AS CONDECORAÇÕES E
O PR
10/1/20
“Foge cão que
te fazem barão.
Para onde se
me fazem visconde?”
Almeida Garrett
Fez
há pouco nove meses, que o Presidente da República (PR) se deslocou a um
hospital onde jazia no seu leito de morte, um português com “P” grande a fim de
o condecorar, o que fez, atribuindo-lhe o Grau de Comendador da Ordem do
Infante D. Henrique.
O
seu nome era Victor Manuel Tavares Ribeiro e estávamos a 23 de Março de 2019.
Victor
Ribeiro faleceu poucas horas depois, não sem antes ter sido contemplado com a
condecoração maior: ter recebido a graça do Baptismo.
Há
poucas semanas (a 19 de Dezembro) Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) deu um salto a
outro hospital para condecorar o Almirante Nuno Vieira Matias, desta vez com a Grã-Cruz
da mesma ordem.
O
Almirante Matias esteve para ser condecorado durante uma visita programada à Sociedade
Histórica para a Independência de Portugal, sita no Palácio Almada (vulgo da
Independência) no pretérito dia 27 de Novembro, visita entretanto adiada.
O que coincidiu com uma queda do
supracitado que o obrigou à baixa hospitalar.
Já
a 30 de Dezembro o PR entendeu condecorar o treinador de futebol Jorge Jesus
com o grau de Comendador da mesma Ordem, tendo a mesma sido ventilada pública e
previamente tendo MRS, na sua incontinência verbal, dito qualquer coisa como “o
meu instinto é condecorá-lo já, mas vou consultar o Conselho das Ordens”.
Imagina-se
que o Conselho das Ordens há-de ter apreciado muito esta “subtil” maneira de o
pressionar…
A
Ordem do Infante D. Henrique foi, recorda-se, criada nos tenebrosos tempos do
“Estado Novo” (imagine-se), em 1960, para comemorar o 5º centenário da morte do
Infante D. Henrique, destinando-se a (redacção de 1962) “distinguir os que
houvessem prestado serviços relevantes a Portugal no país e no estrangeiro e
serviços na expansão da cultura portuguesa ou para o conhecimento de Portugal,
sua história e seus valores”.
A
Ordem do Infante D. Henrique tem vários graus, a saber:
O
Grande Colar (apenas destinado a Chefes de Estado); a Grã-Cruz; o Grande
Oficial; Comendador; Oficial e Cavaleiro/Dama.
São
já imensas as veneras atribuídas pelo actual PR (embora ainda não tenha batido “records”
anteriores), o que só tem concorrência no número de “selfies” tiradas e nas
deslocações efectuadas.
Bom,
é sempre melhor distribuir condecorações e títulos, do que censuras e castigos,
mas o que está em causa é porventura a precipitação (veja-se o caso da
atribuição do nome do Ronaldo ao Aeroporto do Funchal) e sobretudo a Justiça
com que se fazem as coisas. E a Justiça tem dois andamentos: a absoluta e a
relativa.
Existe
ainda outro ponto assaz importante a ter em conta: a vulgarização. Ora a
vulgarização leva ao descrédito, o que na sua vertente extrema levará a que uma
condecoração seja tida como um “castigo” e à descredibilização de quem a
atribui, o que levará naturalmente a que qualquer agraciado, com vergonha na
cara, possa recusar a “distinção”.
Os
casos de várias (são já muitas) personalidades condecoradas, nomeadamente em
cerimónias do 10 de Junho (Dia de Portugal e portanto a data mais importante
para se condecorar alguém, o que já de si deveria constituir uma distinção
adicional), que mostraram e, ou veio a saber-se, não serem dignas de as terem
recebido, com a dúvida pública instalada, se as mesmas deveriam ser retiradas
aos agraciados, não tem ajudado nada.
Mesmo
nada.
Ora
se atentarmos nos exemplos apontados – e não queremos com isto estar a comparar
as pessoas como tal – verificamos que Victor Ribeiro que foi um ex-combatente
do Ultramar, que nunca virou as costas ao perigo; muito competente profissional
da Aviação Civil (Comandante de Linha Aérea) e a quem o país deve uma parte da
vitória do 25 de Novembro, pois estando já fora do serviço activo militar, foi
convocado para os “Comandos” e comandou uma das companhias que ajudou a salvar
Portugal de uma guerra civil e de uma ditadura odiosa de esquerda, está ao mesmo
nível de um treinador de futebol que ao fim de 50 anos aprendeu que o Brasil
foi descoberto por Pedro Álvares Cabral (esquecendo-se de acrescentar
“oficialmente”).
Não
tenho nada contra os treinadores de futebol, mas tenho mais-valias a
acrescentar a muitas outras coisas. Nomeadamente ao que Victor Ribeiro e Vieira
Matias fizeram. Neste último a disparidade é um pouco menor dado que foi
contemplado com dois graus acima (Grã-Cruz). Mas mesmo assim a diferença
afigura-se muita.
Vieira
Matias foi um muito bom e considerado marinheiro e oficial da Armada, com duas
comissões em Angola e na Guiné, que acabou a sua carreira militar como Chefe de
Estado-Maior da Armada, que entre muitas outras coisas (positivas) que fez,
teve a presciência de colocar de alerta e pronta a zarpar, uma força naval para
actuar na Guiné-Bissau, numa altura crítica em que nacionais e interesses
portugueses estiveram em risco, e o Governo Português estava a dormir na forma.
Tem
lutado sempre pela importância do Mar na vida nacional portuguesa e é sem
dúvida um patriota, um homem de saber, de carácter e um académico distinto.
Comparar
estes exemplos profissionais de vida com outros que dirigem uns quantos atletas
que têm jeito para dar chutos numa bola, por mais que isso divirta a mole humana
e nos massacre nas pantalhas da televisão, parece-me um pouco como confundir a
“estrada da Beira com a beira da estrada”…
E cabe às entidades de maior
hierarquia do Estado, dada a sua responsabilidade, dar o exemplo e promover os
bons exemplos.
Mas
o que mais choca nestes eventos é que, enquanto a Jorge Jesus – de quem
estimamos a simplicidade e autenticidade – foi dada ampla promoção mediática
(abertura de telejornais!) com a distinção da mesma ter sido efectuada no
Palácio de Belém, perante muitos convidados e as duas outras condecorações
terem sido atribuídas quase em segredo, perante meia dúzia de pessoas mais
chegadas, tendo sido ignoradas pela comunicação social. Apesar também da
distinção que a deslocação do PR comporta.
Será
que os serviços da presidência se esqueceram de avisar os homens da pena, do
microfone e da câmara?
Porque
é que não há uma coisa que bata certo nesta malfadada III República?
As palavras de Garrett fazem-nos
pensar que a natureza humana não muda mesmo e aquilo que se vai aprendendo não
é lá grande coisa.
João
José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador (Ref.)
1 comentário:
Caro Brandão Ferreira, meu estimado Amigo,
No caso, SExa 'O Populista-Mor' distribui medalhas p'ró povoléu ver; àquele mediatismo de pacotilha não correspondem os devidos actos de registo oficial.
Prova disso mesmo, os respectivos "serviços de apoio" até ao momento não procederam - nos casos de Victor Manuel Tavares Ribeiro e de Nuno Gonçalo Vieira Matias -, à actualização da "Página Oficial do Grão-Mestre das Ordens Honoríficas Portuguesas".
Continuamos a malhar em ferro frio...
Um abraço.
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