Através das “Grandes Opções do
Plano, para 2014. O Governo afirmou a sua intenção de reduzir os efectivos das
Forças de Segurança (FS), através da não substituição de todos os elementos que
se aposentam.
Do documento o que ressalta – e isso notou-se na maioria das notícias/comentários vindos a público, é que a razão principal para tal opção é a de que “a população portuguesa está a envelhecer e a diminuir, o que favorece a diminuição da criminalidade”!
Não sabemos em que estudo é que o
Governo se baseou para chegar a esta conclusão, ou se tratou apenas de uma
daquelas tiradas, saídas da cartola partidária, num momento de imaginação
criativa, em que são férteis os políticos quando se trata de justificar as
iniciativas mais mirabolantes…
Aparenta ser um argumento peco.
O facto de a população diminuir
não vai em nada alterar as causas da delinquência, dos crimes ou da insegurança
– pode quanto muito fazer diminuir o número das incidências – ao passo que o
aumento da idade média da população parece configurar um factor de risco
acrescido, pois as torna mais vulneráveis e com menos capacidades para se
defender.
Tão pouco o território diminuiu
nem as fronteiras mudaram, embora a população se vá “arrumando” de modo diferente.
A comunidade emigrante está a
diminuir devagar e não parece que “a crise” nos seus diferentes aspectos possa
favorecer a segurança…
Confessamos não ter o saber de
experiência feito e a informação detalhada para opinarmos com fiabilidade sobre
o dispositivo e o número de efectivos adequados para lidar com os diferentes
vertentes da criminalidade e segurança.
Gostaríamos, sem embargo, de
fazer dois exercícios reflexivos.
Em 1974 o País dispunha de cerca
de dois milhões de Km2, espalhados pelo mundo, com uma população heterogénea
(em termos de raça, religião, e graus de desenvolvimento) de 22 milhões de
almas. E tínhamos fronteiras com 14 países diferentes.
E mantinha cerca de 220.000
homens, nas FA que combatiam uma guerra de guerrilha, em três dos territórios
africanos, mantendo uma vigilância significativa em todos os restantes.
Vamos tentar ater-nos – sem
deixar de ter em conta este pano de fundo – ao que se passava na parte europeia.
A PSP dispunha de 13 a 14.000 homens;
a GNR (que raramente operou nos Açores e Madeira) tinha 8343; a PJ, cerca de 300;
a PIDE/DGS cerca de 800;[1] a Guarda Fiscal com 6573
efectivos, os quais foram incorporados na GNR, em 1993 (constituindo a Brigada
Fiscal); a Polícia de Viação e Trânsito, com 621 elementos, extinta em 1970,
que veio a dar origem à Brigada de Trânsito da GNR.
Havia, ainda um corpo de Guardas Florestais,
que acabaram integrados na GNR, em 2006, como pessoal civil, depois de ninguém
saber o que fazer com eles. Contava 425 elementos.
A PSP destacava “companhias de
polícia móvel” para o Ultramar, nomeadamente Angola e Moçambique, e a GNR
chegou a actuar em S. Tomé, entre 1961 e 1974.[2]
*****
Entrados no novo Regime Político
foram sendo feitas várias reestruturações, agora apenas destinadas aos 92.000
Km2 e 10.5 milhões de habitantes, que nos restavam, onde se incluem, em média,
cerca de 400.000 emigrantes e filhos destes.
Deste modo chegámos a 2013 com um
quadro orgânico (QO) na PSP de 22.000 efectivos, praticamente preenchido; a GNR
com, respectivamente, 26.000 e 23.000.
A PIDE/DGS foi extinta e
substituída pelo SEF, com 1435 efectivos; uma pequena divisão de informações
militares; o SIED e o SIS, cujos efectivos devem rondar os 500.[3]
A PJ passou para um QO de 3000
efectivos havendo 1200, em funções operacionais.[4]
A isto temos que juntar as
Polícias Municipais de Lisboa e Porto, com cerca de 450 e 100 elementos,
respectivamente – que são agentes da PSP destacados com um estatuto que lhes
atribui, essencialmente, funções administrativas. Fora todos os outros que
estão espalhados pelo país e que não pertencem à PSP.
Para já não falar na ASAE, com
498 elementos, criada em 30/12/2005, a qual não sendo uma força de segurança em
termos estritos, poderemos englobá-la em termos latos.
Para tratar de todos os processos
levantados (entre outras coisas) temos vários “batalhões” de procuradores do
Ministério Público, além de toda a restante máquina judicial.
Tudo isto polvilhado de uma
miríade de sindicatos e associações profissionais.[5]
Ou seja o País diminuiu (em
tamanho, gente e complexidade); a tecnologia melhorou exponencialmente e a
cooperação internacional no espaço UE/EUA, avançou muito (Interpol; troca de informação,
etc.).
Sem embargo os efectivos “dispararam”
e os “organismos” proliferam.
Tudo isto, tendo agora uma “Democracia”,
semi – parlamentar, de tipo “ocidental”, onde já não haveria lugar a “vigilância
e repressão sobre a população oprimida”.
Esta a primeira reflexão que
deixo.
A segunda (e derradeira) tem a
ver com o facto de o Governo/forças políticas, não estarem a falar verdade – o
que se tornou recorrente – e, ou, a colocar os dedos nas verdadeiras causas dos
problemas que, supostamente, pretendem resolver.
É que se houver razões para reduzir
as FS, elas não têm nada a ver com as aduzidas pelo governo.
Centram-se, basicamente, em três
áreas – todas olimpicamente ignoradas por políticos, sindicatos/associações, comentadores e
cidadãos em geral: na adequação das leis; na questão da autoridade e na clareza
da definição de funções e âmbito de actuação das diferentes “polícias”.
Vou tentar sintetizar tudo isto
em escassas linhas.
As leis devem estar adequadas à
população em que vão ser aplicadas, por uma simples razão: a de não se
conseguir fazer, ainda, pessoas para as leis…
As leis do actual sistema
político, que enformam a sociedade portuguesa não parecem estar adequadas à
matriz ética, sociológica e cultural do povo português, além de pecarem por uma
extensa prioridade dos direitos e garantias face aos deveres e
responsabilidades.
E desequilibraram-se
perigosamente, a favor de um pano de fundo ideológico - mistura de teorias
jacobinas serôdias com destroços herdados do Maio de 68 em França - em
detrimento da realidade nua e crua da natureza humana.
Os principais instrumentos legais
onde todo este feixe de ideias erradas – concedo que algumas bem-intencionadas,
mas que povoam amiúde o inferno – são o Código Penal, o Código do Processo
Penal e demais legislação avulsa.
Os restantes actores do sistema
judiciário sofrem, na sua maioria, do mesmo mal e ainda de outros que não vêm
agora ao caso tratar.
Temos a seguir a questão da
autoridade (“Autoritas”), o que não deixa de estar ligada também ao edifício
legislativo.
Esta questão é sobretudo ideológica:
por um lado ainda sofre do complexo da comparação com o “Estado Novo”; de
complexos de “esquerda” que são contra por definição (a não ser que seja uma
“autoridade” revolucionária”); complexos de “direita”, por receio de se
assumirem e parvoíces avulsas.
O Relativismo Moral fez o resto.
Ora a Autoridade é o poder
investido numa determinada pessoa ou organização, para levar a efeito
determinadas tarefas. A Autoridade para ser efectiva, para além de dispor de
gente preparada, deve possuir um código ético-deontológico e meios de coação.
E funciona tanto melhor quanto
melhor forem a liderança exercida, a estrutura de comando/chefia e a
organização, disciplina e clareza da missão atribuída, à qual devem
corresponder (de preferência) os meios adequados.
Porém, nada disto funciona sem
uma hierarquia (palavra que virou maldita…) bem estruturada.
Caros leitores, nas últimas
décadas quantos de vós tem ouvido falar destas coisas?
Algures descobre-se um
responsável político falar em autoridade, mas rapidamente lhe junta o termo
“democrática”…
É como o caso da Ética…
republicana!
A Autoridade, tal como a Ética
não carecem de adjectivos; a autoridade existe, ou não, e a Ética é “apenas” a
ciência do Bem.
Assim se tem espalhado a confusão
pelo País…
Os membros das FS têm que ter a
capacidade de se fazerem obedecer pela palavra e disporem da panóplia de meios
de coação necessários para obter aquela, caso esta falhe.
E tal tem que estar salvaguardado
em lei, do mesmo modo que devem existir mecanismos para proteger os cidadãos de
eventuais abusos.
O ponto de equilíbrio de tudo
isto deve ser objecto de busca permanente, o que não tem nada a ver com andar a
mudar as coisas constantemente.
Finalmente enfatiza-se a
necessidade de coordenação e definição clara de áreas de actuação e respectivas
competências de modo a evitar conflitos e criar complementaridades.
Alguma coisa se tem feito neste
âmbito – nomeadamente na área sensível mas fundamental, de fazer chegar a
informação a quem dela necessita.
Mas muito há para fazer, do que damos
alguns exemplos:
- O conflito de competências sobre a Autoridade Marítima – onde tem havido uma “guerra surda” entre a GNR e a Armada (e uns quantos “civis” que espreitam), deve ser rapidamente sanado e aclarado;[6]
- Agentes da PJ a escoltar droga para hospitais e a fazer a respectiva guarda;
- Agentes da PSP a fazerem segurança a aeroportos e a licenciar e fiscalizar armamento a particulares e os explosivos das empresas mineiras;
- O SEF a combater o tráfico de droga, até fora das fronteiras;
- A GNR a fazer de bombeiros;
- Competências simultâneas entre a GNR e PSP, relativamente a auto estradas, aeroportos, defesa de pontos sensíveis, segurança de órgãos de soberania, etc.
Não se pode dizer que não haja
responsabilidades de todos, pois quando se trata de “poder”, ninguém quer ficar
de fora…
E tem havido sobretudo
responsabilidades governamentais, pois ninguém quer arriscar decidir nada (o
que acaba por não ser mau de todo, dadas as barbaridades que se têm cometido…).
Se o governo quiser actuar,
seriamente, neste âmbito, terá que o fazer nas três áreas referidas, ou seja:
- Simplificar e adequar todo o edifício legislativo que dá todas as defesas aos criminosos e caustica quem se porta bem; está um emaranhado em que é difícil alguém entender-se e se destina a ser aplicado numa “espécie” de portugueses inexistente – trata-se ainda de uma necessidade premente, mas não única, para “agilizar” o funcionamento dos tribunais;
- Dar autoridade efectiva aos agentes da mesma;
- Desconflituar a actuação da multitude de entidades dedicadas à Segurança Interna e torna-las verdadeiramente complementares.
Se conseguirem fazer isto podem,
seguramente, não só reduzir efectivos, como aumentar em muito os resultados
operacionais e a eficiência.
Se assim não for, podem até
aumentar os efectivos para 300.000 que não se sairá da cepa torta.
Mas, obviamente, tal significaria
atacar as causas dos problemas e não os seus efeitos, o que não está nada na
tradição nacional.
E também não dá votos.
[1] De um total de cerca de 2100 (360 administrativos) em todo o então território nacional, onde não entram os “Flechas".
[2] Possuíam um QO de um
oficial subalterno, dois sargentos, nove cabos e 26 soldados.
[3] Por razões óbvias, não se sabe ao certo.
[4] Convém referir que a investigação criminal para os crimes a que correspondem penas menores (que rondam os 80%), passou, em 2000, da jurisdição da PJ para a GNR e PSP.
[5] Seria ainda interessante analisar o “Corpo de Guardas Prisionais”, dependentes do Ministério da Justiça, que não constam da Lei de Segurança Interna, como FS, mas que na última revisão do seu estatuto, conseguiram tal equiparação para efeitos de regalias, mantendo, porém, o direito à greve o que está vedado àquelas…
[6] E não parece haver razão alguma para se pensar em eventuais estruturas tipo “Guarda Costeira”.
[3] Por razões óbvias, não se sabe ao certo.
[4] Convém referir que a investigação criminal para os crimes a que correspondem penas menores (que rondam os 80%), passou, em 2000, da jurisdição da PJ para a GNR e PSP.
[5] Seria ainda interessante analisar o “Corpo de Guardas Prisionais”, dependentes do Ministério da Justiça, que não constam da Lei de Segurança Interna, como FS, mas que na última revisão do seu estatuto, conseguiram tal equiparação para efeitos de regalias, mantendo, porém, o direito à greve o que está vedado àquelas…
[6] E não parece haver razão alguma para se pensar em eventuais estruturas tipo “Guarda Costeira”.