sexta-feira, 25 de outubro de 2013

CHEGOU A VEZ DAS FORÇAS DE SEGURANÇA

Através das “Grandes Opções do Plano, para 2014. O Governo afirmou a sua intenção de reduzir os efectivos das Forças de Segurança (FS), através da não substituição de todos os elementos que se aposentam.

Do documento o que ressalta – e isso notou-se na maioria das notícias/comentários vindos a público, é que a razão principal para tal opção é a de que “a população portuguesa está a envelhecer e a diminuir, o que favorece a diminuição da criminalidade”!
 
Não sabemos em que estudo é que o Governo se baseou para chegar a esta conclusão, ou se tratou apenas de uma daquelas tiradas, saídas da cartola partidária, num momento de imaginação criativa, em que são férteis os políticos quando se trata de justificar as iniciativas mais mirabolantes…
Aparenta ser um argumento peco.
O facto de a população diminuir não vai em nada alterar as causas da delinquência, dos crimes ou da insegurança – pode quanto muito fazer diminuir o número das incidências – ao passo que o aumento da idade média da população parece configurar um factor de risco acrescido, pois as torna mais vulneráveis e com menos capacidades para se defender.
Tão pouco o território diminuiu nem as fronteiras mudaram, embora a população se vá “arrumando” de modo diferente.
A comunidade emigrante está a diminuir devagar e não parece que “a crise” nos seus diferentes aspectos possa favorecer a segurança…
Confessamos não ter o saber de experiência feito e a informação detalhada para opinarmos com fiabilidade sobre o dispositivo e o número de efectivos adequados para lidar com os diferentes vertentes da criminalidade e segurança.
Gostaríamos, sem embargo, de fazer dois exercícios reflexivos.
Em 1974 o País dispunha de cerca de dois milhões de Km2, espalhados pelo mundo, com uma população heterogénea (em termos de raça, religião, e graus de desenvolvimento) de 22 milhões de almas. E tínhamos fronteiras com 14 países diferentes.
E mantinha cerca de 220.000 homens, nas FA que combatiam uma guerra de guerrilha, em três dos territórios africanos, mantendo uma vigilância significativa em todos os restantes.
Vamos tentar ater-nos – sem deixar de ter em conta este pano de fundo – ao que se passava na parte europeia.
A PSP dispunha de 13 a 14.000 homens; a GNR (que raramente operou nos Açores e Madeira) tinha 8343; a PJ, cerca de 300; a PIDE/DGS cerca de 800;[1] a Guarda Fiscal com 6573 efectivos, os quais foram incorporados na GNR, em 1993 (constituindo a Brigada Fiscal); a Polícia de Viação e Trânsito, com 621 elementos, extinta em 1970, que veio a dar origem à Brigada de Trânsito da GNR.
 Havia, ainda um corpo de Guardas Florestais, que acabaram integrados na GNR, em 2006, como pessoal civil, depois de ninguém saber o que fazer com eles. Contava 425 elementos.
A PSP destacava “companhias de polícia móvel” para o Ultramar, nomeadamente Angola e Moçambique, e a GNR chegou a actuar em S. Tomé, entre 1961 e 1974.[2]
*****
Entrados no novo Regime Político foram sendo feitas várias reestruturações, agora apenas destinadas aos 92.000 Km2 e 10.5 milhões de habitantes, que nos restavam, onde se incluem, em média, cerca de 400.000 emigrantes e filhos destes.
Deste modo chegámos a 2013 com um quadro orgânico (QO) na PSP de 22.000 efectivos, praticamente preenchido; a GNR com, respectivamente, 26.000 e 23.000.
A PIDE/DGS foi extinta e substituída pelo SEF, com 1435 efectivos; uma pequena divisão de informações militares; o SIED e o SIS, cujos efectivos devem rondar os 500.[3]
A PJ passou para um QO de 3000 efectivos havendo 1200, em funções operacionais.[4]
A isto temos que juntar as Polícias Municipais de Lisboa e Porto, com cerca de 450 e 100 elementos, respectivamente – que são agentes da PSP destacados com um estatuto que lhes atribui, essencialmente, funções administrativas. Fora todos os outros que estão espalhados pelo país e que não pertencem à PSP.
Para já não falar na ASAE, com 498 elementos, criada em 30/12/2005, a qual não sendo uma força de segurança em termos estritos, poderemos englobá-la em termos latos.
Para tratar de todos os processos levantados (entre outras coisas) temos vários “batalhões” de procuradores do Ministério Público, além de toda a restante máquina judicial.
Tudo isto polvilhado de uma miríade de sindicatos e associações profissionais.[5]
Ou seja o País diminuiu (em tamanho, gente e complexidade); a tecnologia melhorou exponencialmente e a cooperação internacional no espaço UE/EUA, avançou muito (Interpol; troca de informação, etc.).
Sem embargo os efectivos “dispararam” e os “organismos” proliferam.
Tudo isto, tendo agora uma “Democracia”, semi – parlamentar, de tipo “ocidental”, onde já não haveria lugar a “vigilância e repressão sobre a população oprimida”.
Esta a primeira reflexão que deixo.
A segunda (e derradeira) tem a ver com o facto de o Governo/forças políticas, não estarem a falar verdade – o que se tornou recorrente – e, ou, a colocar os dedos nas verdadeiras causas dos problemas que, supostamente, pretendem resolver.
É que se houver razões para reduzir as FS, elas não têm nada a ver com as aduzidas pelo governo.
Centram-se, basicamente, em três áreas – todas olimpicamente ignoradas por políticos,  sindicatos/associações, comentadores e cidadãos em geral: na adequação das leis; na questão da autoridade e na clareza da definição de funções e âmbito de actuação das diferentes “polícias”.
Vou tentar sintetizar tudo isto em escassas linhas.
As leis devem estar adequadas à população em que vão ser aplicadas, por uma simples razão: a de não se conseguir fazer, ainda, pessoas para as leis…
As leis do actual sistema político, que enformam a sociedade portuguesa não parecem estar adequadas à matriz ética, sociológica e cultural do povo português, além de pecarem por uma extensa prioridade dos direitos e garantias face aos deveres e responsabilidades.
E desequilibraram-se perigosamente, a favor de um pano de fundo ideológico - mistura de teorias jacobinas serôdias com destroços herdados do Maio de 68 em França - em detrimento da realidade nua e crua da natureza humana.
Os principais instrumentos legais onde todo este feixe de ideias erradas – concedo que algumas bem-intencionadas, mas que povoam amiúde o inferno – são o Código Penal, o Código do Processo Penal e demais legislação avulsa.
Os restantes actores do sistema judiciário sofrem, na sua maioria, do mesmo mal e ainda de outros que não vêm agora ao caso tratar.
Temos a seguir a questão da autoridade (“Autoritas”), o que não deixa de estar ligada também ao edifício legislativo.
Esta questão é sobretudo ideológica: por um lado ainda sofre do complexo da comparação com o “Estado Novo”; de complexos de “esquerda” que são contra por definição (a não ser que seja uma “autoridade” revolucionária”); complexos de “direita”, por receio de se assumirem e parvoíces avulsas.
O Relativismo Moral fez o resto.
Ora a Autoridade é o poder investido numa determinada pessoa ou organização, para levar a efeito determinadas tarefas. A Autoridade para ser efectiva, para além de dispor de gente preparada, deve possuir um código ético-deontológico e meios de coação.
E funciona tanto melhor quanto melhor forem a liderança exercida, a estrutura de comando/chefia e a organização, disciplina e clareza da missão atribuída, à qual devem corresponder (de preferência) os meios adequados.
Porém, nada disto funciona sem uma hierarquia (palavra que virou maldita…) bem estruturada.
Caros leitores, nas últimas décadas quantos de vós tem ouvido falar destas coisas?
Algures descobre-se um responsável político falar em autoridade, mas rapidamente lhe junta o termo “democrática”…
É como o caso da Ética… republicana!
A Autoridade, tal como a Ética não carecem de adjectivos; a autoridade existe, ou não, e a Ética é “apenas” a ciência do Bem.
Assim se tem espalhado a confusão pelo País…
Os membros das FS têm que ter a capacidade de se fazerem obedecer pela palavra e disporem da panóplia de meios de coação necessários para obter aquela, caso esta falhe.
E tal tem que estar salvaguardado em lei, do mesmo modo que devem existir mecanismos para proteger os cidadãos de eventuais abusos.
O ponto de equilíbrio de tudo isto deve ser objecto de busca permanente, o que não tem nada a ver com andar a mudar as coisas constantemente.
Finalmente enfatiza-se a necessidade de coordenação e definição clara de áreas de actuação e respectivas competências de modo a evitar conflitos e criar complementaridades.
Alguma coisa se tem feito neste âmbito – nomeadamente na área sensível mas fundamental, de fazer chegar a informação a quem dela necessita.
Mas muito há para fazer, do que damos alguns exemplos:
  • O conflito de competências sobre a Autoridade Marítima – onde tem havido uma “guerra surda” entre a GNR e a Armada (e uns quantos “civis” que espreitam), deve ser rapidamente sanado e aclarado;[6]
  • Agentes da PJ a escoltar droga para hospitais e a fazer a respectiva guarda;
  • Agentes da PSP a fazerem segurança a aeroportos e a licenciar e fiscalizar armamento a particulares e os explosivos das empresas mineiras;
  • O SEF a combater o tráfico de droga, até fora das fronteiras;
  • A GNR a fazer de bombeiros;
  • Competências simultâneas entre a GNR e PSP, relativamente a auto estradas, aeroportos, defesa de pontos sensíveis, segurança de órgãos de soberania, etc.
Não se pode dizer que não haja responsabilidades de todos, pois quando se trata de “poder”, ninguém quer ficar de fora…
E tem havido sobretudo responsabilidades governamentais, pois ninguém quer arriscar decidir nada (o que acaba por não ser mau de todo, dadas as barbaridades que se têm cometido…).
Se o governo quiser actuar, seriamente, neste âmbito, terá que o fazer nas três áreas referidas, ou seja:
  • Simplificar e adequar todo o edifício legislativo que dá todas as defesas aos criminosos e caustica quem se porta bem; está um emaranhado em que é difícil alguém entender-se e se destina a ser aplicado numa “espécie” de portugueses inexistente – trata-se ainda de uma necessidade premente, mas não única, para “agilizar” o funcionamento dos tribunais;
  • Dar autoridade efectiva aos agentes da mesma;
  • Desconflituar a actuação da multitude de entidades dedicadas à Segurança Interna e torna-las verdadeiramente complementares.
Se conseguirem fazer isto podem, seguramente, não só reduzir efectivos, como aumentar em muito os resultados operacionais e a eficiência.
Se assim não for, podem até aumentar os efectivos para 300.000 que não se sairá da cepa torta.
Mas, obviamente, tal significaria atacar as causas dos problemas e não os seus efeitos, o que não está nada na tradição nacional.
E também não dá votos.



[1] De um total de cerca de 2100 (360 administrativos) em todo o então território nacional, onde não entram os “Flechas".
[2] Possuíam um QO de um oficial subalterno, dois sargentos, nove cabos e 26 soldados.
[3] Por razões óbvias, não se sabe ao certo.
[4] Convém referir que a investigação criminal para os crimes a que correspondem penas menores (que rondam os 80%), passou, em 2000, da jurisdição da PJ para a GNR e PSP.
[5] Seria ainda interessante analisar o “Corpo de Guardas Prisionais”, dependentes do Ministério da Justiça, que não constam da Lei de Segurança Interna, como FS, mas que na última revisão do seu estatuto, conseguiram tal equiparação para efeitos de regalias, mantendo, porém, o direito à greve o que está vedado àquelas…
[6] E não parece haver razão alguma para se pensar em eventuais estruturas tipo “Guarda Costeira”.

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