INSTITUIÇÃO MILITAR: A ORGANIZAÇÃO SOCIAL E PROFISSIONAL MAIS PERFEITA
06/08/16
“Todos sabem os apuros financeiros do país
e sabem por igual que, para segurar o Poder
por mais dois ou três anos, V. Exª e o gabinete
a que preside não hesitarão em sacrificar o futuro”.
Mouzinho de Albuquerque.
(Carta ao Presidente do Conselho de Ministros, 23/7/1898).
Isto é, era, pois andam a destrui-la aceleradamente…
Face a esta afirmação estrambólica para o “politicamente correcto” cumpre justifica-la.
Aviso prévio, não falaremos em Forças Armadas (FA), mas sim em Instituição Militar (IM).
A
diferença é de substância, já que a IM é o “invólucro” onde existem as
FA; representa a perenidade de uma instituição nacional, por excelência e
não apenas uma força táctico/estratégica de circunstância;
representando, outrossim, o repositório material, espiritual e
institucional dos diferentes corpos armados da Nação, desde a sua
fundação, incorporando ainda toda a “família militar”.
Uma noção que a própria maioria dos militares deixou de entender e assumir.
Porque
é que então as FA e a IM representam a melhor e mais avançada
organização social e profissional, existente no País? Simples:
* Pela sua antiguidade;
* Por não ser democrática;
* Por ter traços de democraticidade orgânica e avançada;
* Pelas características da condição militar.
Vamos “investigar” um pouco cada um destes “item”.
A
antiguidade (que na tropa é, desde logo, um posto) perde-se nos tempos
dos impérios antigos. Fixemos, porém, o Império Romano, que elevou a
organização militar a apuros nunca antes vistos, sendo necessários 1000
anos, depois do seu desaparecimento, para que se criasse – por alturas
de Gustavo Adolfo, na Suécia – algo que se lhe pudesse assemelhar.
Ou
seja a IM é uma organização muito antiga (não velha, pois está sempre a
renovar-se), com princípios, regras, estrutura, comando, táctica,
logística, etc. muitíssimo ponderados e testados, a que a evolução
tecnológica obriga a um repensar constante.
Já passou por tudo…
A própria Igreja, certamente, se inspirou no seu modelo…
O
facto da estrutura, organização, escolha das chefias e modelo da tomada
de decisão, não ser democrático, isto é, não ser baseado em eleições ou
votos, é da máxima relevância.
De facto a demagogia das
campanhas eleitorais, em que se elegem pessoas mais ou menos adequadas
(por norma, menos) para uma função, votadas por uma maioria de pessoas,
mal preparadas e ignorantes sobre o fulcro das questões em jogo, não
cabe no âmbito das FA e da IM!
As decisões são tomadas por uma
cadeia hierárquica rígida, servida por oficiais e sargentos devidamente
preparados, e promovidos segundo regras de todos conhecidas.
Como se consegue tudo isto?
Pois
tendo-se criado uma estrutura em que é a própria IM (cada Ramo das FA)
que recruta, seleciona, instrói, treina e comanda em operações, todos os
seus servidores, possuindo os meios logísticos, de gestão de pessoal,
saúde, ensino, disciplina, justiça e apoio social, para o cabal
cumprimento de todas estas tarefas.
A IM acompanha, assim, todos
os seus elementos desde o dia em que são incorporados, até ao dia do seu
funeral, o qual inclui as respectivas honras militares.
Não
existe fórmula de integração, profissionalismo, enquadramento ético,
deontológico e social, mais avançado no mundo, do que este!
Por outro lado a convivência dentro da própria IM, possui traços de democraticidade que não existem em mais lado nenhum.
Os
diferentes estilos de liderança são estudados para serem aplicados
segundo as circunstâncias, numa modalidade dinâmica, mas sempre com
regras em que o princípio fundamental da autoridade recai sempre no mais
graduado/antigo, já que a autoridade é indissociável da
responsabilidade.
Comandar vem do latim “cum + mandare”, que quer
dizer mandar com os outros, sendo este o princípio mais largamente
seguido, sem pôr em causa que em situações que impliquem uma decisão
rápida, o comandante decida sem consulta, isto é, dá simplesmente uma
ordem.
Por outro lado, superiores e subordinados não estão ao
“serviço” uns dos outros, nem de ninguém, estão, isso sim, todos ao
serviço; as leis e os regulamentos aplicam-se de igual modo e
indiscriminadamente a todos os militares, independentemente do seu
posto, graduação ou função e as relações entre todos são biunívocas, ou
seja existe uma reciprocidade de direitos, deveres e comportamentos.
Dou
um exemplo: quando um soldado faz continência a um sargento, fá-lo
porque é seu dever fazê-lo, pois o sargento tem direito a esse acto de
saudação, cumprimento e disciplina. Porém,
o sargento deve retribuir a continência, pois é seu dever fazê-lo, já que o soldado tem direito a essa retribuição.
O princípio da Hierarquia é mantido por quem faz primeiro.
Onde é que há um exemplo comparável na sociedade civil, ou nos organismos do Estado?
Finalmente pelas características da Condição Militar.
Neste
âmbito são desnecessárias e perniciosas quaisquer organizações
sindicais ou patronais; pura e simplesmente não fazem sentido nem falta e
não vou perder tempo a explicar porquê.
Por outro lado um
militar não trabalha, presta serviço, o que é muito diferente do que ter
um contrato de emprego. Não tem horário de trabalho, mas sim, e quando
possível, um horário normal de serviço – actua quando é preciso,
descansa quando pode…
Um militar não vai de férias, ausenta-se temporariamente de licença e nunca fica desligado do serviço.
Um
militar “É”, não se limita a “Estar”. Isto é, assume e intui os
objectivos e missões da IM e faz deles, seus, integrando-se e
assimilando a matriz da IM e os seus usos, tradições e cerimonial.
Não tem nada a ver com ser-se “funcionário público de manga - de - alpaca”, ou simples tarefeiro a troco de cobres.
Na
vida militar os deveres antecipam e preferem, aos direitos e o conjunto
sobrepõem-se ao individuo: um Exército vive, treina e combate em
equipa, não é cada um para seu lado…
Quando se olha para um
militar fardado, imediatamente se identifica o seu lugar, estatuto e
autoridade, dentro da IM; as suas funções estão definidas e tudo se
encontra escrito e detalhado.
Tudo isto gera uma ordem. A ordem liberta mais do que oprime.
O
sistema de Justiça e Disciplina tem de ser claro, objectivo, rápido e
adaptado ao meio e missão: ou seja é incompatível com os procedimentos
em uso na sociedade civil. Quer dizer, deve ter um foro próprio.
Mesmo
as recompensas que devem ser retiradas do valor, estão integradas na
carreira do próprio militar e não são pecuniárias (a não ser as
inerentes à promoção); não existem “prémios de gestão, ou de
produtividade; distribuição de dividendos; comissões de negócios, ou
quejandos.
Nem sequer tem visibilidade pública, já que um militar
é um ser discreto e as suas missões são cumpridas sem alardes, muitas
vezes com a incompreensão dos titulares dos órgãos do Estado, opinião
pública e publicada.
Premeia-se o militar com louvores e
condecorações, por prestação de mérito no serviço. Muitas vezes apenas
com duas palavras e uma palmada nas costas, ou nem isso…
Toda a
acção e pensamento estão orientados para o cumprimento da “Missão”
principal: criar dissuasão e se necessário combater, de modo a defender e
preservar a integridade do território, a unidade do Estado e a
segurança das populações.
Esta missão é ainda servida de baias
éticas e deontológicas – as mais exigentes em todas as profissões – de
modo a tentar garantir que tudo decorra no sentido do BEM.
Tal é
complementado pela inculcação, naqueles que entram na vida castrense,
das chamadas “virtudes militares” cujo conjunto representa um verdadeiro
código de valores das FA.
Poderá parecer que tudo o que atrás se
disse é muito exigente, sobretudo em tempo de paz, como alguns ingénuos
(e outros nada ingénuos), de quando em vez, propalam?
A resposta
é um rotundo não! Os militares existem para operar – no que têm uma
grande probabilidade de morrer ou ficarem estropiados – no cenário mais
difícil e complexo que existe à face da terra: o campo de batalha, onde
têm que ser capazes de gerir o caos no meio da maior violência, dor,
sofrimento e destruição. Dá para entender?
*****
Já
por várias vezes, e ao longo dos séculos, políticos, ideologias, totós e
adiantados mentais, etc., quiseram pôr em causa todos estes princípios
basilares que apontei. Os comunistas chegaram até a inventar uma
hierarquia paralela de comissários políticos…
Sem embargo nenhum outro modelo prosperou, só causando desgraças e retornando tudo à antiga, pouco tempo depois…
Em
1974, Portugal dispunha de uma IM com as características que acima
apontei. Não era perfeita, mas existia dentro dessa matriz.
Era, seguramente, uma das melhores do mundo e demonstrou-o em combate e na sustentação desse combate.
Hoje
está um corpo esquálido, sem viço, perigosamente diminuída no seu
potencial, rarefeita em efectivos e com o Moral – que é o mais
importante - muito afectado (não confundir com a Moral). E com um
enquadramento legislativo e político que tem, sistematicamente, posto em
causa os seus fundamentos.
Tive a Honra e o privilégio de ter
feito parte da antiga IM e tenho passado o calvário da amargura, de ter
cumprido a maior parte do meu serviço activo, reserva e reforma, naquilo
em que a mesma se foi transformando.
Como Mouzinho de
Albuquerque, que passou o resto da vida a suspirar por um momento
idêntico ao que passara na véspera de Natal que antecedeu Chaimite, até
que suicidou por enfado e nojo.
Com que alegria eu me iria alistar novamente nas fileiras que me formaram!
Mas não vai poder ser.
Ao contrário de Joaquim Mouzinho não penso, todavia, em suicidar-me.
Vão ter mesmo que me aturar até ao fim.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador
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