domingo, 26 de maio de 2019

O DIA DOS PARAQUEDISTAS MILITARES!

O DIA DOS PARAQUEDISTAS MILITARES!
23MAI19
                                     “… Um Exército mal armado e pouco numeroso
                                       não serve para nada, senão para gastar ao
                                      Tesouro uma soma avultada de contos de reis
                                      em pura perda; um Exército organizado, bem
                                      disciplinado e tão numeroso quanto o comporta-
                                      rem as forças do país é um elemento de ordem,
                                      independência e prosperidade pública; é um meio
                                      de que servem todas as nações modernas, para
                                      conservarem a sua dignidade e defenderem os
                                      seus interesses…”.
                                      Fontes Pereira de Melo, perante as Cortes,
                                      Em 2 de Julho de 1860.      
     
                Dizem – e se calhar é verdade – que só há uma “romaria” em Portugal que ultrapassa aquela que é feita a 23 de Maio, em Tancos: o 13 de Maio em Fátima!
                De que “romaria” se trata?
                Pois aquela que leva, anualmente, grande parte da família paraquedista (já foram formados mais de 40.000 paraquedistas, desde 1955), à casa mãe: o quartel do Batalhão de Paraquedistas, em Tancos, inaugurado em 1956 (faz agora 63 anos), mais tarde Regimento (1961) e que, depois de muitas décadas e mudanças de nome, voltou à mesma designação de “Regimento”, um termo militar antigo e adequado, ao contrário de umas siglas muito “modernaças” que para aí têm inventado (sabe-se lá com que desígnios) e que de militar têm nada.
                É uma tradição que se maturou há muito, que tem passado de geração em geração, que se estende aos familiares e que certamente tem origem num espírito de corpo único, forjado desde o dia em que os candidatos à “boina verde”, chegam à unidade. E que aprendi a conhecer cedo quando, ainda cadete da Academia Militar, por lá tive instrução de paraquedismo, no primeiro curso organizado naquela casa (AM), no âmbito das actividades circum-escolares.
                Felizmente que as feridas causadas no já remoto tempo do “PREC” (1974/5), aparentam estar saradas – feridas lamentáveis, causadas pela inadmissível intromissão ideológica/partidária, em unidades militares – e todos convivem à moda antiga e com boa disposição sem que a usura do tempo nas figuras escorreitas de combatentes de elite, que em tempo foram, possa macular.
                Mas sarar não deve ser esquecer, sobretudo na mente do pessoal no activo e sobretudo na de toda a hierarquia responsável. Para que nunca mais possa acontecer.
                As lições são para ser aprendidas, não são para esquecer.
                Uma palavra para as Associações de Paraquedistas que marcaram também a sua presença. Estamos em crer que a causa do associativismo e da camaradagem militar só teria a ganhar com o fim da pulverização existente, o que se poderia substituir por uma única associação com núcleos descentralizados pelo país, havendo assim unidade de comando; massa crítica, concentração de meios; etc.
                Mas enfim, quem pertence ao meio é que terá que discernir e decidir sobre qual o melhor figurino que lhe assenta.
                Decidiu o Almirante Chefe de Estado-Maior presidir à cerimónia militar que, como é timbre, decorreu com lustre.[1]
                A esta decisão não é, seguramente estranha, o muito bom comportamento da última força destacada para a República Centro Africana, composta maioritariamente por paraquedistas e que esteve várias vezes debaixo de fogo.
                Não desmereceram assim, do Alferes Mota da Costa que morreu em combate, defendendo a população do Bungo, em Angola (1961), ou do Batalhão 12 nos últimos anos da Campanha na Guiné (72/73/74), seguramente um dos melhores comportamentos de todas as unidades que combateram no Ultramar (61-74). E tantos outros.
                As deficiências no equipamento, armamento e logística, com que as unidades que têm sido destacadas para alguns teatros de operações um pouco por todo o mundo são conhecidas, pelo que não vou falar delas, a não ser para dizer que continuam a ser colmatadas algo casuística e pontualmente, com todos os problemas que tal acarreta. Tendo acontecido já, que subunidades adquiriram de motu próprio, alguns “drones”, em supermercados…
                Mas quero abrir uma excepção para uma nova contingência que saiu evidenciada no já citado território africano e que foi a falta sentida de apoio aéreo.
                Não é que ele não estivesse disponível, mas não era efectuado por portugueses. Ora muitas vezes as forças militares de outros países que são nossos aliados nestas operações combinadas, nem sempre são da melhor qualidade, pelo que é muito arriscado estarmos dependentes do seu apoio.
                Por outro lado o grau de ameaça pode mudar de um momento para o outro.
                Foi aliás o seu se constatou, relativamente ao poder de fogo dos “insurgentes” com que nos confrontámos o que obrigou ao envio urgente de cinco blindados de rodas, “Pandur”, e ainda se teve que improvisar uma protecção para o apontador da metralhadora, o que já podia estar resolvido do anterior…
                O mesmo já não foi possível fazer com o apoio aéreo, neste caso em termos de helicópteros armados, pois as nossas Forças Armadas, não os possuem.
                De facto o fim do projecto do Grupo de Aviação Ligeira do Exército, correu algo mal desde o início e acabou por ser extinto pelo ministro Aguiar Branco (governo de que fazia parte), numa fase já adiantada do projecto e que onerou o contribuinte em muitas dezenas de milhões de euros; neste momento a Força Aérea efectuou o “phase-out” da frota ALIII (que operou durante 55 anos!), aeronave em que se podia montar um heli-canhão – uma das melhores armas que tivemos em África.
                Esta frota vai ser substituída por cinco helicópteros “Koala”, dos quais só chegaram dois. Ora cinco aeronaves é um número ridículo face às necessidades e às missões que supostamente terão que fazer. Existe a probabilidade de os armar mas não sabemos se tal opção está contemplada e quanto tempo demorará a estar operacional. Mas é urgente.
                Efectuado este pequeno deambulatório, diremos que concorreu para o lustre da cerimónia militar, o discurso do Almirante CEMGFA. Já há bastante tempo que não tínhamos oportunidade de ouvir uma mensagem tão boa e dita de um modo sentido.
                Mas por melhores que sejam as palavras dos chefes militares, estas não podem ocultar o que a parada nos mostra: em tempos (e não estamos a falar do tempo da guerra) os efectivos não cabiam todos lá; hoje as cerca de três companhias presentes mais a banda e fanfarra do Exército, quase deixavam a parada a descoberto e quase esgotam os efectivos...
                No último curso chegaram ao fim cerca de 29 novos paraquedistas…
              Ou seja, caminha-se para a extinção!
                Estamos pois em morte lenta e, no final, será abrupta. E não se pode baixar a exigência e dureza na instrução, haja o que houver de eventuais pressões políticas ou da opinião publicada.
                Como é de tradição, as cerimónias militares encerram sempre com saltos de paraquedas, o elemento táctico fundamental e diferenciador de uma tropa deste tipo.
                E lá saltaram de um C295 que aterrou na antiga Base Aérea de Tancos e que agora não se sabe muito bem o que é.
                Base Aérea de saudosa memória, que uma decisão infeliz e estrategicamente errada, de uma chefia da Força Aérea, encerrou (e, neste caso, não foi uma decisão política…). Erros que se pagam caros.[2]
                Do mesmo modo que foi um erro grave e escusado, passar os paraquedistas da FA para o Exército (“transitaram até de Ramo”, disse o CEMGFA na sua prédica).
                Mas disso trataremos no próximo escrito.



                                                               João José Brandão Ferreira
                                                               Oficial Piloto Aviador (Ref)


               
               


[1] Apesar de que alguma assistência já se tenha esquecido que se deve levantar, descobrir e manter em silêncio, quando passa o Estandarte Nacional ou toca “a mortos”.
[2] Nesta decisão também existe responsabilidade dos então Conselho de Chefes Militares e do Conselho Superior de Defesa Nacional, que deixaram apenas nas mãos de um chefe de um Ramo, determinar easta importante mudança no dispositivo (que afecta todos)…

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