Camões, Lusíadas, Canto I, 2.
O Capitão de Mar-e-Guerra
Guilherme Almôr Alpoim Calvão (AC) deu a alma ao criador, no pretérito dia
30/9/14, após longo e excruciante período de doença, que suportou com invulgar
serenidade e estoicismo.
Sobre AC já disse o principal que
sobre ele pensava na apresentação do seu livro biográfico, há cerca de um ano,
na cidade de Viseu – a “cava de Viriato”.
No seu funeral estiveram
presentes o PR, através do seu Chefe da Casa Militar; os Chefes Militares,
através de oficiais generais de duas estrelas, com excepção da Marinha cujo
Chefe de Estado - Maior – que, por motivos de agenda ponderosos, não pode estar
presente – se fez representar por um Almirante de três estrelas. O General
Ramalho Eanes também esteve presente.
Primaram pela ausência o Governo
e o Parlamento (pelo menos que se desse conta).
A maioria da Comunicação social,
tão loquaz e voluntariosa aquando de algum crime que envolva pederastas ou no
acompanhamento de assuntos menores e barbaridades avulsas foi, desta vez, parca
em notícias dando, invariavelmente, realce à acção de AC enquanto figura
proeminente do MDLP.[1]
AC era um dos poucos portugueses
vivos agraciados com a mais alta condecoração nacional – a Torre e Espada –[2] (não estamos a incluir os
ex-PR, que a têm por diuturnidade), por altos feitos em combate e relevantes
serviços ao país, no que está à altura dos Grão – Capitães portugueses da
estirpe de um Duarte Pacheco Pereira, Francisco de Almeida ou Mouzinho de
Albuquerque, só para citar estes.
Mas, mesmo assim, as gentes
pequeninas que vão pontuando pelo país entenderam por bem, alhear-se de tão
elevada figura ou tentaram mesmo menorizá-la.
AC pertenceu, ainda, à nobre
plêiade de portugueses que entenderam que a Pátria nada lhes devia – pois
apenas tinham cumprido o seu dever – e por isso nunca se colocou em bicos dos
pés requerendo coisa alguma.
Deixou apenas um pedido a um
antigo camarada de armas e de curso, para que as suas cinzas fossem largadas ao
mar, na foz do rio Tejo, entre torres – designação que na gíria naval significa
o espaço compreendido entre a Torre do Bugio e a Torre de S. Julião da Barra –
e na maré vaza.
Era um desejo que honra a sua
alma de grande marinheiro.
Quis a Marinha Portuguesa,
através dos seus legítimos representantes assumir, ela própria, a consumação
deste último desejo. Fez bem.
Foi um gesto da mais elementar justiça e que
só a enobrece.
E que se deve assumir como preito
de homenagem e finalização das honras fúnebres, como se fazem aos marinheiros
no alto-mar.
Tive a honra de estar a bordo e
assistir ao acto. Aqui fica um agradecimento público.
A juntar às incompetentes
notícias, ou falta delas, já reveladas do anterior, veio agora o Bloco de
Esquerda – esse grupelho desqualificado – questionar o, também, desqualificado
Ministro da Defesa, sobre a licitude da homenagem e se ele, ministro, a
autorizou - como se o CEMA fosse algum gaiato de bibe que tivesse que pôr o
dedo no ar cada vez que queira ir à casa de banho…
Acompanhou o BE, o agora também
desqualificado Diário de Notícias (DN), tido como jornal de referência –
cabendo perguntar ser referência de quê? – através da pena de um jornalista
amplamente referenciado.
É infelizmente prática antiga,
permitir-se nos órgãos de comunicação social comentários anónimos e por vezes
soezes, sobre as notícias ou textos de opinião que publicam. O DN não foge à
regra permitindo que os cobardes e os sem carácter, bolsem os seus miasmas sem
terem que assumir a responsabilidade do que dizem.
Isto não revela apenas quão longe
estamos do tão propalado “estado de direito democrático”, como é sintoma de um
grave retrocesso civilizacional!
Mas atentemos nas questões
fulcrais dos ataques, das meias verdades, das meias notícias que acompanharam o
passamento desta notável figura de português, de combatente e de carácter, que
toda a gente tem evitado comentar?
Tirando a sua actividade como
oficial do activo – que é aquela, note-se, pela qual a Instituição Militar o
distingue- toda a gente sabe que AC foi uma pessoa controversa, mesmo no seio
da Armada.
A primeira tem a ver com o facto
de AC ter sido um herói nas últimas campanhas ultramarinas em que combatemos e
as mesmas terem sido, desastrada e erradamente, taxadas com o epiteto negativo
de “coloniais” e terem sido consideradas por muitos como “guerras injustas”.
Ora, para estes adiantados
mentais não faz sentido, haver heróis em guerras injustas…
O que fez (e ainda faz) sentido,
pelos vistos, foi “promover” desertores e traidores…
A segunda tem a ver com razões
políticas e ideológicas – aquelas que tudo inquinam – que ocorreram durante o
“PREC” [3], quando o país estava a
ferro e fogo e quase à beira de uma guerra civil.
Como todos os portugueses AC
sofreu na carne e no espirito a frenética agitação da época e reagiu.
Na altura estava desligado do
serviço activo, a seu pedido, na situação de licença ilimitada.
Na iminência de ser preso na
sequência do 11 de Março de 1975, conseguiu passar a Espanha, após fuga
aparatosa, onde ajudou a formar o MDLP, cujo presidente era, recorda-se, o
General Spínola (também fugido de helicóptero para aquele país e depois ido
para o Brasil) – general entretanto reabilitado e promovido a Marechal do
Exército.
Como operacional do MDLP AC
participou e dirigiu variadíssimas acções, incluindo acções violentas, contra
as forças internacionalistas (comunistas e muitos outros “istas”) que
anarquizaram o país; levaram à paralisação do aparelho produtivo; quase
destruíram as Forças Armadas; impediram qualquer descolonização, etc., numa
palavra provocaram uma tragédia maior do que Alcácer Quibir, Alcântara, o
terramoto de 1755 e as três invasões francesas, juntos!
E não contentes com tudo isto,
ainda pretenderam impôr revolucionariamente, uma ditadura comunista e terceiro-mundista,
na parte europeia que restava de Portugal.
Um assalto ao poder da forma mais
despótica e infame.
Foi contra este estado de coisas
que o Comandante Alpoim Calvão (e muitos outros) corajosamente se ergueu e
combateu e que as forças vitoriosas no 25 de Novembro de 1975, apenas
parcialmente derrotaram, permitindo que os vencidos (e apaniguados de
ideologias erradas, antipatrióticas e vis) se pudessem retirar em boa ordem de
marcha, passando ainda a outorgar-lhes credibilidade democrática!
Um erro (mais um) que inquinou o
país, por décadas, e não tem fim à vista.
Ninguém julgou ninguém…
São os que restam desta estirpe e
os que entretanto arregimentaram, que nunca perdoaram a AC o que ele fez.
A situação arrasta-se pois quase
ninguém confronta estes infelizes com os seus erros e os seus crimes,
transformando o debate ideológico num deserto de ideias.
Os “negócios” foram, entretanto
falando mais alto.
Piorou tudo isto uma onda de
imoralidade financeira por parte de capitalistas sem escrúpulos que, movidos
pela ganância do dinheiro e do poder, têm andado a destroçar a sociedade nos
países ocidentais, o que se agravou muito após o Muro de Berlim ter caído.
Ou seja, deram, com a sua acção,
azo a que comunistas e outros “istas” de várias cores ganhassem novamente
oxigénio e tenham de novo, razões que os sustentam.
AC é alheio, porém, a toda esta
evolução e teve razão na sua luta. E é péssimo ter a memória curta.
Honra a Alpoim Calvão que é herói
nacional – e sê-lo-á para sempre – e um cidadão esclarecido e actuante com uma
coragem física e moral, inquestionáveis.
A Marinha Portuguesa esteve,
simplesmente, bem.
[1] MDLP, Movimento Democrático de Libertação de Portugal, constituído em 5/5/1975 e desactivado em 29/4/1976. De feição anti - comunista, tinha como objectivo a adopção de um sistema democrático pluralista.
[1] MDLP, Movimento Democrático de Libertação de Portugal, constituído em 5/5/1975 e desactivado em 29/4/1976. De feição anti - comunista, tinha como objectivo a adopção de um sistema democrático pluralista.
[2]
Do Valor, Lealdade e Mérito.
[3] PREC, Processo Revolucionário em Curso, período convencionado entre 25/4/75 e 25/11/75; 19 meses.
[3] PREC, Processo Revolucionário em Curso, período convencionado entre 25/4/75 e 25/11/75; 19 meses.
Sem comentários:
Enviar um comentário