A “ESCOLA”
GEOPOLÍTICA PORTUGUESA E A U.E.
13/06/10
Em
Portugal temos muita dificuldade em racionalizar conceitos, por isso raro os
enunciamos.
Nós
não discutimos a vida, limitamo-nos a vivê-la. Não nos preocupamos com fins nem
com princípios. Resolvemos a coisa entre uns pires de caracóis e uma imperial
fresquinha. Pelo meio exalamos frases de profundo sentido como “a vida são dois
dias”; “ele é que a sabe toda”; “essa é que é essa”, etc. E há sempre um que
atira, “olha-me aquela gaja”. Bom, até este último arrobo de marialvismo,
parece ter os dias contados…
Será
que fomos sempre assim? Que eventos históricos nos moldaram?
No
princípio do século XV, estando as fronteiras estabilizadas, a crise
político/dinástica resolvida, o estado forte e a nação “formatada” e unida,
pôs-se a questão da consolidação/expansão do país. Uma era corolário da outra e
vice-versa.
Confrontados
com a realidade geopolítica - que configura até hoje e sempre, uma ditadura
geográfica – a elite política portuguesa decidiu atacar Ceuta. Um lote
apreciável de razões ditou a ida. A alternativa seria progredir pela Andaluzia
em direcção a Granada, mas tal foi considerado perigoso, pois aquele território
era considerado zona de expansão natural de Castela e nós dificilmente nos aguentaríamos
com tal poder, que sempre foi superior ao nosso. Para equilibrar as coisas
foi-se mantendo a Aliança Inglesa (estabelecida em 1373) … até hoje.
Com
o pé em Ceuta foi-se, naturalmente, costa abaixo e mar adentro.
Com
a Europa do Centro, Sul e Norte, nomeadamente as suas zonas costeiras, mantivemos
um progressivo comércio desde o século XII e também uma estreita ligação à
Borgonha – donde nos tinha vindo o Conde Henrique, os monges de Cister e o
apoio de S. Bernardo de Claraval, para a Reconquista, a implementação da Ordem
do Templo e para a própria independência.
Estas relações com a Borgonha
tiveram notável incremento quando a Infanta Isabel, filha de D. João I casou
com o Duque da Borgonha, em 1430. Também, no século XV, se tentou estreitar os
laços com o Imperador da Alemanha, não só por razões de comércio (e troca de
saberes) mas, outrossim, para obter apoios político/diplomáticos que nos
defendessem da França e dos poderes peninsulares.
Ora
estas duas vertentes, ir para o Centro da Europa ou para o Sul, Atlântico e
Norte de África, vieram a focalizar-se em dois príncipes da Casa Real
Portuguesa: D. Pedro, o das sete partidas e D. Henrique, o navegador.
Em
termos modernos pode dizer-se que estes dois homens deram origem a dois conceitos
ou duas escolas de geopolítica portuguesa que, em termos sucintos, se podem
enunciar da seguinte maneira: D. Pedro privilegiava as relações com a Europa
culta e mais rica (ele tinha visitado os principais reinos europeus durante
três anos…), embora não se opusesse à exploração do Atlântico, sobretudo o
central. Opunha-se, no entanto a um grande esforço no Norte de África, onde não
vislumbrava uma mais - valia em termos de custo/eficácia.
D.
Henrique, não se opunha às relações com a Europa, sobretudo em termos de comércio,
embora defendesse a neutralidade nas disputas europeias, mas estava muito
empenhado na luta do Norte de África, que encarava como a continuação da
Cruzada e nas navegações costa africana abaixo e na colonização dos
arquipélagos atlânticos. A isto não seria estranho, por certo, o facto de ser
administrador da Ordem de Cristo e dever ter em conta os seus objectivos
político-religiosos. Foi assim que o plano para se chegar ao Reino de Prestes
João e à Índia começou a tomar forma.
As
coisas foram-se naturalmente ajustando e a conquista de Marrocos veio a
revelar-se impossível, tendo ficado isso claro no reinado de D. João III,
embora a última praça, Mazagão, só tivesse sido evacuada (e com oposição!), em
1769. Neste âmbito teve D. Pedro razão.
Uma ligação mais forte à Europa veio a
revelar-se, também, infrutífera, sobretudo depois de a França ter “engolido” o
ducado da Borgonha e a “concorrência” tivesse feito gorar a nossa presença em
termos de feitorias comerciais. A Reforma virou as potências protestantes e
calvinistas, contra nós, o que foi agravado pela perseguição aos judeus e,
finalmente, a coroa dual Filipina tornou-nos inimigos dos inimigos de Espanha. E
aqui se goraram as ideias do Infante D. Pedro...
O mar tornou-se assim a nossa janela de
liberdade e oportunidade e os nossos “impérios” asiático, primeiro; brasileiro,
depois e africano, por último, fizeram o resto. Quer isto dizer que os assuntos
europeus nos foram alheios? De modo nenhum. Dali nunca mais veio boa vizinhança
nem qualquer apoio que não quisesse trocar um chouriço por um porco. E sempre
que o nosso país se encontrou no caminho dos interesses das grandes potências
europeias, viemos a sofrer com isso. A Guerra da Sucessão de Espanha, a Guerra
dos Sete Anos e as Guerras Napoleónicas, são de tal corolário, exemplo
eloquente. Ou seja, sempre que nos envolvemos nas querelas europeias, saímos a
perder.
Esta
dualidade das “escolas geopolíticas” mantiveram-se com “nuances” e diferenças
de enfoque, até hoje.
Os
leitores farão o favor de pensar quantos portugueses têm, hoje em dia, alguma
noção disto, e entre estes quantos políticos no activo, entende as subtilezas
de Pedro e de Henrique.
*****
Em 2010 comemorou-se em Lisboa e Madrid, com
alguma pompa e circunstância, os 25 anos da adesão de ambos os países à então
Comunidade Económica Europeia (CEE). De então para cá os encómios não pararam,
apesar de algumas vozes piedosas lamentarem que nem tudo vá bem.
Não
vejo grandes razões para festas e, ao contrário do que parece ser uma quase
globalidade de encómios, eu encontro um lote não despiciendo de erros, maus
caminhos e futuro cinzento, para não dizer outra coisa. Muito sucintamente:
Portugal
entrou (e quis entrar) para a CEE de qualquer maneira, sem estar preparado e
numa posição fraca; depois quis fazê-lo juntamente com a Espanha o que
considero um erro político/estratégico; fê-lo, ainda por cima, mandando-se de
cabeça, sem salvaguardar interesses, ou prudência no baixar das defesas; pior
ainda, mergulhou na CEE como se isso se tratasse de um objectivo permanente
histórico – que não deve ser – em vez de considerar ser um objectivo actual
importante e, por isso, transitório, que é o aconselhável. Isto é importante?
Direi que é fundamental e tal implica um tipo de postura muito diferente um do
outro.
A
seguir embandeirou-se em arco e foi um fartar vilanagem: com os fundos
estruturais, de apoio, etc., a correrem com uma facilidade nunca vista, perdeu-se
a cabeça e desatou tudo a gastar a esmo ao passo que se permitiam todos os
desatinos. E mais importante foi-se sempre adiando as reformas estruturais; a
definição de objectivos estratégicos e o estabelecimento de áreas prioritárias
de investimento. Ao passo que, alegremente, se ia destruindo a agricultura, a
pesca, a indústria e se colocavam as pequenas e médias empresas com a corda na
garganta.
A
especulação ganhou asas. E apostou-se no cimento, esquecendo-se que parte deste
transformado em estradas ia servir os exportadores estrangeiros (nomeadamente
espanhóis e franceses, que são os mais próximos) a colocarem os seus produtos
cá mais rápido, logo, mais barato, ajudando assim a acabar com o que ia
sobrevivendo. A “integração” com o mercado espanhol, do modo como é feito, é um
crime de lesa pátria pois vai provocar umas novas Cortes de Tomar de 1581, sem
ser preciso o recurso às armas… Ninguém apresentou, entretanto, contas do que
foi realizado.
Em
súmula, encontramo-nos hoje, depois de 25 anos (mais propriamente 43) a viver
acima das nossas possibilidades, com dinheiro “emprestado”, completamente
endividados e com o aparelho produtivo em frangalhos; o estado (por via dos
partidos) pesadíssimo e … sem mais valias para o futuro! Acresce que agora a crise
atinge todos os países da UE, por causa de práticas especulativas indecentes,
típicas do mais puro capitalismo selvagem e que ninguém diz ter-se apercebido.
É caso para dizer: belas competências!
Ou será que tudo isto foi acelerado e feito de
propósito, para se fugir para a frente e tentar impôr medidas mais
escravizadoras da população e diluidoras das nações europeias a que os mais
esclarecidos comentadores e políticos apelidam de “aprofundamento da Europa” ou
“mais Europa”?
Não
deve ser por acaso, que os poderes instituídos, fogem como o diabo da cruz –
eles até querem acabar com a cruz… - em explicar e consultar os seus povos, sobre
as principais medidas que têm sido implementadas.
Que se comemora então nos anos de adesão à CEE?
A democracia? Mas ela não foi instituída em 1974, perdão, 75? Precisamos de supervisão?
Para vivermos em segurança? Mas quem tem garantido a segurança na Europa nos
últimos 70 anos tem sido a NATO e o chapéu-de-chuva nuclear dos EUA, não a UE!
Aliás, esta, aparentemente, nem se quer defender e, no momento, está incapaz de
o fazer. Será por vivermos em paz? é certo que na Europa há paz desde 1945,
embora com uma “cortina de ferro” a dividi-la durante 50 anos, até se
“inventar” a guerra na ex-Jugoslávia. Mas a paz é ilusória, não só porque andam
dezenas de milhares de tropas espalhadas pelo mundo a tentar “apagar fogos”,
como a situação no continente é contingente a muitos factores. É por se ter
aberto as fronteiras e deixado invadir os países da UE, por hordas de
emigrantes (agora migrantes) inventando-se um multiculturalismo de fachada,
pois não é sentido nem realizável? E o que se ganhou com isso? Não está à
vista, que estamos no limiar de uma vasta explosão social contra este estado de
coisas?
Nem
tudo está mal, é certo. O nível de vida material aumentou, embora o espiritual
tenha diminuído; a cultura melhorou (o analfabetismo encartado, também); as
facilidades de circulação, o aumento do turismo, a assistência social, tiveram
notáveis melhorias, etc.
Mas
no seu todo, a Europa está velha, com uma demografia negativa, sem liderança,
sem os seus esteios tradicionais e minada pelo relativismo moral.
Sinceramente
não percebo muito bem o que se quer exaltar e comemorar.
Mas
sei uma coisa: aquilo que querem dizer com “mais Europa” é o fim de Portugal. Não
era isso, seguramente, o que o Infante D. Pedro divisava e que todos os
portugueses conscientes devem tentar impedir.
João
José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador
Bem haja Sr. Tenente Coronel Brandão Ferreira!
ResponderEliminarValha-nos Nosso Senhor Jesus Cristo!