sábado, 26 de outubro de 2019

HONRAS MILITARES NO FUNERAL DO PROFESSOR FREITAS DO AMARAL


HONRAS MILITARES NO FUNERAL DO PROFESSOR FREITAS DO AMARAL

23/10/19

“Não se pode ser liberal e socialista ao mesmo tempo; não se pode ser monárquico e republicano; não se pode ser católico e comunista – de onde deve concluir-se que as oposições não podiam em caso algum constituir uma alternativa e que a sua impossível vitória devia significar aos olhos dos próprios que nela intervinham, cair-se no caos, abrindo novo capítulo de desordem nacional”.

                                          Oliveira Salazar

            O Professor Freitas do Amaral (PFA) personagem bem conhecida no País com uma extensa vida pública e académica foi a enterrar no pretérito dia 5 de Outubro.
            Com mais ou menos encómios e manifestações de pesar prestaram-se as honras e homenagens fúnebres, como é uso nestas ocasiões.
            A única voz que destoou, se assim se pode dizer, foi a do “secretário perpétuo” da associação que visa evocar e doutrinar sobre os “valores de Abril” – seja lá o que isso for – que elaborou um comunicado onde se vitupera o facto de “alguém” ter considerado o PFA, um dos “pais da democracia” portuguesa.
            Contrapunha a excelsa figura (e quem o acompanhou no comunicado) que quem era o pai da democracia tinham sido os capitães do dito mês, florido a cravos, não sendo época dos mesmos.
            Talvez esteja aí a explicação para que tantos nacionais se sintam órfãos (quem quererá ter pais destes?) e por isso fiquem em casa em vez de irem votar…
            Seria até engraçado pedir a cada um dos tais capitães (não sei se há uma lista dos mesmos) que fizesse uma redacção em que explicassem o que era para eles a Democracia e o que é que isso tinha a ver com um decreto-lei esquecido, o 353/73, de 13 de Julho.
            E eu a julgar que apenas havia um pai da democracia, personagem bem conhecida que nos legou uma fundação com o seu nome. Mas não, agora parece que há mais…
            Embora tenha para mim (como já escrevi em tempos) que aqueles que podem ostentar o título (como o entendemos no Ocidente) sejam uns cavalheiros que conspiraram numa loja maçónica com o cognome de “Sinédrio” (nome do tribunal judaico) onde pontuava um bacharel em leis, chamado Manuel Fernandes Tomás.
            Mas enfim, quem pode entender as vaidades da natureza humana, ou ensinar História a vesgos?
            Não vem ao caso analisar a figura do cidadão agora desaparecido, nem tal fica bem numa situação “post mortem”, próxima. Vamos deixar isso para os historiadores e não só, onde o mesmo será julgado pelos eventuais bons ou maus motivos.
            Mas pretendemos analisar uma ocorrência, pois esta foi engendrada por vivos e para os sobrevivos. Não para os mortos.
            Referimo-nos às honras militares que acompanharam o funeral.
            E isto, repito, é responsabilidade de pessoas/entidades, que estão bem vivas. E, presumo, não fazem coisas ao acaso.
            Vejamos:
            A definição de quem tem direito a honras militares, encontra-se descrito no Regulamento de Continências e Honras Militares, plasmado no Decreto-Lei 331/80, de 28 de Agosto, o qual, no seu Capítulo IX (Honras Fúnebres), art.º 136º diz assim: “Quando falecer o Presidente da República, ou qualquer militar na efectividade de serviço (quadro permanente ou quadro de complemento), ser-lhe-ão prestadas as honras fúnebres constantes do quadro D do presente Capítulo.
            2. Os militares do quadro permanente na situação de reserva, não prestando serviço, e os reformados terão as seguintes honras:
            a) Oficiais…
            b) Sargentos e praças readmitidos...
            3. As honras serão prestadas por força do ramo a que pertencia o militar falecido (…).
            Ora por este articulado podemos verificar que o PFA não tinha direito a honras militares.
            O PFA também não era condecorado com Ordem Militar da Torre e Espada.
            Porém – há sempre um “porém” na legislação nacional – o artigo 137º estipula:
            “Poderão ser prestadas honras fúnebres militares a entidades não constantes do artigo anterior, quando tal for determinado superiormente.
            Esta determinação deverá indicar qual a categoria a aplicar do quadro D deste Capítulo”.
            Ora este artigo dá para tudo o que se queira, salvaguardando o bom senso que ninguém sabe definir o que é, a não ser pelo senso comum.
            Ora não se conhece a determinação nem quem a fez, mas não poderemos andar longe ao dizer que só uma de três entidades o possa ter feito: o PR, o PM ou o MDN.
            Dadas as honras prestadas (apesar dos quantitativos das forças terem vindo a baixar de escalão dada a cada vez maior exiguidade dos efectivos existentes – e um dia destes acabam), dá ideia de que a equivalência outorgada ao falecido para o efeito é das mais elevadas senão a mais elevada. Até teve direito a cadetes das Academias Militares (que melhor estariam a estudar) e a salva de artilharia de 19 tiros, para além de uma companhia a três pelotões (um de cada Ramo) e a Banda da Armada.
            A pergunta que se coloca então é a de saber o que justifica a atribuição “excepcional” a tais honras.
            Seria por ter cumprido o serviço militar na Reserva Naval (as forças que prestaram as honras eram, maioritariamente da Marinha) lugar apetecível para onde iam grande parte dos chamados “filhos maus das famílias boas”, o que lhes permitia de um modo geral, ficarem a salvo do duro serviço de campanha?
            Seria por ter cumprido as “ordens” dos revolucionários do “PREC”, em fundar um partido rigorosamente ao centro, de modo a que o espectro partidário apenas pudesse alastrar até à extremíssima esquerda?
            Foi por ter escrito a primeira versão da Lei 29/82, Lei da Defesa Nacional e das FA, que confinou os militares aos quartéis com extensas restrições aos seus Direitos, Liberdades e Garantias, tornando-se uma espécie de ajuste de contas com o Conselho da Revolução e o Pacto MFA/Partidos? Através da qual se tenta cada vez mais submeter a Instituição Militar ao Poder Político em detrimento da subordinação?
            É por suporem mesmo, que ele é pai de alguma democracia?
            Por fazer parte da lista de assinaturas que entregou Cabo Verde ao “Deus dará”?
            Por ter declarado, prestes, na noite da morte de Sá Carneiro, que tal se devia a um acidente, cuja investigação ainda não se tinha esboçado?
            É por ter sido ministro mais do que uma vez? Mas temos tantos…
            Por ter sido Presidente da Assembleia Geral da ONU, uma função que se poderá equiparar à de uma espécie de eunuco de serralho, com vantagem para este último?
            Por ter “trocado e esquecido” os apoios que tinha no anterior regime, pelas delícias daquele que lhe sucedeu?
            Por ter passeado por diversas forças político/partidárias, não certamente por uma plasticidade extraordinária de córtex, mas sim por uma exemplar independência e irreverência de espírito?
            Ou será por, num momento de rara inspiração, o PFA ter afirmado que se fosse necessário os generais e almirantes passariam a andar de bicicleta? (como ele estava à frente das preocupações ecológicas actuais!).
            Certamente que muitas razões haverá para que lhe tivessem sido feitas honrosas homenagens, como aquela que com justiça clara, lhe foi feita pelos seus pares universitários.
            Agora todas estas homenagens deveriam ter tido lugar no âmbito civil.
            As honras e continências militares são inerentes à condição militar e são coerentes com a hierarquia e disciplina militares, sendo prática ancestral em todas as Forças Armadas de países civilizados.
            Meter a Instituição Militar neste caldo de cultura político/partidário é que me parece deslocado, desproporcionado e de muito mau gosto.
            O tal artigo que permite atribuir honras militares a civis deve ser utilizado com extrema cautela, quando haja, por exemplo, uma ligação evidente e longa entre uma pessoa e as Forças Armadas; a um herói de guerra com relevantes serviços prestados, ou por razões ponderosas de Estado como seja a de um chefe de estado estrangeiro que morra em território nacional e tal se justifique.
            E, seguramente, as Forças Armadas não existem para adornar cerimónias que não tenham um verdadeiro cunho nacional; emprestar dourados a vaidades político/partidárias; entrar em “guerras” ideológicas; fazer “photoshop” a fotografias mal tiradas, ou emprestar lustre a amizades antigas ou de circunstância.
            Porque não mandaram os Bombeiros Municipais de Cascais, a Protecção Civil ou a Cruz Vermelha?
            Desde há décadas que a maioria da classe política se comporta com o maior desprezo, sobranceria, desleixo e até ódio (lá terão as suas razões que, aliás, nunca têm a coragem de explicitar…), para com a Instituição Militar e os militares e depois põe-nos a fazer de jarros com flores, quando lhes dá jeito? Haja decoro e haja vergonha.
            Abriram mais uma caixinha de Pandora.
            Quem será o (a) próximo(a)?






                                                                    João José Brandão Ferreira
                                                                   Oficial Piloto Aviador (Ref.)


           

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