O DIA DOS
PARAQUEDISTAS MILITARES!
23MAI19
“… Um Exército mal armado e pouco numeroso
não serve para nada, senão para gastar ao
Tesouro uma soma avultada de contos de reis
em pura perda; um Exército organizado, bem
disciplinado e tão numeroso quanto o comporta-
rem as forças do país é um elemento de ordem,
independência e prosperidade pública; é um meio
de que servem todas as nações modernas, para
conservarem a sua dignidade e defenderem os
seus interesses…”.
Fontes
Pereira de Melo, perante as Cortes,
Em 2 de Julho de 1860.
Dizem –
e se calhar é verdade – que só há uma “romaria” em Portugal que ultrapassa aquela
que é feita a 23 de Maio, em Tancos: o 13 de Maio em Fátima!
De que
“romaria” se trata?
Pois
aquela que leva, anualmente, grande parte da família paraquedista (já foram
formados mais de 40.000 paraquedistas, desde 1955), à casa mãe: o quartel do
Batalhão de Paraquedistas, em Tancos, inaugurado em 1956 (faz agora 63 anos),
mais tarde Regimento (1961) e que, depois de muitas décadas e mudanças de nome,
voltou à mesma designação de “Regimento”, um termo militar antigo e adequado,
ao contrário de umas siglas muito “modernaças” que para aí têm inventado
(sabe-se lá com que desígnios) e que de militar têm nada.
É
uma tradição que se maturou há muito, que tem passado de geração em geração,
que se estende aos familiares e que certamente tem origem num espírito de corpo
único, forjado desde o dia em que os candidatos à “boina verde”, chegam à
unidade. E que aprendi a conhecer cedo quando, ainda cadete da Academia Militar,
por lá tive instrução de paraquedismo, no primeiro curso organizado naquela
casa (AM), no âmbito das actividades circum-escolares.
Felizmente
que as feridas causadas no já remoto tempo do “PREC” (1974/5), aparentam estar
saradas – feridas lamentáveis, causadas pela inadmissível intromissão
ideológica/partidária, em unidades militares – e todos convivem à moda antiga e
com boa disposição sem que a usura do tempo nas figuras escorreitas de
combatentes de elite, que em tempo foram, possa macular.
Mas
sarar não deve ser esquecer, sobretudo na mente do pessoal no activo e
sobretudo na de toda a hierarquia responsável. Para que nunca mais possa
acontecer.
As
lições são para ser aprendidas, não são para esquecer.
Uma
palavra para as Associações de Paraquedistas que marcaram também a sua
presença. Estamos em crer que a causa do associativismo e da camaradagem
militar só teria a ganhar com o fim da pulverização existente, o que se poderia
substituir por uma única associação com núcleos descentralizados pelo país,
havendo assim unidade de comando; massa crítica, concentração de meios; etc.
Mas
enfim, quem pertence ao meio é que terá que discernir e decidir sobre qual o
melhor figurino que lhe assenta.
Decidiu
o Almirante Chefe de Estado-Maior presidir à cerimónia militar que, como é
timbre, decorreu com lustre.[1]
A
esta decisão não é, seguramente estranha, o muito bom comportamento da última
força destacada para a República Centro Africana, composta maioritariamente por
paraquedistas e que esteve várias vezes debaixo de fogo.
Não
desmereceram assim, do Alferes Mota da Costa que morreu em combate, defendendo
a população do Bungo, em Angola (1961), ou do Batalhão 12 nos últimos anos da
Campanha na Guiné (72/73/74), seguramente um dos melhores comportamentos de
todas as unidades que combateram no Ultramar (61-74). E tantos outros.
As
deficiências no equipamento, armamento e logística, com que as unidades que têm
sido destacadas para alguns teatros de operações um pouco por todo o mundo são
conhecidas, pelo que não vou falar delas, a não ser para dizer que continuam a
ser colmatadas algo casuística e pontualmente, com todos os problemas que tal
acarreta. Tendo acontecido já, que subunidades adquiriram de motu próprio,
alguns “drones”, em supermercados…
Mas
quero abrir uma excepção para uma nova contingência que saiu evidenciada no já
citado território africano e que foi a falta sentida de apoio aéreo.
Não
é que ele não estivesse disponível, mas não era efectuado por portugueses. Ora
muitas vezes as forças militares de outros países que são nossos aliados nestas
operações combinadas, nem sempre são da melhor qualidade, pelo que é muito
arriscado estarmos dependentes do seu apoio.
Por
outro lado o grau de ameaça pode mudar de um momento para o outro.
Foi
aliás o seu se constatou, relativamente ao poder de fogo dos “insurgentes” com
que nos confrontámos o que obrigou ao envio urgente de cinco blindados de
rodas, “Pandur”, e ainda se teve que improvisar uma protecção para o apontador da
metralhadora, o que já podia estar resolvido do anterior…
O
mesmo já não foi possível fazer com o apoio aéreo, neste caso em termos de
helicópteros armados, pois as nossas Forças Armadas, não os possuem.
De facto o fim do projecto do
Grupo de Aviação Ligeira do Exército, correu algo mal desde o início e acabou
por ser extinto pelo ministro Aguiar Branco (governo de que fazia parte), numa
fase já adiantada do projecto e que onerou o contribuinte em muitas dezenas de
milhões de euros; neste momento a Força Aérea efectuou o “phase-out” da frota
ALIII (que operou durante 55 anos!), aeronave em que se podia montar um heli-canhão
– uma das melhores armas que tivemos em África.
Esta frota vai ser substituída
por cinco helicópteros “Koala”, dos quais só chegaram dois. Ora cinco aeronaves
é um número ridículo face às necessidades e às missões que supostamente terão
que fazer. Existe a probabilidade de os armar mas não sabemos se tal opção está
contemplada e quanto tempo demorará a estar operacional. Mas é urgente.
Efectuado este pequeno
deambulatório, diremos que concorreu para o lustre da cerimónia militar, o
discurso do Almirante CEMGFA. Já há bastante tempo que não tínhamos
oportunidade de ouvir uma mensagem tão boa e dita de um modo sentido.
Mas por melhores que sejam as
palavras dos chefes militares, estas não podem ocultar o que a parada nos
mostra: em tempos (e não estamos a falar do tempo da guerra) os efectivos não
cabiam todos lá; hoje as cerca de três companhias presentes mais a banda e
fanfarra do Exército, quase deixavam a parada a descoberto e quase esgotam os
efectivos...
No último curso chegaram ao fim
cerca de 29 novos paraquedistas…
Ou seja, caminha-se para a
extinção!
Estamos pois em morte lenta e,
no final, será abrupta. E não se pode baixar a exigência e dureza na instrução,
haja o que houver de eventuais pressões políticas ou da opinião publicada.
Como é de tradição, as
cerimónias militares encerram sempre com saltos de paraquedas, o elemento
táctico fundamental e diferenciador de uma tropa deste tipo.
E lá saltaram de um C295 que
aterrou na antiga Base Aérea de Tancos e que agora não se sabe muito bem o que
é.
Base Aérea de saudosa memória,
que uma decisão infeliz e estrategicamente errada, de uma chefia da Força
Aérea, encerrou (e, neste caso, não foi uma decisão política…). Erros que se
pagam caros.[2]
Do mesmo modo que foi um erro
grave e escusado, passar os paraquedistas da FA para o Exército (“transitaram
até de Ramo”, disse o CEMGFA na sua prédica).
Mas disso trataremos no próximo
escrito.
João
José Brandão Ferreira
Oficial
Piloto Aviador (Ref)
[1] Apesar
de que alguma assistência já se tenha esquecido que se deve levantar, descobrir
e manter em silêncio, quando passa o Estandarte Nacional ou toca “a mortos”.
[2] Nesta
decisão também existe responsabilidade dos então Conselho de Chefes Militares e
do Conselho Superior de Defesa Nacional, que deixaram apenas nas mãos de um
chefe de um Ramo, determinar easta importante mudança no dispositivo (que
afecta todos)…