparentemente deixou-lhe cair um sussurro de que não gostava do oficial “A”.
Sabe-se lá porquê, talvez porque o homem não se ria para ela… (também consta que não se ria para outros).
Ora numa reunião posterior do tal superior conselho, o sussurro da Alice ganhou foros de cidade, o que fez aparecer uma nova lista agora com quatro nomes, (o que prova que o dito conselho leva a capacidade de alguém se rir, muito a sério) onde o oficial “A” passou para quarto lugar e o oficial “B” (que goza também de apoios vários) passou para primeiro.
Não vamos agora analisar os oficiais C e D, que ficaram no meio.
Diremos apenas que um deles é sério candidato ao lugar cimeiro da antiga força de repressão dada a importância que uma peça de vestuário, que toma o nome de “avental”, passou a ter no país das maravilhas.
Ora quando o nubente “A” – não se esqueçam que estamos a escrever um romance – foi informado que já não casavam com ele, bateu imediatamente com a porta e foi para casa.
Ora tal gesto, apesar de tempestivo, não era aguardado e teve uma implicação terrível: o oficial”B”, que tinha passado a “A”, estava numa situação de “sustado” (que não vamos explicar), a aguardar vaga o que implicava que tinha que ser promovido em simultâneo (no mesmo dia) com o seu par.
Como tal não sucedeu o oficial “B” ia para casa também. Logo dois noivos que ficavam por casar!
Para tal não acontecer, ali para os lado do Restelo - num edifício de onde já se governou um império, onde as Alices tinham o lugar que mereciam e as maravilhas eram feitos de pasmar o mundo – existe uma organização que anda debalde, há décadas, a tentar pôr ordem em outras três. O que os diferencia? Apenas a cor das estrelas, no primeiro caso são douradas; no segundo, prateadas. Questões de gosto e brilho.
Ora nesse edifício, onde concorre um outro ministério - que, em bom julgamento, não tem servido em rigor para nada - as águas agitaram-se com todo este “frou - frou” de vestidos a roçarem-se, e delineou-se uma extraordinária estratégia a fim salvar a situação: um oficial de três estrelas recebeu atribuladamente ordem para regressar ao ninho original, a fim de abrir vaga que pudesse servir ao tal oficial “B”, que passou a “A”, de modo a impedir que regressasse a penates.
Só que a movimentação do estrelado “X”, despedido de afogadilho tinha que, “oficialmente”, ser anterior à data em que ocorreu. Ora para tal seria necessário reescrever uma ordem de serviço com data a convir, ocorrência, obviamente surrealista que só uma mente enviesada e, já agora, pouco patriótica, poderia pensar que pudesse ocorrer.
Sem embargo um elemento de um partido que faz parte da Comissão Paralamentar de Defesa resolveu, aparentemente, questionar o ocorrido e já consta que a PGR investiga o caso, avessa que é, aos ensinamentos do bom do Padre Américo.
Acresce que o tal oficial “B”, que passou a “A”, foi efectivamente para o lugar do oficial X, mas não foi ainda promovido.
O actual comandante da tal “coisa” que venceu os espanhóis em Montes Claros, não quer (para já) promover ninguém. Finalmente uma decisão sensata. Aguarda-se que o oficial “B”, que passou a “A”, caia (parece até que já caiu) por limite de tempo no posto.[2]
O que vai fazer que vão ser os oficiais “C” e “D” a serem promovidos.
E assim, um deles (o tal) possa ir comandar a “Real Ordem dos Guitas”.[3]
A interligação de promessas, ofertas e esquemas, ocorridos fica à imaginação de cada um.
O titular do ministério que não existe, pois nunca, insiste-se, fez nada que tenha a ver com o nome que ostenta, afirma em bonançosa esperança, depois de inquirido, que se encontra satisfeito.
Ora digam lá se isto não é um romance perfeito, num país de Alices e de Maravilhas?!



                                                               João José Brandão Ferreira
                                                                  Oficial Piloto Aviador





[1] Podendo, outrossim, actuar no exterior, sendo curioso notar que, ao contrário, o Exército não pode (por lei) actuar internamente…
[2] E como não sabem como hão - de descalçar a bota até foram pedir um parecer à PGR. Isto só não bateu no fundo, porque não há fundo…
[3] Nome pelo qual eram conhecidos em tempos mais recuados, os elementos da Guarda Municipal.

domingo, 11 de junho de 2017

A “ESCOLA” GEOPOLÍTICA PORTUGUESA E A U.E.



A “ESCOLA” GEOPOLÍTICA PORTUGUESA E A U.E.

13/06/10

            Em Portugal temos muita dificuldade em racionalizar conceitos, por isso raro os enunciamos.
            Nós não discutimos a vida, limitamo-nos a vivê-la. Não nos preocupamos com fins nem com princípios. Resolvemos a coisa entre uns pires de caracóis e uma imperial fresquinha. Pelo meio exalamos frases de profundo sentido como “a vida são dois dias”; “ele é que a sabe toda”; “essa é que é essa”, etc. E há sempre um que atira, “olha-me aquela gaja”. Bom, até este último arrobo de marialvismo, parece ter os dias contados…
            Será que fomos sempre assim? Que eventos históricos nos moldaram?
            No princípio do século XV, estando as fronteiras estabilizadas, a crise político/dinástica resolvida, o estado forte e a nação “formatada” e unida, pôs-se a questão da consolidação/expansão do país. Uma era corolário da outra e vice-versa.
            Confrontados com a realidade geopolítica - que configura até hoje e sempre, uma ditadura geográfica – a elite política portuguesa decidiu atacar Ceuta. Um lote apreciável de razões ditou a ida. A alternativa seria progredir pela Andaluzia em direcção a Granada, mas tal foi considerado perigoso, pois aquele território era considerado zona de expansão natural de Castela e nós dificilmente nos aguentaríamos com tal poder, que sempre foi superior ao nosso. Para equilibrar as coisas foi-se mantendo a Aliança Inglesa (estabelecida em 1373) … até hoje.
            Com o pé em Ceuta foi-se, naturalmente, costa abaixo e mar adentro.
            Com a Europa do Centro, Sul e Norte, nomeadamente as suas zonas costeiras, mantivemos um progressivo comércio desde o século XII e também uma estreita ligação à Borgonha – donde nos tinha vindo o Conde Henrique, os monges de Cister e o apoio de S. Bernardo de Claraval, para a Reconquista, a implementação da Ordem do Templo e para a própria independência.
           Estas relações com a Borgonha tiveram notável incremento quando a Infanta Isabel, filha de D. João I casou com o Duque da Borgonha, em 1430. Também, no século XV, se tentou estreitar os laços com o Imperador da Alemanha, não só por razões de comércio (e troca de saberes) mas, outrossim, para obter apoios político/diplomáticos que nos defendessem da França e dos poderes peninsulares.
            Ora estas duas vertentes, ir para o Centro da Europa ou para o Sul, Atlântico e Norte de África, vieram a focalizar-se em dois príncipes da Casa Real Portuguesa: D. Pedro, o das sete partidas e D. Henrique, o navegador.
            Em termos modernos pode dizer-se que estes dois homens deram origem a dois conceitos ou duas escolas de geopolítica portuguesa que, em termos sucintos, se podem enunciar da seguinte maneira: D. Pedro privilegiava as relações com a Europa culta e mais rica (ele tinha visitado os principais reinos europeus durante três anos…), embora não se opusesse à exploração do Atlântico, sobretudo o central. Opunha-se, no entanto a um grande esforço no Norte de África, onde não vislumbrava uma mais - valia em termos de custo/eficácia.
            D. Henrique, não se opunha às relações com a Europa, sobretudo em termos de comércio, embora defendesse a neutralidade nas disputas europeias, mas estava muito empenhado na luta do Norte de África, que encarava como a continuação da Cruzada e nas navegações costa africana abaixo e na colonização dos arquipélagos atlânticos. A isto não seria estranho, por certo, o facto de ser administrador da Ordem de Cristo e dever ter em conta os seus objectivos político-religiosos. Foi assim que o plano para se chegar ao Reino de Prestes João e à Índia começou a tomar forma.
            As coisas foram-se naturalmente ajustando e a conquista de Marrocos veio a revelar-se impossível, tendo ficado isso claro no reinado de D. João III, embora a última praça, Mazagão, só tivesse sido evacuada (e com oposição!), em 1769. Neste âmbito teve D. Pedro razão.
           Uma ligação mais forte à Europa veio a revelar-se, também, infrutífera, sobretudo depois de a França ter “engolido” o ducado da Borgonha e a “concorrência” tivesse feito gorar a nossa presença em termos de feitorias comerciais. A Reforma virou as potências protestantes e calvinistas, contra nós, o que foi agravado pela perseguição aos judeus e, finalmente, a coroa dual Filipina tornou-nos inimigos dos inimigos de Espanha. E aqui se goraram as ideias do Infante D. Pedro...
           O mar tornou-se assim a nossa janela de liberdade e oportunidade e os nossos “impérios” asiático, primeiro; brasileiro, depois e africano, por último, fizeram o resto. Quer isto dizer que os assuntos europeus nos foram alheios? De modo nenhum. Dali nunca mais veio boa vizinhança nem qualquer apoio que não quisesse trocar um chouriço por um porco. E sempre que o nosso país se encontrou no caminho dos interesses das grandes potências europeias, viemos a sofrer com isso. A Guerra da Sucessão de Espanha, a Guerra dos Sete Anos e as Guerras Napoleónicas, são de tal corolário, exemplo eloquente. Ou seja, sempre que nos envolvemos nas querelas europeias, saímos a perder.
            Esta dualidade das “escolas geopolíticas” mantiveram-se com “nuances” e diferenças de enfoque, até hoje.
            Os leitores farão o favor de pensar quantos portugueses têm, hoje em dia, alguma noção disto, e entre estes quantos políticos no activo, entende as subtilezas de Pedro e de Henrique.
                                                           *****
             Em 2010 comemorou-se em Lisboa e Madrid, com alguma pompa e circunstância, os 25 anos da adesão de ambos os países à então Comunidade Económica Europeia (CEE). De então para cá os encómios não pararam, apesar de algumas vozes piedosas lamentarem que nem tudo vá bem.
            Não vejo grandes razões para festas e, ao contrário do que parece ser uma quase globalidade de encómios, eu encontro um lote não despiciendo de erros, maus caminhos e futuro cinzento, para não dizer outra coisa. Muito sucintamente:
            Portugal entrou (e quis entrar) para a CEE de qualquer maneira, sem estar preparado e numa posição fraca; depois quis fazê-lo juntamente com a Espanha o que considero um erro político/estratégico; fê-lo, ainda por cima, mandando-se de cabeça, sem salvaguardar interesses, ou prudência no baixar das defesas; pior ainda, mergulhou na CEE como se isso se tratasse de um objectivo permanente histórico – que não deve ser – em vez de considerar ser um objectivo actual importante e, por isso, transitório, que é o aconselhável. Isto é importante? Direi que é fundamental e tal implica um tipo de postura muito diferente um do outro.
            A seguir embandeirou-se em arco e foi um fartar vilanagem: com os fundos estruturais, de apoio, etc., a correrem com uma facilidade nunca vista, perdeu-se a cabeça e desatou tudo a gastar a esmo ao passo que se permitiam todos os desatinos. E mais importante foi-se sempre adiando as reformas estruturais; a definição de objectivos estratégicos e o estabelecimento de áreas prioritárias de investimento. Ao passo que, alegremente, se ia destruindo a agricultura, a pesca, a indústria e se colocavam as pequenas e médias empresas com a corda na garganta.
            A especulação ganhou asas. E apostou-se no cimento, esquecendo-se que parte deste transformado em estradas ia servir os exportadores estrangeiros (nomeadamente espanhóis e franceses, que são os mais próximos) a colocarem os seus produtos cá mais rápido, logo, mais barato, ajudando assim a acabar com o que ia sobrevivendo. A “integração” com o mercado espanhol, do modo como é feito, é um crime de lesa pátria pois vai provocar umas novas Cortes de Tomar de 1581, sem ser preciso o recurso às armas… Ninguém apresentou, entretanto, contas do que foi realizado.
            Em súmula, encontramo-nos hoje, depois de 25 anos (mais propriamente 43) a viver acima das nossas possibilidades, com dinheiro “emprestado”, completamente endividados e com o aparelho produtivo em frangalhos; o estado (por via dos partidos) pesadíssimo e … sem mais valias para o futuro! Acresce que agora a crise atinge todos os países da UE, por causa de práticas especulativas indecentes, típicas do mais puro capitalismo selvagem e que ninguém diz ter-se apercebido. É caso para dizer: belas competências!
           Ou será que tudo isto foi acelerado e feito de propósito, para se fugir para a frente e tentar impôr medidas mais escravizadoras da população e diluidoras das nações europeias a que os mais esclarecidos comentadores e políticos apelidam de “aprofundamento da Europa” ou “mais Europa”?
            Não deve ser por acaso, que os poderes instituídos, fogem como o diabo da cruz – eles até querem acabar com a cruz… - em explicar e consultar os seus povos, sobre as principais medidas que têm sido implementadas.
            Que se comemora então nos anos de adesão à CEE? A democracia? Mas ela não foi instituída em 1974, perdão, 75? Precisamos de supervisão? Para vivermos em segurança? Mas quem tem garantido a segurança na Europa nos últimos 70 anos tem sido a NATO e o chapéu-de-chuva nuclear dos EUA, não a UE! Aliás, esta, aparentemente, nem se quer defender e, no momento, está incapaz de o fazer. Será por vivermos em paz? é certo que na Europa há paz desde 1945, embora com uma “cortina de ferro” a dividi-la durante 50 anos, até se “inventar” a guerra na ex-Jugoslávia. Mas a paz é ilusória, não só porque andam dezenas de milhares de tropas espalhadas pelo mundo a tentar “apagar fogos”, como a situação no continente é contingente a muitos factores. É por se ter aberto as fronteiras e deixado invadir os países da UE, por hordas de emigrantes (agora migrantes) inventando-se um multiculturalismo de fachada, pois não é sentido nem realizável? E o que se ganhou com isso? Não está à vista, que estamos no limiar de uma vasta explosão social contra este estado de coisas?
            Nem tudo está mal, é certo. O nível de vida material aumentou, embora o espiritual tenha diminuído; a cultura melhorou (o analfabetismo encartado, também); as facilidades de circulação, o aumento do turismo, a assistência social, tiveram notáveis melhorias, etc.
            Mas no seu todo, a Europa está velha, com uma demografia negativa, sem liderança, sem os seus esteios tradicionais e minada pelo relativismo moral.
            Sinceramente não percebo muito bem o que se quer exaltar e comemorar.
            Mas sei uma coisa: aquilo que querem dizer com “mais Europa” é o fim de Portugal. Não era isso, seguramente, o que o Infante D. Pedro divisava e que todos os portugueses conscientes devem tentar impedir.


                                                                                   João José Brandão Ferreira
                                                                                      Oficial Piloto Aviador