Este blogue apresenta os pensamentos, opiniões e contributos de um homem livre que ama a sua Pátria.
segunda-feira, 30 de novembro de 2020
domingo, 29 de novembro de 2020
OS ATAQUES NO NORTE DE MOÇAMBIQUE
OS ATAQUES NO NORTE DE MOÇAMBIQUE
(“UM GRITO DE TERROR”)
29/11/20
“Não são ladrões apenas os que cortam as bolsas.
Os ladrões que mais merecem esse título são aqueles
a quem os reis encomendam os exércitos e as legiões
ou o governo das províncias, ou a administração das
cidades, os quais, pela manha ou pela força, roubam
e despojam os povos.
Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam
cidades
e reinos; os outros furtam correndo risco,
estes furtam sem
temor nem perigo. Os outros, se
furtam, são
enforcados; mas estes furtam e enfor-
cam”.
Padre António Vieira, Sermão do Bom Ladrão.
O meu camarada e
amigo, Coronel Florindo Morais (que tem quatro comissões de serviço na última
campanha ultramarina), escreveu um pequeno texto que circula na “net”, sobre o
que se passa actualmente no Norte de Moçambique, a que chamou um “grito de
terror”. Eu julgo que é mais um “grito d’alma” e de indignação sobre a barbárie
que por lá acontece e relativamente à hipocrisia das Relações Internacionais”,
onde cada um só se move mediante os seus interesses. Às vezes nem isso, como é
manifestamente o caso português que há muito deixou de ter Política Externa,
própria.
Por isso o
Coronel F. Morais apela à intervenção da ONU; dos “actores” da cena
internacional; às autoridades moçambicanas e ao Estado Português, para saírem
da sua letargia e fazerem algo. O que esse “algo” significa é que não está
discriminado, a não ser uma ideia de se convidar os antigos militares das
“tropas comando” (de que ele faz parte), os quais, mesmo com mais de 60 anos
“resolveriam o assunto”. O que eu não duvido, desde que lhes distribuíssem o
armamento e equipamento necessário, mas eles já cumpriram a sua missão e não
merecem morrer por esta…
O meu primeiro
impulso também foi o de apoiar a ideia do meu antigo instructor, mas esfriando
um pouco a cabeça raciocinei um pouco e vieram-me á ideia alguns pensamentos
que vou partilhar.
Os portugueses
chegaram ao território que hoje constitui Moçambique – em tempos, a “pérola do
Índico” – ao tempo em que o Almirante D. Vaco da Gama, de saudosa memória, lá
aportou (creio que ainda ninguém pensou em apeá-lo das estátuas; tirar os seus
ossos dos Jerónimos ou apagar o seu nome das ruas…). E por lá fomos ficando.
Desde então a História deu muitas voltas
(como o Direito Internacional) e muitos foram os potentados que nos quiseram
desalojar de lá, o que raramente teve a ver com os autóctones (e muitos
chegaram depois de nós), a quem desde sempre oferecemos a nossa civilização e
nacionalidade e a protecção da Coroa Portuguesa. Até da República Portuguesa,
pois tal nada tinha a ver com regimes.
Porém, após as
ideias postas em marcha na sequência da Segunda Guerra Mundial, sobre a
autodeterminação dos povos (que na realidade visavam era a substituição das
soberanias; obter apoios para cada lado da “Guerra - Fria” e o acesso a
matérias – primas e pontos de interesse estratégico) e nada tinham a ver com a
realidade portuguesa, foi criada, entre outras, uma organização política que se
desenvolveu principalmente fora de portas, que tomou o nome de Frente de Libertação
de Moçambique (Frelimo). A qual com a ajuda externa sobretudo de países
comunistas, mas também alguns ocidentais, sem a qual não sobreviveria, moveu a
Portugal, em que Moçambique constituía na altura, uma “Província”, uma guerra
subversiva e de guerrilha, visando expulsar a presença política dos
portugueses, tomar o Poder e tornar o território independente de Portugal.
Esse ataque teve
uma resposta à altura, por parte das autoridades portuguesas e da população em
geral. Tal resposta foi de Direito e natural, pois estava impregnada no “ADN”
nacional.
Um “Golpe de
Estado” mal gizado e preparado, que acabou por visar a substituição do
Governo/Regime, em Lisboa, ditou o fim da resistência e a entrega – à revelia
de qualquer senso político e social e, até, do Direito Internacional, do Poder
em Moçambique para a Frelimo, que se encontrava em agonia e derrotada à data do
golpe.
Não há adjectivos
para qualificar a infâmia catastrófica então vivida.
No fim o Poder
foi entregue atrabiliariamente à Frelimo e a Bandeira Portuguesa foi arriada na
maior ignomínia.
Seguiram-se
décadas de guerra civil, que destruiu o território e causou incomensuráveis
sofrimentos de toda a espécie nos habitantes do território e nos que foram
obrigados a fugir. E, apesar de hoje em dia, haver um acordo de paz, a questão
política e social está longe de estar resolvida; nada funciona e Moçambique –
um território a todos os títulos, riquíssimo, em explosão económica e social em
meados de 1974 – é hoje um dos países mais miseráveis do planeta!
Não é pois de
estranhar, que um país (?) deste quilate, sem comunicações terrestres
norte/sul, e sem meios aéreos e navais para utilizar como alternativa; com o
território atravessado transversalmente por dois grandes rios, que praticamente
o divide em três partes distintas, tenha uma revolta armada no seu extremo
norte (a cerca de 2000 quilómetros da capital, onde tudo se passa – a ex-
formosa Lourenço Marques), a província de Cabo Delgado que é quase do tamanho
de Portugal Continental (82.625Km2) e cerca de 2.4 milhões de almas.
Tal revolta, que conta com gente estranha ao
território foi fomentada, aparentemente, pelo DAESH – organização de fanáticos
muçulmanos que, oficialmente, nunca ninguém explicou como nasceu e se
desenvolveu. O que já causou cerca de 2.000 mortos e quase meio milhão de
desalojados entre a população.
No Norte de
Moçambique houve desde sempre, alguma influência muçulmana e árabe, que foi
descendo junto à costa, comerciando. Na altura em que o domínio político
pertencia aos portugueses, tal influência (que nunca tinha progredido para o
interior) estava controlada e em boa paz.
Mas agora as
autoridades moçambicanas apesar dos 45 anos de independência (ah, ah, ah) não
têm praticamente qualquer controlo na região, ao passo que algumas riquezas
ligadas á energia (gaz natural e petróleo), entretanto descobertos, foram
maioritariamente parar às mãos de empresas francesas e americanas. O garimpo de
minerais preciosos também tem atraído toda a espécie de aventureiros.
O caldo de
cultura estava criado.
As relações do
novo estado independente (ah, ah, ah) e Portugal foram estabilizadas, mas nunca
passaram, na prática de palavras de circunstância e de ajudas a fundo perdido
(do Governo de Lisboa). A própria cooperação técnica civil e militar – um
esforço que já nos custou milhões de euros – esfumam-se na incompetência e
corrupção das autoridades moçambicanas, sem que o Governo Português consiga (ou
queira) colocar alguma ordem no beco. Apesar de tudo isto não é raro sermos
visados em termos de colonialismo primário…
Entretanto as
empresas portuguesas que por lá moirejam vivem na maior dificuldade em serem
ressarcidas do seu trabalho, ao passo que a comunidade portuguesa é vítima
contumaz de raptos com o fim de extorquir resgates.
Moçambique aderiu
à Commonwealth, em 1995, por via da proximidade com a RAS e o Zimbabué, de onde
só copiaram maus exemplos.
Também aderiram à
CPLP, onde até hoje estão por inércia, até porque a dita organização (ainda)
não passou de um nado – morto. Ninguém lhe insuflou vida, muito menos alma…
Portanto nada do
que se passa agora no Norte de Moçambique, na terra dos Macondes (aquilo ainda
é meio tribal e a única coisa que os une é a herança cultural portuguesa) – que
têm fama de bons combatentes (e muito tocados pelo catolicismo) – nos deve
admirar. Mesmo tendo em conta o corte de cabeças indiscriminado, recentemente
ocorrido. Quem com ferros mata, com ferros morre.
Também eu tenho
pena da maioria daquela pobre gente, que não tem culpa nenhuma dos males que os
assolam, mas não posso fazer nada. E, muito provavelmente, não devo.
Não posso (devo)
fazer nada, em primeiro lugar porque Moçambique é um país independente (ah, ah,
ah!) que, ao que se sabe, ainda não pediu ajuda a ninguém. Talvez para não
reconhecer da inabilidade, impotência e desgraça que o actual Estado
Moçambicano representa.
Em segundo lugar,
as autoridades do Maputo devem pedir ajuda a quem com eles tenha alianças
políticas e de defesa, se é que alguma, o que não é o caso de Portugal. De
seguida deve pedir ajuda à ONU, essa prestimosa e babilónica, cara e
incompetente, que nunca prestou um serviço à Humanidade nem resolveu qualquer
problema sério. Mas que se esforçou muito para obrigar a Nação Portuguesa a
abandonar politicamente qualquer território fora do continente europeu. O mui
católico e progressista, bem comportadinho, bem - falante e inefável tuga,
António Guterres, há - de querer estar certamente, na primeira linha da frente
para tentar resolver tão chocante caso! Desse modo se evitaria que tal ónus
caísse em cima dos antigos combatentes portugueses, que cumpriram o seu dever para
com a Pátria, quando a isso foram chamados (embora desse dever só possam dar
baixa para a cova).
Além disso
ainda resta a Moçambique pedir ajuda aos regimes cafreais seus vizinhos da RAS
e Zimbabué, com quem são tão próximos ideologicamente… Ou até, quem sabe, podem
pedir ajuda à Tanzânia, para lhes ceder a antiga base de Nashingwea, de onde
partiam para nos emboscar as tropas e maltratar as populações. Podiam até,
esclarecer-nos sobre o que se passou com o navio Angoche – atacado em 1971 - e
os seus 22 tripulantes que desapareceram até hoje…
Se apesar destes
eventuais esforços falharem (como normalmente é o caso) e Moçambique quiser a
ajuda portuguesa, esta tem de ser bem negociada. Estou farto de ser o “totó de
serviço”! Até porque não nos livraríamos de acusações de neocolonialismo e por
aí fora…
Sem embargo as
autoridades moçambicanas têm de começar por fazer algo para tentarem resolver o
problema que têm em mãos, pois ninguém vai ajudar ninguém que, em primeiro
lugar, não se queira ajudar a si próprio. E, até ao momento, que conste, só
demonstraram incapacidade, cobardia e desfaçatez. Devem estar à espera que as
empresas estrangeiras que operem na região paguem a uns mercenários para
erradicar os insurgentes…
Mas mesmo que
Portugal quisesse ajudar o que poderia fazer a não ser usar de bons ofícios
diplomáticos?
O Governo (o Estado
Português), a única ideia que tiveram desde o terramoto do “PREC” foi o de se
atirarem de cabeça para a agora União Europeia (que caso tenha sucesso vai
acabar com o País), onde se esmeraram em serem “bem comportados” a fim de puder
esmifrar o máximo de ajudas comunitárias, mesmo que com isso pudessem causar
dependências, dívidas e empobrecimento irreparáveis. Tem sido a estratégia da
mão estendida.
A excepção foi a
de, num raro momento de lucidez, se ter apostado no alargamento da Plataforma
Continental, que está a ser confrontada com complexas negociações, de que pouco
tem vindo a público. E se tiver algum sucesso o mesmo estará logo restringido
pelo Tratado de Lisboa e restante legislação de Bruxelas.
Tirando isto não
há estratégia para nada, África incluída. Enfim enviamos pequenos contingentes
de tropas para países africanos e não só (cuja maioria não nos diz nada), na
estrita obediência a compromissos internacionais, que nos ajudam a sustentar.
Mas as Forças Armadas estão praticamente esgotadas e à míngua de tudo e tal não
se aplica somente ao âmbito material.
Mas como aquilo
em Moçambique (que já leva três anos), começou por ser um caso de polícia, não
há nada como enviar um contingente da PSP (que diabo já têm o dobro dos
efecivos do Exército), ou da GNR que passou a ser pau para toda a obra e deixa
o quantitativo da Armada e da FA (com metade dos efectivos) a ver navios e
“drones”!... O pior vai ser os sindicatos e associações existentes que não vão
gostar da coisa e exigir muitas horas extraordinárias…
De facto restam
os antigos “comandos” para irem dar o corpo ao manifesto. Até eu iria com eles,
mas não tornava a sair de lá enquanto não se fizesse um referendo, para se
saber se a maioria da população, desejaria voltar a ser portuguesa ou não.
Até lá, pensem
bem, não seria melhor o Governo enviar o Otelo Saraiva de Carvalho e afins,
ainda vivos, negociar com os “rebeldes”? (ou devo chamar-lhes guerrilheiros;
Combatentes pela “verdade”; libertadores da Pátria; apoiantes do Califado;
fanáticos religiosos ou bandidos de delito comum?). O gracioso verbalizador do
“pá” tem experiência no assunto e poderia finalmente realizar a peça teatral da
sua vida!
As
responsabilidades têm de morar em casa própria e os crimes efectuados não
deviam prescrever. O julgamento da História não prescreve e será feito, mas é
tardio, pouco efectivo e depende de quem a escrever.
Estou a ser duro
e insensível? Não estou, estou apenas a ser realista. Lamento mas Moçambique já
não é terra portuguesa. Resta a saudade que morrerá quando nós morrermos.
E como dizia
Goethe, “ninguém é mais escravo sem esperança, do que aqueles que falsamente
acreditam que são livres!”.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador (Ref.)
domingo, 22 de novembro de 2020
quinta-feira, 19 de novembro de 2020
domingo, 15 de novembro de 2020
A oliveira mais antiga de Portugal, 3350 anos
A oliveira mais antiga de _PORTUGAL, 3350 anos.
NA VILA DE MOURISCAS, conheceu Celtas, Iberes, Celtiberes, Lusitanos, Romanos, Visigódos, Árabes e outros povos ainda, que foram alimentados com suas azeitonas. Contemporâneo do Faraó Ramsés II e de Moisés (1250 anos antes de Jesus).
sábado, 7 de novembro de 2020
São Nuno de Santa Maria: exemplo de Amor à Pátria e Santidade
6/11 é dia de S. Nuno de Santa Maria.
Um texto a condizer!Como português e militar estou de joelho no chão e espada na mão!
segunda-feira, 2 de novembro de 2020
O GUARDA - CHUVA DA FORÇA ÁEREA
O GUARDA - CHUVA
DA FORÇA ÁEREA
01/11/20
“Chuva civil não molha militar”.
Da gíria castrense.
Põe-se
uma questão que é esta: a chuva mesmo sendo “civil” (um fenómeno meteorológico
não existente, dado só existir “chuva”), molha militar ou não? Molha, ai não
que não molha!…[1]
Ou seja, molha no sentido
real do termo; porém, metaforicamente, quando aplicado aos militares portugueses
(até agora) não molhava; imbuídos então deste espírito, a chuva não molhava
mesmo que os enregelassem até aos ossos!
Esta assunção entrou na
psicologia colectiva que os diferenciava e o termo “civil”, aparece como chiste
e para tornar efectiva essa diferenciação.
Mas a ideia que presidiu
aos antigos (já ninguém tem ideia de como estas coisas apareceram e passaram a
fazer parte da “praxis” militar) para nunca se terem lembrado ou querido, que
houvesse um chapéu - de - chuva da “ordem” foi a de preparar psicologicamente
as tropas para a dureza do combate, finalidade última da sua existência.
Lembrou-se agora o Comando
da Força Aérea (certamente inspirado na Força Aérea americana), de colocar em
causa esta “centenária” tradição castrense e tal fez espoletar, sobretudo nas
conversas e nas redes sociais, um estado de indignação e vitupério, raramente
visto, mesmo quando em confronto com decisões muito mais gravosas, até de lesa
- Pátria, com que amiúde somos brindados. E, valha a verdade, que o ocorrido
tem, outrossim, o apoio ou a indiferença de uns poucos.
É certo que a circular
(nem sequer é directiva) possui salvaguardas importantes, relativamente à
restrição do uso do guarda - chuva em situações que seriam de todo
impraticáveis, mas nem isso travou a agitação das mentes e a gozação quase
geral.[2]
Para tal concorreu
bastante o facto do Comando da Força Aérea ter cometido dois erros à cabeça:
não ter justificado a necessidade deste novo “item” e não ter discutido o
assunto com os outros Ramos e até, com a GNR.
É certo que cabe nas
prerrogativas do Chefe de Estado-Maior da FA mudar o fardamento do seu Ramo,
mas a decisão extravasa o limite do mesmo, por ter a ver com a “imagem”
tradicional do militar e tal não se confinar à Força Aérea. E note-se até, que
a PSP, sendo civil (por exemplo) também não é contemplada com tal artefacto...
Mas aquilo que
achei mais “notável” - e é essa a razão que me levou a dar-me ao trabalho de
escrever este arrazoado - foi a de que quase todas as pessoas com quem falei
sobre o assunto (e estavam contra) não conseguirem aduzir qualquer argumento
sério que consubstanciasse a sua indignação.
Tão pouco os
que são a favor, à excepção da evidência, que o guarda - chuva ajudaria a
proteger os militares das intempéries, “máxime”, evitar uma valente gripe.
Apesar do
argumento elaborado em termos de adequação militar, será o de afirmar, que a
preservação da saúde física e mental do militar se irá repercutir no seu
desempenho em combate (ou até no dia-a-dia).
Basta ver, por
exemplo, que tivemos mais mortos por doença na campanha em Moçambique durante a
I GM, do que no campo de batalha. Apesar da ausência ou não, de guarda - chuvas
no equipamento da altura não teria, seguramente, influenciado as baixas ocorridas…
Ora em
qualquer actividade humana e por maioria de razão, no âmbito militar, as
decisões não podem (ou devem) ser tomadas porque sim, ou porque não. Deve haver
uma racional que as suporte e uma mais-valia a obter. Isto, claro, desde que
não ponha em causa princípios ou doutrina existentes.
Ora, é sobre
estes aspectos que o consciente e inconsciente individual e colectivo, não
conseguiu raciocinar com um mínimo de serenidade e objectividade.
Aparentemente
as pessoas, onde naturalmente se destacam os militares, ao serem colhidas de
surpresa pela medida ficaram espantadas e reagiram quase automaticamente a algo
que vai contra o seu imaginário a que não se pode desligar algum sentimento de
ridículo quanto à situação.
A esmagadora
maioria dos militares no meio dos seus comentários, indica invariavelmente o
“até parece que não há nada mais importante para resolver”...
Não queria ir
por aqui, já que tal é lateral e circunstancial à questão e, ainda, por nessa
ordem de ideias não se poder tratar qualquer questão que não estivesse
hierarquizada pelo grau de importância. Mas entendemos o sentido da
argumentação.
Visto sobre outro prisma, a negação “tout
court” da introdução do guarda - chuva na indumentária militar, seria o mesmo
que negar qualquer tipo de evolução. Ora se houve coisa que nunca parou de
evoluir foi o tipo de uniformes e restante equipamento individual do
combatente.
As casacas do
século XVIII, por exemplo, tinham três ou quatro grandes botões na parte
correspondente ao antebraço. Tal destinava-se a dissuadir os seus utentes a
assoarem-se nas repectivas mangas...
Do mesmo modo
a aba traseira da casaca ou capote, tinha duas rachas com duas casas no seu final
e encimadas por dois botões, o que permitia segurar a aba dobrada em cima, de
modo que o militar pudesse fazer as suas necessidades fisiológicas sem sujar o
uniforme...
Na Primeira
Guerra Mundial (e não só) muitos oficiais usavam uma bengala, por razões
várias. É célebre a foto do General Tamagnini, Comandante do Corpo Expedicionário
Português na Flandres, apoiado na sua. Hoje em dia não passa pela cabeça de
ninguém usar bengala e o bengalim é apenas uma tradição residual cavaleira.
Pode ainda
argumentar-se que a seguir a este passo do guarda - chuva, se deveria também
usar “galochas” (o que por acaso já existiu), ou um outro qualquer artefacto
que se queira inventar, colocando-se a questão da “fronteira”, isto é, até onde
se deve ir.
As próprias
cerimónias que envolvem formaturas por vezes também são adiadas quando há
ameaça de mau tempo ou transferidas para um recinto coberto.
E consta que
na tropa italiana quem está formado, começando a chover, pode debandar, sem
ordem de ninguém. (mas enfim desde o fim do Império Romano que os exércitos da
Península Itálica não são grande exemplo a seguir...).
Por outro lado
um militar deslocando-se em espaço aberto anda obrigatoriamente com a cabeça
coberta (e pode usar gabardine), quer seja com boné, boina, bivaque, quico ou
capacete e tal já constitui uma protecção contra a fúria dos elementos. [3]
Mas tal
protecção é parcial, argumentar-se-á: o mesmo se aplica ao guarda - chuva, pode
retorquir-se, já que não evita que todo o corpo se molhe.
Enfim, creio
que já ilustrei o ponto.
Qual então a
conclusão a tirar disto tudo?
Pessoalmente
estou em crer que a (pequena) vantagem que o despacho do CEMFA, de 2 de Outubro
possa trazer, é bastante inferior aos inconvenientes daí derivados - a começar
pela polémica gerada - e que tem a ver sobretudo com a imagem que o militar tem
de si e que a população em geral dele tem.[4]
Recorde-se as
críticas que caíram sobre o General Carlos Azeredo enquanto Chefe da Casa
Militar do PR, fardado de General, abrigava o então inquilino de Belém, debaixo
de um guarda - chuva...
O uso de
guarda - chuva quebra inquestionavelmente a marcialidade (e a “cagança”) que é
apanágio de um militar [5];
além de ser de muito mau tom fazer-se continência de guarda - chuva aberto ou
ver um Cabo a “dar boleia” a um Coronel debaixo de um artefacto destes, ou
vice-versa.
Também não é
despiciendo tal praxis na preparação psicológica para as agruras da vida
militar representando, finalmente, uma tradição de sempre, onde não se
evidencia qualquer malefício. Faz bem ao Moral das tropas; é um ponto de
instrução; dispõe bem e é uma marca identitária. Finalmente vai contra a
“paisanice” reinante.
Um outro
aspecto ressalta - e creio não me enganar - das reacções havidas, os militares,
por um conjunto alargado de razões, estão tão zangados com o que se passa à sua
volta, nomeadamente dentro da Instituição de que fazem ou já fizeram parte,
estão tão causticados pelo modo como têm sido tratados como pessoas,
profissionais e servidores do País, que reagem a pés juntos a qualquer coisa
que se passe e descrentes de tudo.
São assim como
a floresta portuguesa no pino do Verão, à espera de uma fagulha que a
incendeie.
E quando a
situação fica assim, é normalmente por uma tolice qualquer menor, que se detona
uma carga explosiva que ninguém está à espera que rebente.
E, no entanto,
rebenta.
É preciso
pensar com a cabeça e não com o coração (embora as emoções não sejam
obrigatoriamente más). Algo difícil na natureza humana.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto-Aviador (Ref.)
[1] Por
alturas de 1970/1, creio, que no final de uma cerimónia de abertura solene de
aulas na Academia Militar, presidida pelo então PR Almirante Américo Thomaz,
duas companhias de alunos, comandadas pelo Comandante do Corpo de Alunos,
Coronel Carmelo Rosa (de saudosa memória) estava formada na parada para prestar
honras de despedida ao Chefe do Estado. Chovia desalmadamente.
O Chefe do Estado
esqueceu-se ou assim não entendeu, dispensar as honras e demorou a sair,
entretido que estava a conversar ou a ver se a chuva parava.
A formatura escorria água,
mas não mexia uma palha (podiam até “chover” picaretas...).
Então o Coronel Carmelo
Rosa entregou o comando da formatura ao oficial mais graduado a seguir e
caminhou direito ao Almirante Thomaz que estava à entrada do ginásio, onde
decorrera a sessão solene. Postou-se em frente a ele, apresentou armas, abateu
espada e tonitruou: “V. Exª Sr. Presidente dá licença que mande destroçar? Não
vê o estado em que estamos?”. Outros tempos...
[2] O guarda - chuva só pode
ser usado com uniforme nº 1 ou nº 2 e sem ser em formatura. E não pode pôr em
causa a saudação militar, vulgo continência.
[3] O
boné até possui um francalete por cima da pala que pode ser utilizado por baixo
do pescoço evitando assim que o vento o leve. Prática que caiu em desuso; à
excepção da Armada, onde ainda é muito utilizado na faina a bordo. Se assim não
for é muito fácil que o boné fique sepultado nas profundezas do mar...
[4] E também não se entende um
“item” que passa a fazer parte do uniforme, não seja distribuído, mas tenha de
ser pago…
[5]
Vide, por exemplo, que as golas apertadas e a própria pala do boné servem para
que os militares andem com a cabeça levantada.