sábado, 1 de janeiro de 2022

ARMADA: O QUE COMEÇA MAL TARDE OU NUNCA SE ENDIREITA!

 


ARMADA: O QUE COMEÇA MAL TARDE OU NUNCA SE ENDIREITA!

 

30/12/21

                                               “Talant de bien faire” (?)

Divisa do Infante D. Henrique, adoptada pela Marinha de Guerra (a interrogação é minha)

 

                                    “A Pátria honrae que a Pátria vos contempla”.

                                     Verso de Camões, presente em cada Roda do

           Leme, de todos os navios da Armada Portuguesa.                                                                                                                

 

            A saga persecutória contra o Almirante Mendes Calado terminou agora com a sua substituição no cargo de Chefe de Estado-Maior da Armada (CEMA), pelo Almirante Gouveia e Melo, que tomou posse no passado dia 27 de Dezembro, numa cerimónia sem lustre nem glória que acabou por prejudicar o novel CEMA. O que porventura agradou sobremaneira, a quem promoveu tão descabelada ascensão.

            Foi uma cerimónia triste e apagada pois esteve baseada em vilania, sem discursos, sem convidados com a ausência do próprio Primeiro-Ministro (manhosíssima figura) cuja única coisa que sabe fazer é andar em campanha eleitoral permanente.[1]

            O Comandante do Exército fez-se representar (mas não pelo Vice – Chefe, que seria o normal), mas tal pode ter a ver com uma regra de segurança (provavelmente não escrita) que determina que os quatro chefes militares não devem estar presentes simultaneamente num mesmo local.[2]

            E contou com a ausência do demitido (melhor dizendo, saneado) CEMA, Mendes Calado, que fez muito bem, pois mostrou ser Homem com vergonha na cara e seguir o provérbio que reza que “quem não se sente não é filho de boa gente”. E espero que, do mesmo modo, não venha a aceitar qualquer venera que lhe queiram outorgar, pois não devemos ser cúmplices em exercícios despudorados de hipocrisia.

           Que foi aquilo em que o Presidente da República se atolou, em todo este processo e nos elogios que lhe fez, nomeadamente uma semana antes, na Academia de Marinha (em que até “furou” o protocolo para tal), o que não deixou de ser para muitos dos presentes, a pronúncia do que estava para acontecer.

            Desta feita o “Comandante Supremo das Forças Armadas” – um título mal amanhado e pior exercido – deu mais um mau exemplo às “suas tropas” e revelou, se tal fosse ainda necessário, os traços predominantes do seu carácter e personalidade (ou falta deles).

            Todo este lamentável processo teve início (ou talvez antes) na mal engendrada e escusada reestruturação, da estrutura superior das Forças Armadas – uma reestruturação que, lamentavelmente, tenta iludir os verdadeiros problemas que as afligem (se é que ainda podemos considerar que existem Forças Armadas) – quando o Almirante Calado no exercício das suas competências, criticou em local próprio vários aspectos dessa mesma “reforma”, como de resto ocorreu com a maioria das pessoas e entidades que tinham a ver com o assunto, ou para isso estavam habilitadas.

            O Almirante Calado fê-lo de um modo profissional, dando mostras de ser um oficial com espinha dorsal e nada do que fez pode beliscar a sua lealdade.

            Mas esta maldita pecha portuguesa de “quem não é por mim, é contra mim”, fez concitar os ódios de personalidades, algumas das quais conseguem ter a habilidade de se manterem na sombra, raramente sendo faladas, no exercício de um maquiavelismo perturbador.

            Em Setembro passado o Governo, desgovernado, tentou desastradamente substituir de supetão, o então CEMA, “esquecendo-se” de entendimentos prévios e de dar os passos institucionais necessários e adequados, razões pelas quais o PR travou o processo; deu um puxão de orelhas ao Governo (devia inclusive ter-lhe retirado a confiança política) e defendeu ambos os Almirantes (Gouveia e Melo e Calado) clamando indevidamente que tinha havido “equívocos”. Mas não passou daí.

            Gerou-se uma paz podre e insustentável em que o Ministro da Defesa não despachava com o CEMA nem comparecia a cerimónias na Marinha (e o CEMGFA, idem, sempre que podia). Mas aqui se havia problemas quem devia ter saído era o Ministro, não o CEMA e as eventuais divergências a nível militar deveriam ser resolvidas a nível do Conselho de Chefes Militares. É para isso que esse conselho existe – será por isso que na actual reorganização tudo se tem feito para esvaziar/destruir esse órgão?

            Mas chegados a Dezembro – menos de três meses depois o Governo resolve novamente intentar jogar “borda fora” – neste caso o comentador (e voz de Belém) Marques Mendes, foi feliz – o Almirante Calado.

            E, desta feita, o PR já afirma que é a altura adequada! Na véspera de Natal? É preciso não ter um pingo de vergonha no “fácies”!

            O que mudou? Nada! Isto é, mudou uma coisa, que foi, a dissolução da Assembleia da República e o Governo estar a prazo e limitado nas suas competências (o que tentará iludir por todas as maneiras). Ora tudo isto, quanto muito, deveria servir de inibidor da iniciativa, não o contrário…

            No processo agora reeditado, o Conselho do Almirantado, deu parecer negativo à substituição do CEMA, mas esse parecer foi ignorado (para que servirá?). Um dos votos negativo, segundo consta, já que em Portugal não há segredo, foi do actual Chefe da Casa Militar do PR. Não deixa de ser curioso verificar que o PR quer (?) substituir o CEMA, mas o seu Chefe da Casa Militar, não…[3]

            De resto o CEMA estava no exercício legítimo das suas competências – apesar de lhe coarctarem a acção como é exemplo inacreditável, a falta de provisão da importante função de Comandante Naval – para o que tinha sido reconduzido em Fevereiro de 2021, por mais dois anos aliás, com bastos encómios; o Almirante Gouveia e Melo não estava “desempregado”, pois exercia funções no Estado-Maior General (e quem o retirou da “Task Force” de uma hora para a outra, foi o Governo); não estava sequer em risco de passar à reserva por limite de idade (só o atingiria em Dezembro de 2022) e um outro Vice-almirante elegível para CEMA (Bastos Ribeiro), só o atingir em Maio – é importante dizer isto, pois é preciso ter a noção de que o Vice-Almirante Gouveia e Melo não era o único elegível para o cargo.

            E já agora também é importante dizer que o Almirante Gouveia e Melo não dever subir a CEMA pelo facto de se ter desempenhado bem na missão em que foi colocado de vacinar a população (uma espécie de comissão civil), mas pelo seu passado como Oficial de Marinha.

            Convém não confundir as coisas.

            Portanto a substituição do Almirante Calado é apenas fruto de vingança e perseguição cretina destes lamentáveis vultos socialistas, uma espécie de vingança em que nem sequer há paciência de se servir fria, talvez por anteciparem a probabilidade de serem corridos (é o termo) da governação a 30 de Janeiro.

            Ao Almirante Gouveia e Melo também não deveria interessar nada esta apressada trapalhada, insultuosa e degradante, a que se junta uma menor prudência na desmultiplicação de entrevistas, tendo começado já a ser apodado com vários adjectivos que seguramente não terá gostado, e que eventualmente nem lhe assentam bem.

            Lembro a última entrevista dada ao “Expresso”, em que a poucos dias de tomar posse (será que ainda não sabia?) se arriscou a tecer várias considerações de âmbito político, estando ainda no serviço activo, o que é proibido por lei, caso não tenha tido autorização superior (e essa autorização, a ter existido, não poderia ser escamoteada, pois o seu superior hierárquico ser apenas um). O Senhor Almirante ia tomar posse de Comandante da Armada; não colocar-se à testa de um movimento político/partidário. Ou haverá dois pesos e duas medidas?

            A não ser que se tenha querido enviar mensagens subliminares de que caso não houvesse nomeação para CEMA, poderia vir a apoiar alguma corrente política concorrente à do Governo…

           Que algo já estaria combinado a determinado nível, estava, pois até as listas de promoção (feitas, desde a “Troika”, tarde e a más horas – num processo cem vezes mais gravoso do que aquele que levou ao golpe de estado em 25/4/74), que foram publicadas (pelo menos na Armada) só chegavam a Capitão de Mar e Guerra… [4]

            E, pessoalmente, teria gostado de saber, que em termos éticos, se teria oposto à sua nomeação, para um cargo dos mais nobres do Estado e da Nação Portuguesa – quando o seu camarada que o ocupava estava a ser distratado de forma tão evidente. E com ele a Marinha e toda a Instituição Militar Portuguesa.

            É certo que daqui a pouco tempo já ninguém se vai lembrar de tudo isto, mas vai deixar marcas. E o actual CEMA escusava de começar as suas funções com um estatuto de “capitis deminutio”.

            De facto, bem diz o povo e é verdade: o que nasce torto tarde ou nunca se endireita!

            Ou dito de outro modo: em “Democracia”, quando o povo é chamado a escolher entre Barrabás e Jesus (depois de devidamente acicatado pelos “vendilhões do templo”), escolhem invariavelmente, Barrabás. E aparece sempre um Pilatos a lavar as mãos do assunto.

            Não se vislumbra que melhore.

 

 

                                                                      

 

 

                                                           João José Brandão Ferreira

                                                           Oficial Piloto Aviador (Ref.)

 



[1]  O facto de quase não haver discursos na tomada de posse de chefes militares – mais um caso de desconsideração feito à Instituição Militar e aos militares – parece ter sido inaugurado pelo então Presidente Jorge Sampaio (homem muito elogiado por uns quantos, depois de morrer …), que era dado a “birras” e por não querer dar posse ao então indigitado Comandante da Força Aérea, General Vaz Afonso, proibiu os discursos. Mais tarde, amuou novamente, aquando da tomada de posse do último Presidente do Supremo Tribunal Militar, Almirante Castanho Paes, posse que tentou, ao que se soube na altura, evitar a todo o custo. Jorge Sampaio foi um dos principais mentores de se acabar com os Tribunais Militares o que representou um erro de monta. Depois disto, praticamente nenhum Chefe Militar discursou. Como excepção lembramos o General Valença Pinto.

[2] Veio a saber-se depois que o CEME estava, aparentemente, infectado com “Covid” e o Vice, de quarentena.

[3] Na anterior versão, determinava-se que faziam parte do Conselho Superior de um Ramo, os “Tenentes Generais e Vice Almirantes que prestassem serviço nas Forças Armadas”. Na nova versão permite-se que todos os Tenentes Generais e Vice Almirantes, no activo, tenham nele, lugar.

Esta nova versão vai dar lugar a questões interessantes. E já começou.

[4] E não existe a mais leve suspeita de que, desde então, algum chefe militar tenha feito algum reparo sobre o que se passa (e continua). Uma das situações mais gravosas em vigor e altamente lesivas das Forças Armadas e da Condição Militar!

1 comentário:

  1. Em primeiro lugar Os meus cumprimentos Sr. Tenente-Coronel e os meus votos de um feliz 2022.

    Em segundo lugar, algumas perguntas: em que estado está a Marinha desde que o Almiranto Calado assumiu funções importantes para a instituição como ser Superintendente do Material no período 2015/2017?

    Porque é que o NRP chegou ao que chegou?
    Porque é que os NPOs estão pauperrimamente apetrechados?
    Porque é que o MLU da Bartolomeu Dias demorou tanto tempo?
    Em que é que consistiu esse MLU?
    Porque é que o mastro modernaço da BD está oco?
    Em que estado regressou a BD?
    Porque é que os helicópteros Linx demoraram tantos anos a serem "revistos" sem melhorias dignas de nota?
    Porque é que os Fuzileiros ainda andam de G3, já para não falar em tudo o resto?

    Porque é que Calado calou?

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